Trato desfeito
Aconteceu de verdade.
Um conhecido meu, quando era jovem, tinha boa amizade com a cunhada, e os dois combinaram o seguinte: quem morresse primeiro voltaria pra contar pro outro como é no “outro lado“.
Foi uma brincadeira, mas esqueceram de combinar que era uma brincadeira.
O tempo passou e Timóteo – vamos dizer que esse era o nome dele – mudou de cidade com esposa e filhos e ficou sem comunicação com a família por dezoito anos.
Estela, vamos chamar assim a cunhada, ficava tentando imaginar onde ele andava e se ele ainda estaria vivo. Devia estar, porque ainda não tinha aparecido pra lhe assombrar. À medida que o tempo passava, aumentava seu medo de Timóteo morrer e aparecer na forma de alma penada. Superstição é fogo!
Um belo dia, Estela ficou sabendo que Timóteo estaria de passagem pela cidade e que iria visitar seus parentes e conhecidos. Secretamente, ela suspirou de alívio. Quando os dois finalmente se reencontraram, Estela apertou a mão do cunhado e foi logo dizendo:
- Trato desfeito?
Timóteo não entendeu na hora, ficou sério pensando, deu uma gargalhada e concordou:
- Claro, trato desfeito.
Porque estou contando isso agora? Acontece que se passaram mais trinta anos, Timóteo morreu – de Covid-19 – e a notícia chegou até Estela. Juro que ouvi ela murmurando “Graças a Deus a gente desmanchou o trato".
Haja medo de gente morta...!