O Matuto e a Galinha
No sertão nordestino, Antônio Paé era conhecido por sua teimosia e simplicidade. Certa manhã, resolveu levar uma de suas melhores galinhas para a feira do arruado, acreditando que conseguiria um bom dinheiro com a venda. Assim que chegou, expôs a galinha em uma gaiola de arame, chamando a atenção de quem passava.
Não demorou muito para que o fazendeiro Zé Teixeira se aproximasse, um homem acostumado a negociar gado e grãos, mas com pouca paciência para as teimosias do povo humilde.
— Bom dia, compadre! Quanto custa essa galinha? — perguntou Zé Teixeira, já coçando o bigode grosso.
— É 70 conto — respondeu Antônio Paé, firme.
— Vixe, mas isso é preço de boi! — exclamou Zé Teixeira, com um sorriso maroto. — Eu dou 50 conto.
— 50 conto é só pro senhor olhar pra ela. Se achar outras desse preço, me avise que compro todas — retrucou o matuto, sem perder o sorriso tranquilo.
— Rapaz, pegue o dinheiro e vamos acabar logo com isso! — insistiu Zé Teixeira, já impaciente.
— Só pego os 70. Por menos não vendo.
— Zé Teixeira, se tu não me vender, vai voltar com ela pra casa.
— De casa ela já veio, daqui eu só volto pra casa com os 70.
Enquanto isso, a mulher de Zé Teixeira, Dona Gedalva, observava a negociação e decidiu intervir:
— Zé, essa galinha dá quase 3 quilos, é uma galinha de respeito!
— Eu não quero respeito da garnizé não, eu quero é comer o pirão dela no aniversário da nossa filha Margarida, sábado que vem — disse Zé Teixeira.
Tonho Paé levantou as sobrancelhas e pensou: "A cocota tá vendida. Zé Teixeira não vai perder o pirão da carne dessa galinha por nada." E disse:
— Deixe de choradeira, homem. Leve a galinha e me dê os 70.
Zé Teixeira olhou para a mulher e disse:
— Eita homem teimoso da gota serena. Tua galinha bota ovos de ouro pra tu não cair nada do preço da capoeira?
— Ovos de ouro não, mas um panelão de pirão escaldado ela dá — disse Tonho Paé, mudando a galinha de uma mão para outra.
Zé Teixeira, já salivando, disse:
— Eita, miseravi, pra tu não dizer que tenho palavra de rei, vou dar os 60 e morre a conversa.
Tonho Paé disse:
— Por 60, nem morre a conversa nem eu nem a galinha. Ela só entra na sua panela por 70. Menos do que isso, você não vai comer esse pirão.
Dona Gedalva, mulher do fazendeiro, interveio novamente:
— Minha gente, não tô nem acreditando por causa de 10 reais não vão fechar o negócio?
Tonho Paé disse:
— Por que a senhora não bota os dez aí completa os 70? Pronto, ta resolvido è só compra os temperos e as verduras e esperar o sábado para fazer o pirão .
Dona Gedalva disse:
— Por Nossa Senhora, Zé, dê os 60 que eu intero com 10 conto e vamos acabar com esse moído, que já estou com a cabeça doendo.
Zé Teixeira disse:
— Você tá doida! Fazer a vontade desse mão de vaca.
Tonho disse:
— Mão de vaca é você, Zé Teixeira, que tá se amarrando por causa de 10 conto.
Disse isso já se abaixando e abrindo a gaiola para prender a galinha. Enquanto Tonho Paé, de cócoras, fechava a porta da arapuca, Dona Gedalva disse baixinho ao marido:
— Compre a galinha, o preço tá bom.
Nesse momento, chegou Luiz Cadú, um fazendeiro inimigo número um de Zé Teixeira, e foi logo perguntando o preço da galinha mais estressada da feira. Tonho Paé, sem pestanejar, disse em cima da bucha:
— É 70.
E Luiz Cadú, antes dele fechar a boca, disse:
— É minha.
Zé Teixeira ficou paralisado, olhando Luiz Cadú colocando a penosa dentro de uma bolsa de palha. Dona Gedalva disse:
— Isso é uma infelicidade. Perdemos de comer o pirão. A festa já tá em cima e aqui na região não conheço uma galinha mais arrumada do que essa que Luiz Cadú acabou de comprar.
Tonho Paé, colocando o dinheiro no bolso, pegou a gaiola velha de arame e disse:
— É, no fim quem vai comer o pirão vai ser o véi Luiz Cadú. Boa tarde e até os novelos.