Filosofando insetos.
Era um final de tarde. O sol forte do dia começava a dourar o céu.
Eu observava um pequeno inseto. Bem, na verdade, nos observávamos...
Sim, porque ele reagia a qualquer movimento que eu fizesse. Nos seus passinhos apressados de quem tem muitas pernas a contar, procurava em vão um esconderijo, mas nenhuma fresta, nenhum móvel, nenhuma pedra, nada se apresentava para resolver sua agonia.
Eu era o mal.
Mas, eu?
Ele tinha invadido minha casa, andado sobre meus alimentos, minhas louças limpas (?) no armário!
Ali era o MEU lugar...
Só, que não.
Eu havia construído sobre a sua mata. Aliás, eu havia acabado com ela. Eu tinha colocado cimento sobre seus esconderijos de cascas e folhas.
Eu tinha trocado suas plantas por meus tijolos, seu habitat pelo meu. Devia ter ficado difícil para ele atravessar o chão de cimento quente e encontrar um abrigo à sombra.
Devia estar mais difícil encontrar alimento.
E ali estava ele, minúsculo, acuado, defendendo sua vida. Por que um inseto teima em defender sua vida?
Acho que porque cada vida é uma vida... Eu às vezes ficava imaginando que os animais em geral soubessem mais da origem da vida, do que nós, humanos.
Eles possuem uma espécie de instinto grupal. Você viu um, viu todos daquele grupo. Será que é mesmo assim, ou sou eu que não consigo perceber as diferenças?
Minha nossa! Os insetos pensam!
Claro, porque se não pensasse, por que estaria com medo de mim? Ele sabe muito bem, o perigo que represento em sua vida.
O chinelo que já estava em minhas mãos, foi ao chão. Longe do inseto. Eu não era um monstro aniquilador de vidas. Que culpa ele teria por ter nascido inseto? E quem disse que ser inseto é ruim ou menos digno que um ser humano grandalhão e mal intencionado?
Minha nossa! Já estava delirando, eu acho. Eu ali, parado, filosofando sobre insetos.
Percebi que enquanto filosofava, tinha relaxado na guarda. Quando procurei pelo inseto, não mais o vi. Será que ele tem algum poder sobre mim?
Não o procurei novamente. Afastei-me resignado a conviver com os insetos, pelo menos até que outra crise de importância, magnitude, prepotência ou outro mal humano qualquer venha a me acometer.