Não é o Bumba Meu Boi, Mas é o Bumba Meu Peixe!
Às margens do Velho Chico mora o grande pescador Jeremias. Não economizou em matéria de ter filhos. Pai de quatro filhos e destes o mais velho, o Isidoro, o ajuda na pescaria que é o sustento da casa. Tanto para avenda como para a alimentação.
A Ambrósia, sua esposa, grávida pela quinta vez, sentindo enjoos e vômitos,veio o desejo que em todas as mulheres são visitadas, aonde vem a vontade de comer algo ou beber, enfim: é sempre algo difícil de providenciar. Desta vez a Ambrósia sentiu o desejo de comer língua do “Curimbão Tatá”, peixe grande que pesava uns 25 quilos e que era peixe de estima de São Francisco de Assis.
O sol indo embora sem pressa, tardezinha fria e ao chegar da pescaria, oJeremias já cansado, sai da canoa junto com o Isidoro, as redes e tarrafas ás costas e alguns peixes.
E a Ambrósia:
- Jeremias! Ocê sabe queu tô buchuda. Mais tô num desejo de cumê a língua do “Curimbão Tatá”. Se ocê num me dá, o
minino vai nascê cum a boca aberta e vai ficá mais seco que graveto.
Logo o Jeremias começou a tremer e foi logo ao assunto:
- Muié de Deus! Ocê tá bistunta? Donde nóis vai rancá a língua do “Curimbão Tatá”, pa mode ocê cumê? São Francisco me castiga, vô ficá todo travado e nem pêxe vô mais pegá.
Ela com muito desejo não desiste e:
- Mais Jeremias, meu amado, eu num tô aguentano de tanto desejo. E cum dó do nosso fio que inda tá na minha barriga mexeno e me atiçano. Se ocê num ranjá a língua do “Curimbão Tatá”eu vô inté dismaiá.
Ele pensou, pensou e voltou para o rio, e desta vez sozinho. O Isidoro, apavorado deixou os três irmãos chorando ao lado da mãe e foi até à casa das rezadeiras, Maria, Amélia e Conceição, para contar o fato e tomar providências
para não acontecer uma tragédia. E:
- Tem misiricórdia! Vai acunticê o maió castigo da rigião e pode inté trazê um castigo pa nóis tudo. Minha mãe tá buchuda e cum desejo. E pidiu o meu pai mode rancá a língua do “Curimbão Tatá”, o pêxe de istimação de São Francisco de Assis.
Foi o maior aranzel e aquela correria. Uma pega o terço, a outra uma imagem e uniram-se á Amélia e logo se ajoelharam e:
- Valei-me meu Deus! Vai sê uma tragédia! São Francisco vai iscumungá nóis tudo! É o pocalispe! Fim do mundo!
Jeremias apoitou a canoa lá no meio do rio e o logo o intrépido Biguá assenta
a na proa e:
- Meu nobre Jeremias! Vejo que estás preocupado e tens uma tarefa muito difícil!
Agitado o Jeremias responde:
- Sim! Meu amigo Biguá! Me ajuda a incontrá o “Curimbão Tatá”. A Ambrósia tá buchuda e com o desejo de cumê a língua do peixe de istimação de São Francisco. E eu num quero vê meu fio nascê cum a boca aberta e mais seco que graveto.
O Biguá para não assistir a tragédia, logo se prontifica:
- Calma! Jeremias! Vamos procurar o “Curimbão Tatá!” O que não acontecer é o castigo de nós todos. São Francisco é bom, mas, não vai perdoar.
Os dois se atiraram na água e não demorou muito e eles surgiram com o “Curimbão Tatá” nos braços. Com os olhos arregalados e apavorados.
E lá vem o Jeremias com o “Curimbão Tatá”, nos braços e:
- Tá aqui! Seja o que Deus quisé! Vô tirá a língua do “Curimbão Tatá” e esse desejo vai iscafedê. Mais meu fio num vai nascê cum a boca aberta e nem seco cumo um graveto. E dêxa o castigo vim.
Quando ele arrancou a língua do “Curimbão Tatá”, o coitado do peixe só fechou os olhos, ficou estrebuchando no chão e morreu. As rezadeiras entraram em polvorosa e a Maria:
- Ó meu Deus! Tem dó de nóis! Vai tê castigo e praga! São Francisco vai
ficá brabo e vai xingá todos nóis!
E as três em pranto:
- “Curimba, Curimbinha, Curimbão
Abre os zóio e alevanta do chão
São Francisco vai ficá furioso
E nóis vai pa dibaxo do torrão”
E foram repetindo por várias vezes e a fé foi tanta que o “Curimbão Tatá” foi abrindo os olhos, se mexendo, deu um sorriso e tchibum...dentro d’água.
Minutos depois, São Francisco chega rodeado de animais e pássaros. O Bem-te-vi já havia dito que não viu, o Tatu disse que estava dentro do buraco, ele se aproximou das rezadeiras e:
- Minhas fiéis rezadeiras, vocês viram o meu estimado Curimbão Tatá?
Naquilo o “Curimbão Tatá aparece sobre as águas para a alegria de São Francisco, que ficou todo contente e:
- Meu Curimbão Tatá! Que saudade de você! Meu peixe de istimação! Eu já ia te procurar em outro rio! Por onde andavas?
“Curimbão Tatá” deu um salto numa alegria! E:
- Meu nobre São Francisco! Estava nas profundezas, fazendo
companhia aos outros peixes!
As rezadeiras ao ouviu o peixe falar, desmaiaram e São Francisco as benzeu
e elas se levantaram.
Foi uma satisfação, as rezadeiras ficaram felizes, a Ambrósia realizou o seu desejo e o seu filho nasceu saudável. O Jeremias foi ao cartório da corrutela e registrou o filho por nome de Francisco Jeremias Ambrósio de Assis, pois, ele nasceu
justamente no dia de São Francisco Assis, dia 04 de outubro. E dizemque no dia do batizado, a passarada na sinfonia matinal, sobrevoou a palhoça e a bicharada num alvoroço magistral, reverenciou ao filho de Jeremias e Ambrósia.
Nada mais justo!
A paz reina ás margens do Velho Chico e nas noites de lua cheia, “Curimbão
Tatá” vai até a beira da palhoça do Jeremias pra sentir a felicidade da sua
família.
Tudo terminou bem, mas que foi um alvoroço...foi!
Dizem que têm mais três moças grávidas ás margens do Velho Chico. Será
que elas vão sentir o mesmo desejo? Se for, coitado do “Curimbão Tatá!”
Tudo se resolve onde a calmaria das águas transcende.
E você? Quer morar às margens do Velho Chico?
Quer? Eu já sabia!
Histórias do Velho Chico amado e adorado!