O Velho e o Poço
Em minha juventude, testemunhei algo que ficaria tatuado em alguma parte de uma memória escura. Ao brincar nas ruas e morros próximos à minha casa, inocentes aventuras nas bordas de barrancos com lonas pretas e fortalezas de tijolo sem reboco, nada disso poderia me impactar tanto quanto um vizinho já de idade da casa ao lado.
Todos os dias, eu me sentava em um muro de arrimo para ouvir lendas épicas que o velho senhor tinha para contar, gesticulando com suas mãos dava vida a histórias de terror e aventura de quando o velho era jovem.
Um dia, caminhando após o almoço, vi o velho segurando uma pá em uma eterna luta com um chão de barro. Talvez uma curiosidade primitiva me fez perguntar ao velho o que o fazia ser castigado sob um sol tão severo, cavando aquele buraco. Ofegante, o velho disse que poderia resolver o problema de falta de água que assolava aquele morro com um poço, uma inquietude por abandono.
A partir daquele dia, o velho cavaria aquele chão todos os dias, submetido às forças da natureza, mas sem cessar. Foram vários dias batendo incessantemente naquela terra com suas mãos travadas devido às condições de saúde e desaparecendo diante dela.
Naquele dia, não o vi; esperei em frente à janela o som de uma enxada. Quando os grilos abriram sua sinfonia, sua porta foi aberta por pessoas de óculos escuros. Eles se abraçaram e foram embora em silêncio, levando consigo algo que não pude entender na época.
Hoje, meus olhos marejam ao ver o poço soterrado entre vinhas e capim, não apenas um poço, uma promessa.