Gaveta de seis lugares

A pastelaria vai bem, obrigado. O movimento começa aí pelas 6 e meia da manhã, dá uma parada entre 8 e 10 e meia, depois vem a hora de almoço, fila de carros, saída de estudantes do colégio em frente, outra azáfama. Palavra bonita, não é? Podemos substituir por bagunça, sufoco, caso alguém tenha nojo de proparoxítonas..

Mas vamos ao que interessa. Um desses dias, na hora do sossego, dois senhores conversam sobre imóveis na região e tomam café. O proprietário aproveita o marasmo e põe em dia seu "Uatizap". Madorna pura. Uma senhora, numa mesa afastada, olha para o vazio, come seu pastel e toma coca. A conversa dos senhores pula para qualidade de vida nos bairros, em plena época dos condomínios fechados. Um deles fala bem da Vila Iolanda, bairro antigo, quase no centro. A senhora se liga, pega o gancho e diz que tem casa lá pra vender, preço em conta, vai mudar de Foz. Detesta a Vila Iolanda, faz questão de dizer, uma palavra despertou a fera sonolenta:

- Lá não tem pastel nem um litro de leite pra comprar. Tem que andar longe, tem vez que é só no centro. Uma merda.

Os dois senhores não dão trela , um deles mora na Vila Iolanda. Melhor evitar polêmica. Decepcionada, sem o contraditório, ela volta ao pastel e café com leite. De repente, talvez por vingança à indiferença, sem pedir licença, ela dá cheque mate:

- Tenho uma gaveta com 6 lugares lá no Jardim São Paulo. Tô vendendo baratinho, vou morrer na minha terra, uma merda morrer em lugar estranho.