AS BOCHECHAS VERMELHAS

Lindoneildon era um jovem muito tímido e todos achavam que ele jamais iria casar. Ficava vermelho até para dizer o próprio nome ( só dizia que se chamava Lindo. Pelo menos esta primeira parte dava pra salvar. ) Um dia ele conheceu Naíra, assistente social da unidade de saúde do bairro.

Foi num período muito triste de sua vida, quando sua mãe passou a ter alucinações e chegou num estágio de saúde muito delicado até partir para a eternidade. Naíra foi a encarregada de lhe trazer a pior notícia de sua vida. Lindo ficou arrassado, e teve de ser medicado. O jovem Lindo se viu sozinho para arcar com as despesas da casa, haja vista que o pai tinha ficado inválido e dependente de remédios.

Naíra, mulher de alma boa e tão calma como a brisa da praia, foi o ombro amigo de Lindo. O rapaz viu na morena uma grande amiga. Naíra segurou nas mãos de Lindo, logo após o jovem dizer a ela sobre o pai e que se via sem saída, no fundo do poço. A amizade entre os dois fizeram os dias serem mais amenos. Ninguém esquece um ente querido que se vai, imagine perder a mãe. Esta é uma dor que só quem vive sabe dimensionar. Lindo viu em Naíra um conforto, uma vida que ressurgia e que lhe ensinaria aos poucos a superar, entender a situação e aceitar. Lindo, pela misericórdia de Deus, conseguiu um emprego de operador de supermercado. Deus abriu uma janela, agora era com ele se empenhar e deixar a timidez de lado, sair da casca do ovo.

No primeiro dia de trabalho foi difícil, o coração foi a mil. O mais importante Lindo conseguiu fazer: sair da zona de conforto. Este é o primeiro passo que todos devemos dar. O caso de Lindo realmente era timidez, não era questão de ser introspectivo.

Ele não sabe como tudo começou, desde sempre se via assim. Toda vez que era necessário trocar ideias com pessoas de fora ele sentia o terror, uma tortura na alma. Ficava inquieto, olhando para os lados e procurando palavras certas para dizer, pois não queria pagar mico. Mas o que Lindoneildon tinha que entender é que a vida é feita de " pagar mico". Quem se preocupa demais em ser certinho se atrapalha todo. Lindo não aceitava errar, ele se cobrava. No colégio não admitia mais chegar atrasado, desde quando uma vez se atrasou devido a forte chuva. Lindo chegou em sala de aula praticamente todo molhado e chorando muito, assustado vendo que todos já estavam fazendo a prova bimestral.

Julinha, uma colega de classe, o apelidou de bebê chorão. Tinha uma menina chamada Suzy que Lindo estava gostando . Mas não tinha coragem, tinha vergonha de olhar nos olhos, desviava o olhar sem saber como chegar na garota.

Para apresentar trabalho em grupo, ir lá na frente e fazer a explanação, falando alto?! Nossa! Era um grande desafio! Ele se tremia todo, gaguejava. Quando via a turma do fundão rindo, Lindo chorava. Mas explicava o assunto do trabalho, mesmo chorando. Ao término, a professora Paula, tão querida dos alunos, o abraçava. Disse que Lindo iria superar e lhe Deus os parabéns! Suzy fazia parte do grupo dos bagunceiros, e Lindo quando a viu zombando dele passou a ver na alma da garota uma coisa ruim, um preconceito. Deixou de gostar de Suzy, e não se enganou mais com o seu rosto angelical.

Lindo passou por muitas lutas. Chegou à fase adulta ainda tímido, e a vida se encarregou de lhe apresentar um caminho que ele teria que se soltar como uma ave no céu. Só recebe o presente da liberdade aquele que não ignora os desafios, vence seus medos. A coragem se constrói errando, errando até acertarmos os passos. Lindo se empenhou no trabalho do supermercado. Ao receber seu primeiro salário, comprou alianças, ficou noivo de Naíra. Lindo , devido ao seu trabalho de excelência, foi premiado com folga no final de semana. Naíra, então o chamou para irem até Caxambu, linda cidade mineira conhecida pelas fontes de água mineral, pois lá morava suas tias e primos. Lindo ficou vermelho de vergonha, não sabia o que falar. Mas pra não desagradar a noiva aceitou ir. Tia Mila e tia Bernarda eram senhoras alegres, cozinheiras de mão cheia. Eram também assanhadas. Naíra não sabia desse comportamento atrevido das tias, haja vista ter muitos anos que não as via. O último contato foi na adolescência, depois que Naíra entrou pra faculdade, só se dedicou aos estudos e não tinha mais tempo pra passear. As tias acharam Lindo um " príncipe", " um pedaço de mau caminho", palavras delas. Lindo já chegou sendo recebido com muitos mimos, comeu bastante da maravilhosa culinária mineira de dar água na boca. Ele não queria, mas pra não fazer desfeita comeu. E as tias mandando ele comer mais, e dizendo para Naíra que ela não iria ficar casada muito tempo se não soubesse fazer uma boa comida para Lindo. Lindo comeu muito, até ficar com dor de barriga. Quando todos já estavam se arrumando pra fazer o passeio de charrete, Lindo não aguentou e foi ao banheiro. Foi sem falar nada com ninguém. Após se aliviar, olhou e percebeu que tinha entupido o vaso sanitário.

Mas com medo, ficou quieto e saiu com a noiva e as tias para fazer o passeio. Só quem ficou em casa foi o pequeno Rômulo, o priminho de 7 anos de Naíra.

Lindo gostou muito de Caxambu, conheceu o Parque das Águas. A dor de barriga foi passando, e a dor agora era a agonia de não ser descoberto como o autor do entupimento no vaso. Enfim, todos chegam em casa. Rômulo está assistindo a desenhos no celular. Tia Mila chega apertada para urinar. É quando ela, ao dar descarga, nota o problema no vaso. A culpa cai em Rômulo, que chora e diz que não foi o causador. Tia Bernarda olha pra irmã e diz que é impossível uma criança de 7 anos fazer " um serviço" daquele tamanho. Tia Mila e tia Bernarda suaram para desentupir o vaso, e enquanto isso Lindo só sentado assistindo a tv. Suando frio, sem dizer nada. O vizinho das tias, que era pedreiro e encanador, arrancou o vaso. Lindo falou para Naíra que estava com vontade de ir embora. Naíra estava também querendo ir embora por causa que estava incomodada de ver suas tias dando em cima de seu noivo. Naíra então se despede das tias:

" Minhas tias queridas, eu e o Lindo vamos embora pra casa. Amanhã ele acorda cedo pra ir trabalhar. Ficamos muito felizes de passarmos esses dias aqui. Eu desejo que as senhoras sejam muito realizadas em tudo, principalmente no amor. E que ambas encontrem cada uma o seu Lindo. "

Lindo dá um dinheiro para as tias arrumar o vaso. As duas senhoras começam a gargalhar, dizendo.

" Minha sobrinha, fique tranquila! Nós até achamos ele realmente Lindo! Pensamos até que ele fosse pão -duro, mas que bom que não é! Só que um marido cagão, nós não queremos! Queremos um homem de culhão! Homem mesmo!

( Autor: Poeta Alexsandre Soares de Lima)

Poeta Alexsandre Soares
Enviado por Poeta Alexsandre Soares em 11/09/2022
Código do texto: T7603343
Classificação de conteúdo: seguro