Conto criptomonetário
Os anos eram os sessenta, com o mundo em acelerada transformação. A televisão, o ieieiê, as modas ousadas, a indústria automobilística... mas a fábrica de tecidos, de Pitangui, continuava a mesma: implacável nos seus horários, nos salários, mas sendo o eixo balizador da economia do município, e mais além.
E papai levou consigo o petiz Zeluiz que registrou e relatou a solenidade do recebimento do ordenado, que se fazia diretamente na boca do caixa do escritório da companhia, com o dinheiro contido em envolopes amarelos. Setenta e três mil cruzeiros, e uma fração. Setenta e poucos contos de réis.
A seguir, foi a hora do giro pela cidade, para a quitação dos débitos: açougue, armazém, padaria, loja do Inácio Campos, do Paulim Ferreira, a farmácia do Benjamim, agora com o filho Ziquinha no comando...e mais uns dois ou três estabecimentos, o o Zeluiz de olho no envelopinho de papai, que ia se esvaziando...e, praticamente concluída a rodada, papai, seguido do menino, adentrou o Bar Elite, ou foi o Popular, ou foi o do Geraldo Lemos...? Pediu um refrigerante, geladim, umas guloseimas, mas o guri, embora saciado de paladar, mal engolindo a empada, perguntou ao pai:
- Ué, papai, assim numa só rodada e todo o dinheiro acaba...?
Ao que papai respondeu, com judiciosa convicção:
- É meu filho, o dinheiro é necessário, mas o que vale mesmo é o crédito, a confiança na praça...