Eu tiro o caco de telha e começo a mastigar.
É um costume antigo que nunca consegui largar.
Minha mãe diz que todos os vermes moram em minha barriga.
Mas que diferença faz comer tijolo ou a farofa de bunda de tanajura que ela fazia para o jantar?
Ficar horas catando formigas feito besta e sair toda picada.
Prefiro minha telha que levo comigo no bolso.
Mesmo agora, adulta, diante dessa mesa farta
eu gosto de tocar e sentir
que tem um pequeno pedaço perto de mim.
Sinto ele debaixo do vestido justo e colado.
Uma sensação de segurança enquanto desfilo entre as pessoas numa mesa farta de comilança sem me deixar ofuscar por todo este luxo inútil e vazio.
As sobras desta festa alimentaria o povo da Rua dos Fracassos por um mês,mas as pessoas só beliscam
os camarões gigantes.
Enquanto consomem litros de bebidas e drogas sem parar.Coloco um sorriso gigante e finjo
que estou me divertindo.
Há onze anos, eu tinha feito uma promessa
a mulher que me tirou das ruas e vou cumprir.
Nunca mais, ela vai precisar dormir com fome.Nem remexer o lixo dos outros para achar algo que possa transformar em alimentos. Eu só não posso chorar, tenho que ser forte e aguentar.