Eucalipto Compete Até Com o Homem
Por Nemilson Vieira de Morais (*)
Em 1978, de muda, dona Iraci Pimentel da Costa, sem marido, deixa Conselheiro Pena (terra de Fernando Mendes) com destino à Belo Horizonte; com 10 (dez) filhos, netos, nora...
Na capital mineira, estabeleceu-se com sua prole, na comunidade "Mãe dos Pobres", Céu Azul (zona norte).
Acomodaram-se num barraco pequeno de dois cômodos, telhado rebaixado, telhas de amianto.
A primeira noite foi difícil, à luz das lamparinas: dia seguinte, borrões em volta dos orifícios nasais de cada um.
A partir de então deixaram de lado, as lamparinas: adotaram velas, para clarear a casa, nas noites escuras.
— No lugar de origem, usaram as lamparinas, mas, a casa da família possuía telhado alto e não haviam passado por aquela incômoda experiência.
A comunidade, carente, ainda não contava com o abastecimento de água, fornecimento de energia, rede de esgoto...
Dona Iraci, com a escada de filhos (alguns, ainda pequenos), ninguém mais para ajudar, foi à luta em busca do sustento da família...
Nas lavagens de roupas, limpezas de terrenos, na redondeza, de enxada, foice, facão... buscava água distante, à cabeça, na cacimba de dona Preta (que gentilmente a permitia).
— Levava os meninos com ela na labuta; com suas vasilhas, para ensina-los como é que fazia para não morrer de cede, sobreviver.
— O excedente do líquido vital, dona Iraci o vendia àqueles que não podiam buscá-lo. Eles dependiam da prestação do seu serviço, no abastecimento hídrico, ela, deles, no alimento dos filhos.
Até então nada de COPASA, de serviço público, de abastecimento de água potável, na Mãe dos Pobres.
Alguém deu a ideia de cavarem uma cisterna no lote de dona Iraci; unânimes acataram a proposta. Os filhos, mais crescidos, se encarregaram do trabalho.
Quase desistiram, pela dureza do serviço e desânimo de não acharem o que procuravam em duras profundezas.
Com mais algumas picaretadas, em pouco mais de 7 (sete) metros de profundidade, o milagre aconteceu: do seio da terra, água-boa jorrou com abundância... Naquele dia a alegria do feito contagiou o mundo.
Ia tudo muito bem com o achado, com aquela galinha dos ovos de ouro. Havia água com fartura, para a casa, as plantas, os bichos; vizinhos .
Com uma bomba-d'água enchiam caixas e mais caixas da preciosidade; com isso, alavancou às vendas de água.
Continuou nesse ritmo por bastante tempo...
Até algo muito estranho acontecer: do nada, a cisterna da dona Iraci, com quase dois metros de lâmina d'água começou a secar, secou.
— A poeira podia subir (do fundo do poço) de onde o milagre havia acontecido.
A situação foi um Deus nos acuda... Sem aviso prévio aquelas torneiras hídricas, se fecharem.
As perguntas sobre o episódio, ficaram: por que, qual a explicação a isso?
Já que o "choro dura uma noite", a alegria precisava voltar...
— Como de fato, voltou, quando alguém da casa, dentre tantas outras árvores distribuídas pelo quintal: ingazeiras, jurubebas, urucuns, bananeiras, amoras...
Teve a ideia de suprimir um lindo pé de eucalipto, de uns dois anos, plantado a uns 10 m do poço.
Dona Iraci voltou a sorrir e, às lides de antes com mais prazer.
Apesar das limitações da idade e de alguns problemas de saúde que se acomularam ao longo do tempo, dona Iraci não era de ver a vida passar de braços cruzados.
— Chegou a trabalhar nas roçagens de terrenos com poucos dias de uma cirurgia de bexiga (sem estapta a isso).
Estava numa felicidade só com o retorno da água à sua cisterna, com os filhos criados, com o legado de honradez, trabalho deixado a eles.
Após o descanso de mais um dia de luta, dona Iraci descansou dos trabalhos da vida: morreu dormindo (aos 54 anos).
—
Eu soube por Moacir (um dos filhos de dona Iraci) que, usa-se como técnica o reflorestamento de áreas pantanosas com o eucalipto, com o objetivo de drenagem hídrica do terreno...
* Nemilson Vieira de Morais
Gestor Ambiental/ Acadêmico literário. (18:06:22)