Fabíola e Anecondes as escolas
Em janeiro de mil novecentos e noventa e sete, éramos apenas quatros crianças, papai já havia morrido, mamãe cuidava de nós quatro sozinha, a luta era árdua mas ela dava conta, a escola era próxima de casa, eu já havia deixado os estudos, havia desistido de estudar, tinha apenas meus dezenove anos, completaria vinte em setembro.
Neste período eu vivia a procurar emprego, mas nada de encontrar algo, até que as idas e vindas na escola Fabíola de Lima Goyano para fazer nossas algazarras e paquerar as garotas, me fez conhecer Aparecida, conhecida pelo carinhoso apelido de Cida, uma baixinha que tomava conta da biblioteca, era solteirona, morava com a irmã e mais quatro gatos e dois cachorros, Cida era a responsável pelos livros da escola, e conversa vai conversa vem, ela né oferece um trabalho na biblioteca, só dependia de uma condição e uma aprovação, a condição era eu voltar a estudar, a aprovação era a dona Regina diretora aprovar, e ambas não era difícil de serem conseguidas, tendi em vista que a escola precisava de alguém e eu precisava de um empurrão para voltar aos estudos após três anos de atraso dois por ter sido reprovado outro por ter abandonado a escola.
Pois bem, acertados os detalhes, dei início às aulas, e logo na semana seguinte lá estava eu na sala de aula, turno da noite, sétima série, pela manhã começava o trabalho às oito da manhã, almoçava, e às dezessete da tarde saía para casa, tomava meu banho e retornava para a escola a noite, e assim foi até fecharmos setembro, quando minha sala estava de mudança para uma nova escola que estavam construindo alí mesmo a menos de um quilômetro do Fabíola, começamos na nova escola naquele setembro de mil novecentos e noventa e sete, minhas manhãs e tardes eram no Fabíola, noite era no Anecondes nossa nova casa, meu trabalho no Fabíola era atender alunos na biblioteca e registar entrada e saída de livros, catalogar novos livros, fazer carteirinhas de estudantes para a utilização da biblioteca, era um trabalho divertido, jogávamos xadrez, dominó, damas, tínhamos dois computadores na época muito difícil de se utilizar, mas estávamos aprendendo, tínhamos a visita de amigos que sabiam e nos davam dicas todos os dias, jogavam xadrez amigos como o Hércules, Ricardo, Everaldo, Haroldo, eram espertos demais no jogo, outros apareciam para bater papo, os irmãos Cleidson e Cintia, Ricardinho e Renan, por vezes apareciam também as gêmeas Leila e Leiliane, e as risadas eram garantidas, dentre outros muitos que hoje me fogem à mente, contudo também tínhamos também nossos mestres, professor Gerson que sempre buscava materiais para suas aulas de educação física, professora Osita para suas aulas de literatura, livros que era emprestados para uma aula e em seguida eram devolvidos, também tínhamos a professora Cleide que em suas aulas de ciências sempre utilizava a biblioteca para uma oi outra atividade, e assim era todos os dias, os corredores do Fabíola eram movimentados, o pátio era enorme, algumas mesas para a hora do intervalo, as festas que ali tínhamos eram divertidas, não tem como esquecer as festas juninas, dançávamos os casais recolhidos pelos sorteios de alguns professores outros pelas trocas que fazíamos até mesmo pela afinidade uns com os outros, e nos dias das festas, ah nestes dias era uma alegria danada, a caixa de som era colocada no pátio, dona Regina sempre atenta e preocupada com a organização, Dona Maria do Carmo a vice diretora uma senhora amável e doce, sua voz tão meiga, mulher que dedicou sua vida a lecionar e orientar alunos, deu a vida pela educação, me lembro das tantas vezes seu pai já idoso deixando ela na porta da escola numa Variant, era ele e sua esposa também uma senhorinha muito simpática, uma vez até fui na casa da dona Maria do Carmo, tomei um café e comi bolo, sempre muito atenciosa com seus amigos.
Tínhamos também as amigas que trabalhavam na secretaria da escola, a Socorro, a Beth, a Cirene e dona Maria José, sempre atenciosas para atender os pais dos alunos, fim de ano era uma correria, renovação de matrículas, transferências, entre outros serviços.
Mas voltando às festas juninas, era uma alegria que só naquele pátio enorme, dona Maria José neste tempo ainda era nossa merendeira, mas estudava que nem condenada, até que um dia se merendeira, tornou-se professora de Artes, uma inspiração para muitos, as festas juninas eram divertidas pois nelas nossas famílias podiam entrar e participar, e quando tudo acabava, restava a saudade e a ansiedade de que o novo ano chegasse rápido para voltarmos a dançar, os ensaios semanas antes eram uma alegria que só, além de nos tirar daquelas aulas chatas de matemática e isto falo com as mãos nos olhos se vergonha pois é preciso esconder neste momento, era uma diversão, saíamos para o pátio para os ensaios e muitas das vezes de lá mesmo íamos embora, muitos dos ensaios era nas duas últimas aulas.
Eu me lembro que por vezes pulava o muro da escola de minutos antes da aula acabar para fugir das muitas brigas que arrumava, isto antes de começar a trabalhar na mesma escola onde estudei, eu diria que uns quatro anos antes.
Em mil novecentos e noventa e nove, perdemos um grande amigo, já citado acima, sempre gostava de jogar xadrez na biblioteca junto com outros amigos, Hércules numa viajem com a família, morreu após sofrerem um acidente, da família não sobrou ninguém, aquele ano foi um ano de muita tristeza na nossa escola, todos amavam o Hércules, era ele e sua irmã que estudavam na mesma escola, tinha outro irmão mais novo, todos se foram, não cabia palavras para expressar nossa tristeza quando nos chegou a notícia da sua partida.
As aulas de educação física com o querido professor Gerson eram de tirar o fôlego, as garotas tinham uma queda por ele, olhos verdes, era um jovem ainda, boa pinta, jogávamos basquete, vôlei, queimada, e óbvio não podia faltar o futebol, na hora do futebol era uma briga, todos queriam jogar, a quadra ficava pequena, Rogério então era um Ronaldinho gaúcho jogando.
Acabavam as aulas de educação física, e retornava nós para a sala de aula, hora era história, hora geografia, hora matemática ou até mesmo literatura, história quem era o nosso professor era o Antônio, um professor negro, não muito escuro, muito gente boa, me lembro de ter aprontado muito com ele, zoava muito as aulas, hoje de certo com muito arrependimento, certa feita, numa quinta-feira, a suas últimas aulas era deste professor, eu já havia matado as últimas aulas dele no dia anterior, recomendo não fazerem o mesmo, anos depois sentirão aquele remorcio, pois bem, ele me olhou e me chamou pelo nome, fitou os olhos em mim e soltou suas palavras:
-Roberson ontem a aula estava muito boa sem você.
Eu imediatamente voltei para minha cadeira, peguei meus cadernos e livros e fui me dirigindo em sua direção, sentava no último corredor que dava acesso a sua mesa, ao passar por ele, ele me perguntou:
-Onde você vai?
-Vou embora professor, se ontem estava bom, hoje vai continuar melhor então.
Sai da aula dele e fui embora, levei duas faltas naquele dia, e no fim daquele ano, passei na matéria dele, esbarrando na reprovação.
Outra matéria que me lembro era a de literatura, num ano era Osita, no outro era a professora Márcia, ambas não perdoavam não, a Márcia era uma morena alta, cabelos crespos, era gente boa, mas não tentasse enrolar ela pois não dava certo não, na lousa era rápida, quando você pensava que estava acabando vinha ela com outra lousa cheia de rabiscos e mais rabiscos, eu confesso que preferia quando ela resolvia fazer ditado, era melhor se acompanhar.
Na matemática éramos orientados pelo professor Jonas, pensem num professor sério que não era muito de se abrir a rir, aplicava suas provas e seu olho cortava a sala toda olhando para ver se não tinha alguém colando, o matéria difícil, não era muito fã dos números, não gostava da hipotenusa, do cateto, muito menos das equações de segundo grau, pior ainda as frações, mas conseguia passar apertado mas passava.
No ano que fomos para o Anecondes, as coisas mudaram, a diretora era dona Marineide, ela era muito severa, não aceitava alunos nos corredores da escola tendo aula na sua sala, se era para ir ao banheiro tudo bem, mas ficar de conversinha em corredor era motivo para ser chamado atenção, e nisto até que tinha razão, a escola era nova, salas muito bem equipadas, nossa biblioteca era muito linda, a está altura já em meados dos anos dois mil, eu já não estava mais na biblioteca do Fabíola, já havia saído no começo do anos de mil novecentos e noventa e oito, meu contrato não havia sido renovado, mas segui ajudando no que podia, enquanto isto a escola Anecondes estava muito boa, tínhamos a está altura amigos novos e amigos que já nos acompanhavam vindos do Fabíola, Estevão era um dos mais atentados, aprontava todas, Daniel e Ana Paula era o casal de namoradinhos, também tínhamos outros casais que se pegavam, no período do Anecondes tínhamos nossa queridas professora Nenê, era a vice diretora, já era conhecida do Fabíola, e outro grande professor Daniel, este era querido por todos, até pelos mais atentados da escola.
O Anecondes era um caixote retangular,.não dava para matar aulas, diferente do Fabíola que era uma escola mais aberta com corredores dando acesso ao corredor principal, no Anecondes diferente do Fabíola o coordenador andava pelos corredores com maior frequência e eram apenas três corredores sendo eles por um por andar, tínhamos apenas duas saídas ou entrada, voltando ao Fabíola me lembro de um certo dia ter matado uma aula, na verdade tínhamos sido impedidos de entrar na aula da então professora Hilda, aliás não falei dela ainda, era uma professora negra, muito severa que não aceitava alunos chegarem na sala de aulas depois dela, quando ela já estivesse na porta quem atrás dela chegasse não entrava, isto era uma regra que tinha que ser seguida a risca, então neste dias eu, o Cléber e mais outros três amigos de salas diferentes, acabamos matando a aula desta professora, eu, porque ter chegado atrasado na sala, e impedido de acessar a sala então fiquei para fora,.estávamos brincando, fazendo nossas badernas, e nesta época tínhamos a merendeira Maria José, aquela merendeira citada mais acima, que do posto de merendeira passou a inspetora de alunos, andava pelos corredores do Fabíola com sua tabela de aulas, naquele caderninho tinha nomes de professores, era anotado se estavam presentes ou não, e qual aula eles fariam naquele período, ao chegar no nosso corredor, ela percebeu um movimento estranho e suspeito, quando a avistamos de longe vindo, corremos e entramos no banheiro masculino, alguns sentaram no vaso para fingir estarem usando o banheiro, eu, entrei atrás da porta e ali fiquei, até que ela entra e começa a bater de porta em porta, de certo alguém já havia nos delatado, não tinha como ela desconfiar que estávamos matando aulas, ela com sua astúcia, pegou um por um e já estava a caminho da saída do banheiro, eu seguia ali atrás da porta escondido sem ser notado, mas sempre tem um que estraga a alegria, do nada Cléber solta a voz, "se vai levar a gente então vai levar o Roberson também, ele está atrás da porta", confesso que tomei uma raiva daquele caguete, fomos todos para a sala da dona Regina, naquela época chamávamos aquilo de, tomar um café com a dona Regina, no dia seguinte lá estava minha mãe, e eu só entrava se ela comparecesse na escola, já podia preparar as orelhas e ouvidos.
A escola Fabíola tem muitas histórias boas a serem relembradas, eu era como aquele patinho feio, para não dizer que nunca namorei na escola tive uma namorada e uma paquera que quase me rendeu um olho roxo, outros problemas que me recordo são as vezes que era obrigado a sair correndo no meio da aula e ir para casa separar meus pais, minha mãe uma deficiente física, meu pai um cachaceiro que saia pela manhã para vender seus doces quebra-queixos, um doce feito com coco e açúcar.
Eu sentava sempre na janela, pois sabia que a qualquer momento poderia chegar um dos meus irmãos e bater na janela me gritando, e assim foi por anos antes de ir para a escola nova, mas relembrando ainda estes tempos falei do, quase me rendeu um olho roxo, tinham as gêmeas na escola, moravam no inamar, Leila e Leiliane, era lindas,olhos verdes, e eu comecei a me encantar com uma delas, só não pergunte qual, pois difícil aqui lembrar, só lembro que foi justamente a que estava noiva, e acabamos dando uns beijos na biblioteca, neste período eu já estava a trabalho na biblioteca, a Cida nem imaginava que eu estava de paquera, mas sempre me foi exigente, "nada de namoros aqui, trabalho é trabalho e não se pode confundir as coisas", após ter dados estes beijos na gêmea, a notícia de uma certa forma bateu aos ouvidos do seu noivo que por duas vezes esteve na escola a minha procura, eu desconversei e depois nunca mais ele apareceu, não sei qual motivo e confesso que não tenho curiosidade em saber, passados alguns meses, comecei então uma paquera com a Agne, eu diria até que esta foi a primeira namorada que realmente eu tive, tive outro romance mas que não levei a sério era apenas uma forma de dizer que estava namorando mas não tinha amor ou queda, foi apenas por empolgação, a Agne era sobrinha da professora Maria José, aquela que era a merendeira e se tornou professora de artes, uma moça linda, me lembro dela ensaiando em casa uma canção para cantar na escola, um trabalho de inglês, namoramos uns três meses até que do nada acabou, confesso que chorei, mas superei.
A primeira feira de ciências na escola era um dia eventos mais esperados, estávamos animados, fizemos grupos e cada grupo teve seu tema, eu, e meus amigos pedimos um ofício na diretoria e fomos ao cemitério, pedimos um crânio humano emprestado, para levar, eles nos emprestaram, rapaz foi uma emoção levar aquele crânio, dentro do ônibus, pegamos um dia antes do evento e levamos de volta no dia seguinte, a feira foi um sucesso, arrumamos um aquário, colocamos alguns apetrechos para enfeitar, e antes claro foi analisado em sala de aulas, conclusão, aquela crânio era de um fumante, só não pergunte se era homem ou mulher, até hoje tenho está dúvida, lembro da Meire e seus amigos de grupo, pegaram um gato morto semanas antes, enterraram ele, e depois montaram os ossos dele e aplicaram verniz para apresentarem, alguns também fizeram com ossos de cachorro, outros levaram sementes, outros mudas de árvores, outros montaram maquetes de cidades, vulcões, foi uma feira muito divertida, terminando a feira cada um recolheu seu trabalho e o levou ao seu destino de origem, alguns foram para o lixo,outros devolvidos aos seus donos.
Já no Anecondes a formatura da oitava série foi marcada na minha vida por um fato, meu pai já não estava mais presente, havia partido dois anos antes, minha mãe não era muito de sair ainda mais quando se tratava de ser noite, então fomos eu e meus irmãos, mas o fato é, com quem eu iria dançar a valsa?
Olhei, pensei e repensei e vi a professora Maria José com sua família numa mesa, e pensei, quem mais poderia representar minha mãe? Se não ela a professora Maria José, aquela que já me pegou matando aulas, que já me deu vários conselhos e sempre esteve comigo ali na escola apoiando no que era certo e chamando atenção no que estava errado, então me dirigi a mesa dela, e perguntei… "professora, a senhora dançaria a valsa comigo?" Ela olhou e surpresa né respondeu: " claro meu filho, mas sua mãe não vai dançar?" Eu triste respondi: "minha mãe não pode vir, ela não estava se sentindo bem". Que nada a mãe estava em casa e bem, mas era o jeito da minha mãe, não curtia festas era do interior, e até hoje é assim, não gosta muito de sair, naquela noite a professora Maria José foi minha mãe por alguns instantes e dançou a valsa comigo, tenho registrado em fotos tal ato.
As histórias do Fabíola e do Anecondes vão longe, mas por hora vou terminar por aqui, qualquer dia destes volto com mais histórias.