O CAPITÃO PONTO E VÍRGULA E A OREIA DO XICO PAULISTA
O CAPITÃO PONTO E VÍRGULA, E A OREIA DO XICO PAULISTA
Por Andrade Jorge
Essa estória que vô conta pra vosmecê,
Assucedeu no arto sertão
Foi pra banda de Santo Antão,
dia de festa, forró do bão,
Um barracão, de chão batido
Um balcão de talbua servia de bar,
Bandeirinhas esticadas enfeitava o lugar,
O povo logo foi se aproximando,
Tião, Açucena, Zé Bode, Didi, Cariri,
Carijó, João Bento, os cabras tava tudo ali,
Tinha inté um tar de Xico Paulista, cheio de graça,
Metido a valentão,
tava memo querendo confusão,
barriga vazia, cabeça cheia de cachaça,
de repente o falatório se aquietou,
Zezim Coisa Ruim logo avisou:
─ Oxente! É o Capitão Ponto e Vírgula, o tinhoso
Cangaceiro temido pelo mais valente,
Justiceiro de gente que fazia o que num devia,
Caçava o malicioso
E dizia na cara:
─ não devia fazê o que fêiz, visse
Agora vai recebê seu Ponto e Vírgula,
O Ponto era na bala, a Vírgula no facão,
Assim ficou conhecido pelo sertão;
Mais, naquela noite
O Capitão se bandeou pra festança,
Não queria saber de relho nem açoite,
Ele tava precisando de uma festa, uma dança
Galopou seu cavalo naquela direção,
O convite era do festeiro Tonho Rodrigão, cabra cioso
Que de besta nada tinha, logo que viu Capitão
Correu pra pedir sua bença, como se padre fosse
e mandou começá a dança,
Encheu logo uma cabaça da marvada,
Que desceu lisa na goela do Capitão,
Pra mor de acarmá o espirito numa golada,
que o home tava afogueado, desassossegado
Queria memo era forrozá,
Bateu pé levantou poeira, fêiz zoera,
Zé Lino entendeu e a Zabumba zabumbô,
A mão de Dentinho tremia, mas o Triângulo repicou
Zé Sereno na sanfona serenou
O povo batia parma e o home vorteava,
Até que apareceu Lindaura, morena manhosa
Linda como o quê, não tinha home proque não queria,
A boca do Capitão inté salivô, “seo” moço,
Memo que cabrito quando vê a cabrita e berra,
E o Cangaceiro embasbacado, empacou,
no embaraço do tirador de vida,
ajudante do capeta na terra,
A moça arregaçou a saia, de fora as coxas amorenada,
Pisou no terreiro de mansinho,
Zé Sereno encheu o barracão de xaxado
E lá se foi ela se amostrando no seu bailado,
Oxente! o zoio dos cabras nem piscava,
tava quase sartando da cara,
até que ...
uma misera! um cabra safado, fio de rapariga
Peste dos inferno, a pois num era o tar Xico Paulista?
Enfiou a mão nas coxas da moça brejeira,
Ela estancou no meio do barracão,
o povo jura que a voz até engrossou,
O zoio dela cresceu feito lua,
e antes memo que arguem assuntasse, ela se virou
passou a mão na lazarina do Capitão,
Que tava pendurada na parede,
joia que ninguém punha a mão
E disse:
─ Valei-me Nosso Senhor Jesus Cristo! hoje vai um,.
E sem amirá, deu no gatilho, e pummm
Esfumaçou o recinto, um berro todo mundo escuitou,
O fio d’égua caiu num canto,
─ acho que desmaiou! gritou Inhô Quim
o Véio do cachimbo de barro,
Vosmecê pode num creditá, a coisa ficou feia,
O tar Xico abusado caiu sem o pedaço duma oreia,
O Capitão aperreado alertou
─ Eu que sou eu, num molestei,
o Ponto a menina já foi deu, farta a Virgula,
Arrancou sua pexera afiada
Foi até o cabra e zumm, cortou o resto.
─ Não lhe mato proque hoje to muito feliz, visse?
E proque quero que vosmecê
se alembre desse dia até o fim
dessa sua vida sem valor.
Vai aprender cabra da peste, fio de rapariga,
A sentir muita dor
não se bole onde não se pode bulir,
macho que se assanha, sem respeito, feito louco,
minha pexeira esfola, visse
proque merece a Vírgula, que tiro é pouco.
─ Sai daqui agora fio de rapariga
Antes que corte tua vergonha fora!
Sentenciou o Capitão justiceiro
Temido cangaceiro,
E gemendo de dor, o cabra safado sumiu.
Virou poeira ninguém viu.
.......................
Muito tempo se passou
O caso virou estória de lampião.
Mas, la pelas bandas das Minas Gerais,
Diziam tinha um tar de Xico, valentão
Gostava de fuxico, mas oreia num tinha não.
07/07/2023
Nota do Autor: Texto não tem pretensão de Cordel, mesmo porque não está escrito dentro das regras da Academia Brasileira de Literatura de Cordel, mas foi baseado num conto autoral “A Oreia do Xico Paulista” do livro “Conto, En ...canto & Peripécias”, Editora Oficina Editores, Rio de Janeiro, 2014.