SONHAR PODE ABASTECER O CORAÇÃO
Sonhar é mais prejudicial que não dormir (Silveira, 1981). Interessante ponto de vista.
Carl Gustav Jung, dizia que "os sonhos então são, além de importante fonte de informação, um instrumento altamente educativo, pois mostram de forma espontânea e simbólica a situação atual do inconsciente e para onde ele pode encaminhar a consciência e a vontade objetiva".
Lourival Marques (painho, 1932-2021) homem sábio, sempre disse que "sonho é barriga cheia".
Fato é que sonhar me traz muitas mensagens. Umas bonitas, outras nem tanto, umas inteligentes, outras românticas. Todas amadas.
Ontem, depois de sonhar algumas situações que não consegui reter bem, fragmentos espalhados pelo universo do sono, fui presenteada com um belo sonho.
Estávamos todos nós, da família Santos Oliveira, numa casa de praia de madeira. Uma casa extremamente simples, mas ampla. Com balaústro e tudo. Havia um enorme tanque de cimento, contrastando com aquela madeira envelhecida.
Nossos maridos estavam presentes, filhos e filhas, netos e netas dos filhos e filhas.
Em frente à casa, onde a vista dava de alcançar, havia um lago pantanoso. Nesse dia, depois do longo desjejum simples, mas farto, fomos para o balaústro.
Pouco tempo se passa e Célia avistou uma flor no lago pantanoso, de cor lilás. Muito rapidamente ela desceu as escadas de madeira e fomos todos atrás dela. Chegando perto, a flor ainda nascendo, devagarinho, iluminou nosso olhar.
Mainha veio com uma grande lona cor de abóbora, dobrada e amarrada com corda, ela a trazia assim debaixo do braço. Função da lona: servir de assento para que todos pudéssemos assistir aquela revelação esplendorosa.
Fiquei um tempo grande olhando mainha... estava com uma calça jeans por baixo de uma saia branca de flores azuis, camisa de malha, da clínica que minha irmã mais velha trabalhava, lenço florido na cabeça. Tão linda.
Minha mãe também nos trouxe o que restou do desjejum: batatas-doces, e uma garrafa de café, marca Aladim, cor marrom. Essa garrafa realmente existiu, durou muitos anos. Acompanhou nossa mãe e pai da roça para a casa da cidade. Que saudade dos tempos infantes. Gratidão meu Deus...
Isso tudo muito rapidamente executado. Ela não ficou para o espetáculo. Sempre foi uma espécie de Marta e Maria. Sempre deu conta dos afazeres de casa, mas também da alimentação do espírito.
Célia e Selma estavam com máquina para fotografar a flor. Joselito, meu cunhado, também. Meu marido, Jorge Rafael, tinha uma Polaroid, uma carga apenas. Todos nós estávamos com roupas de roça.
Roupas de roça de gente simples, são roupas que descartamos de antiga ou das quais enjoamos de usar. Pode surgir de tudo: blusa de lantejoula, calça de boca de sino, camiseta com gola década de 70 etc
Ficamos ali, espectadores da flor de lótus por cerca de 30 minutos, mas terminamos a manhã a falar sobre o tema. Fotografias tiradas, com cuidado, porque não tinha mais filmes para as máquinas. E só havia um cartucho para a polaroid do meu esposo.
Não demoramos para ir para o rio. Brincamos de nadar, como dizia meu pai, depois voltamos. Em casa, mainha perguntou sobre a flor. Todos contaram um pouco sobre o nascimento da flor.
Na sala, a mesa e o banco de madeira, a poltrona de painho, forrada com uma peça de taco, e outra de fuxico (artesanatos). De repente ele levanta e pega um disco de Alcione. Tira o bolachão da capa, cuidadosamente coloca do três em um, que havia ligado no botão quadrado, cor de abóbora.
Nesse momento, eu, consciente do sonho, fiquei muito alegre em vê-lo ali. Segundo Drummond, sonho se for bom, a gente fica assistindo. A música escolhida por nosso pai, discorre a esperança que está fortalecida em mim, desde ontem.
Não racionalizei mais nada do sonho. Sentei no tamborete pequeno, que estava próximo à mesa. Mainha perguntou: "esse disco tava aqui Loro?" Ele só balançou a cabeça afirmando.
A música que ele escolheu, foi a mensagem que ressoou na casa, todos ali ouvindo, cada um num cantinho da sala, mainha catando feijão na mesa. Ficamos assim, até o fim do sonho.
Enchi a barriga do meu coração. Só Gratidão.
Solineide Maria.
Luanda, 21 de outubro de 2022