Causos de Foz - Pelanca e Mário du Trevor

Gustavo, Maíra e eu fomos almoçar na Bruxa, restaurante popular na Foz do Iguaçu do começo dos anos 2000. Era meio de semana, pouco movimento. Aos sábados, a turma solteira de políticos e intelectuais da Boca Maldita provinciana enchia o local e emendava a fofoca da manhã. Nos dias de semana, raleavam os comensais.

Nesse dia, nossa companhia era o controvertido músico, Mário du Trevor, famoso por ser "pavio-curto". Seu tema de momento era a história do tango. Além de nós e o violão do Mário, havia um rapaz perto do balcão, concentrado no seu almoço.

Mário tinha morado uns tempos em Buenos Aires e dissertava sobre o tango. Para ilustrar seu conhecimento, tocava trechos de algumas composições do gênero que confirmavam suas afirmações.

Pelanca, figura popular de Foz do Iguaçu, era famoso por colar em gente conhecida e pegar carona na fama alheia. Ia passando por ali, ouviu música, viu o Mario, seu conhecido, e começou a caminhar em nossa direção. Mário não lhe deu bola. Eu me abstive, notei um certo desconforto na cara do Mário. Ele continuava sua aula.

Pelanca tentou se aproximar e entrar na conversa algumas vezes, a cara fechada do Mário o desencorajava. Num determinado momento da dissertação do Mário, perguntei algo sobre o tema:

- Como é que você explica isso?

Aí o Pelanca delirou, achou a brecha pra entrar em cena, teria seu momento de glória. Chamou o rapaz, a cara enfiada no macarrão, e gritou:

- Oi, oi...

E, apontando para nós, bradou para o solitário freguês, envolvido com o espaguete:

- Ó, ó aqui, conversa de professor, viu? Cê não dá palpite aqui, não!

E sem se despedir, bateu em retirada.

Notas:

- Maíra Santiago, filha; Gustavo Gontijo, enteado;

- Pelanca, meu personagem, seria o Pelanquinha. Seu pai foi o primeiro da linhagem dos Pelanca,

- Esse acontecimento me fez conhecer uma palavra, sinônima de "pelanca", que jamais teria conhecido, se não fosse por esse evento: "aponevrose". Ou, no popular: muxiba.