O Doutor e o Matuto
Óia seu moço...
Nóis é da roça
E num fala errado.
Nóis fala deferente.
O sinhôre fais discurso
Pa dotôre e intelectuale
E nóis cunversa cum as semente.
Se a ponta dos seu dedo
A caneta num lhe faiz o calo
As nossa mão
Parece inté um ralo.
É a força dos nosso braço
No cabo da inxada
Desse caipira falado.
O sinhôre pode inté achá
Qui nóis é bobo
Mais nóis sabe da quentura
Qui tem o misterioso fogo.
E memo cum o sole iscardante
Cum o suóre constante
Nóis alimenta esse povo.
Seu moço!
Se o sinhôre pudé rabiscá a terra
Cumo nóis rabisca
Prante uma semente pro bem.
Quem sabe vocemecê ricunhece
Que nóis inté merece
Sê aletrado tomem?
Nosso traje tomém é deferente.
Nóis carça butina...se tivé
Se num tivé, nóis vai de pé no chão
Purisso nóis é matuto do pé rachado.
Nóis num usa terno e nem gravata
Nem essa tale de bravata
Qui a gente vê nos arrogado.
Na sala do sinhore
Tem um tale de are cundicionado
Nóis tem o vento
Que sempre foi nosso aliado.
E assopra os nosso sembrante
E nóis fica radiante
E inté imocionado.
Hoje tem Cambuquira
Pa mode fazê cum abobra.
No nordeste é Girimum
É cumida rocêra seu moço
Que agrada quarqué pião
Num é o tale caviá
Que qem só come é barão.
Seu moço! Nosso jeitio é ansim...
Iguale fumaça de chaminé.
Num tem dereção e nem lugá
Ela ispaia a nossa fé
Aqui nóis fala e Deus intende
Deus num vem de Cadilac
Deus vem é pé.
Roça, roçado
Serra, Cerrado
Rio, riacho
Da cana, o melado
Dá licença seu moço...
A terra me espera
Meu tempo é sagrado!
Pa arresumi eu vô arritirá.
A labuita é grande...
Eu vô iscrivinhá na terra
Tenho família pa mode tratá.
E o sinhôre iscrivinha no papele
Mais vai se alembrá de mim...
Na hora do sinhôre armuçá.
Inté!