A Rua dos Fracassos

guarda os desmemoriados,

minha mãe diz que Deus 

apaga a memória da gente 

porque não quer ver ninguém sofrendo.Deixa só uma marquinha no corpo.Eu fico contando as marcas da minha mãe,pensando no tanto que Deus teve que apagar.O rosto macilento e enrugado dela exibe marcas feias do tempo e das coisas que passou.Depois de ir ao médico, voltou estranha e cabisbaixa.

Meditativa, calada e determinada

cismou de me ensinar a ler.

Força meus olhos na bela grafia e nada entendo.Paciente, ela tenta me ensinar mas sou um bicho solto e impaciente. Louca para fugir e brincar, invejando 

os colegas que riem à solta na rua lá fora,enquanto estou presa, sozinha com ela e os

lápis e cadernos.Laboriosas letras, desenhadas a perfeição,

que me faz repetir até doerem os dedos.Seu olhar perdido, enquanto me diz que um dia 

vou ser uma grande escritora.

Eu detesto…mas fico com medo 

dela enlouquecer, 

igual à vizinha que vive penteando 

os cabelos na rua e falando sozinha.

Então consigo rabiscar o meu nome e ela me olha tão feliz

Eu me sinto tão culpada e não digo a ela o que fiz.Assustada com os tremores nas suas mãos.

A dificuldade ao levantar até um copo.Então eu chorei…por não conseguir ser o que ela sonhou para mim.As vezes, o fracasso mora junto com a gente.

E não dá para escapar…

O que ela diria, se dissesse que vendi o corpo para comprar o jantar?

Luísa Azevedo
Enviado por Luísa Azevedo em 11/12/2022
Código do texto: T7669848
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