Capítulo 12: O enterro de Josias junto com a fé na Capelinha de Santo Antônio e na existência de qualquer poder sobrenatural.
A morte é mesmo muito triste e inaceitável quanto aos merecimentos de quem vai e de quem fica. Mas aquela morte inexplicável do menino Josias, o Senhor Fontes não entendia e não aceitava.
Era um homem sóbrio, um tanto quanto frio e calculista às vezes, mas em se tratando de certas situações sofria muito, apesar de não deixar que outras pessoas percebessem. Josias era uma criança boa e alegre. Não merecia passar por tão grande sofrimento até morrer. E parte daquele sofrimento do filho fora causado por ele mesmo. Seja por sua ausência na fazenda, seja por sua falta de iniciativa de levá-lo logo ao hospital devido a suas crendices animistas e sua descrença na medicina.
Era sua culpa que o filho não tivesse tido um tratamento adequado e no tempo certo. Mas agora não adiantava mais lamentar, foi o que o Senhor Fontes disse a um dos seus homens de confiança ao chegar na fazenda com o corpo do menino já dentro de um caixãozinho do seu tamanho.
Ninguém esperava por aquele desfecho, mas o fato é que a família se viu as voltas com o velório e o enterro da criança em plena época de novenário para o Santo padroeiro.
O Senhor Sizinane, que não conseguiu fazer nada pra salvar o neto, tirou o chapéu diante do caixãozinho e chorou. A dona Josefa, apoiada pela Dona Emília também estava abatida, mas disseram que não derramou nenhuma lágrima de pesar, porém também não falava coisa com coisa. Ficara na sua cabeça as palavras do pai, que conseguiu fazer com que todo mundo apontasse a outra criança, seu outro filho, como culpada.
E assim, aquela acusação perseguiu o menino Manuel. Que de tanto repetirem o assunto, cresceu com essa crença de que tinha sido mesmo o culpado da morte do irmão. E sua mãe, embora não o cuplasse de fato, não dissera nada para aliviar esse peso de suas costas tão pequenas, na época com apenas oito ou nove anos de idade.
Como o menino morto não fora batizado ainda, seu enterro foi feito ali mesmo, ao lado da Capelinha de Santo Antônio, na própria fazenda. E o Senhor Fontes, após o sepultamento do filho, deu ordens para que retirassem da Capela, a imagem do Santo padroeiro e a levassem embora de lá, pois ele não queria mais vê-lo nem pintado de ouro.
Espalhou-se na cidade que um dos seus homens quebrou a estátua e jogou numa vala próximo da mata. Outros disseram que o homem levou para a sua própria casa e nunca dissera nada a ninguém para não contrariar o patrão. Mas a verdade é que ninguém sabe sobre o paradeiro da estátua.
Desde então o Senhor Fontes nunca mais permitiu que missas fossem realizadas na sua propriedade. Muitas pessoas acreditavam, inclusive, que toda a sua desgraça dali em diante se devia a uma vingança desse Santo rejeitado. Pois muitas coisas ruins vieram a lhe acontecer depois disso.
Disseram também que a morte do menino Josias fora um teste para sua fé em Santo Antônio. Que este havia tomado a vida de Josias em sacrifício e o Senhor fontes não aceitara a barganha.
Mas essas especulações não passavam de invenções das cabeças maldosas e cheias de criatividade para tentarem explicar as atitudes do fazendeiro, as quais eles simplesmente não conseguiam compreender.
O que todas as pessoas souberam foi que, naquele dia e junto com o corpo do filho, o fazendeiro enterrou sua fé nos Santos católicos. Ninguém podia supor, no entanto, que não fora só a fé daquele pai que morrera, mas a do seu filho Manuel também. Os fatos que se sucederam a partir do conserto da capela só ajudaram a criar na mente daquela criança uma nova forma de ver o mundo. Sem preces, sem orações ou crendices de qualquer natureza. E junto com o corpo do irmão, o menino Manuel sepultou sua fé no curandeirismo bem como no seu avô Sizinane, que perdeu todo o seu respeito e admiração.
Seja por não ter ajudado Josias a ficar vivo, seja por tê-lo acusado dizendo que o culpado da doença do menino fora ele, daquele dia em diante o poder do avô não existia mais e o do Santo Antônio, coisa que criança não entendia de qualquer forma, também se fora. Mesmo porque ele, o Santo, já não estava mais ali para provar nada nem tampouco se manifestar.
Dali em diante a Capelinha virava um simples cemitério na fazenda que aos poucos foi sendo abandonado e esquecido como tudo que se perde no tempo e na história. E se a memória de um irmão não lhe acode o registro nestas páginas, o menino Josias nem existiria mais...
Continua...
Adriana Ribeiro
A morte é mesmo muito triste e inaceitável quanto aos merecimentos de quem vai e de quem fica. Mas aquela morte inexplicável do menino Josias, o Senhor Fontes não entendia e não aceitava.
Era um homem sóbrio, um tanto quanto frio e calculista às vezes, mas em se tratando de certas situações sofria muito, apesar de não deixar que outras pessoas percebessem. Josias era uma criança boa e alegre. Não merecia passar por tão grande sofrimento até morrer. E parte daquele sofrimento do filho fora causado por ele mesmo. Seja por sua ausência na fazenda, seja por sua falta de iniciativa de levá-lo logo ao hospital devido a suas crendices animistas e sua descrença na medicina.
Era sua culpa que o filho não tivesse tido um tratamento adequado e no tempo certo. Mas agora não adiantava mais lamentar, foi o que o Senhor Fontes disse a um dos seus homens de confiança ao chegar na fazenda com o corpo do menino já dentro de um caixãozinho do seu tamanho.
Ninguém esperava por aquele desfecho, mas o fato é que a família se viu as voltas com o velório e o enterro da criança em plena época de novenário para o Santo padroeiro.
O Senhor Sizinane, que não conseguiu fazer nada pra salvar o neto, tirou o chapéu diante do caixãozinho e chorou. A dona Josefa, apoiada pela Dona Emília também estava abatida, mas disseram que não derramou nenhuma lágrima de pesar, porém também não falava coisa com coisa. Ficara na sua cabeça as palavras do pai, que conseguiu fazer com que todo mundo apontasse a outra criança, seu outro filho, como culpada.
E assim, aquela acusação perseguiu o menino Manuel. Que de tanto repetirem o assunto, cresceu com essa crença de que tinha sido mesmo o culpado da morte do irmão. E sua mãe, embora não o cuplasse de fato, não dissera nada para aliviar esse peso de suas costas tão pequenas, na época com apenas oito ou nove anos de idade.
Como o menino morto não fora batizado ainda, seu enterro foi feito ali mesmo, ao lado da Capelinha de Santo Antônio, na própria fazenda. E o Senhor Fontes, após o sepultamento do filho, deu ordens para que retirassem da Capela, a imagem do Santo padroeiro e a levassem embora de lá, pois ele não queria mais vê-lo nem pintado de ouro.
Espalhou-se na cidade que um dos seus homens quebrou a estátua e jogou numa vala próximo da mata. Outros disseram que o homem levou para a sua própria casa e nunca dissera nada a ninguém para não contrariar o patrão. Mas a verdade é que ninguém sabe sobre o paradeiro da estátua.
Desde então o Senhor Fontes nunca mais permitiu que missas fossem realizadas na sua propriedade. Muitas pessoas acreditavam, inclusive, que toda a sua desgraça dali em diante se devia a uma vingança desse Santo rejeitado. Pois muitas coisas ruins vieram a lhe acontecer depois disso.
Disseram também que a morte do menino Josias fora um teste para sua fé em Santo Antônio. Que este havia tomado a vida de Josias em sacrifício e o Senhor fontes não aceitara a barganha.
Mas essas especulações não passavam de invenções das cabeças maldosas e cheias de criatividade para tentarem explicar as atitudes do fazendeiro, as quais eles simplesmente não conseguiam compreender.
O que todas as pessoas souberam foi que, naquele dia e junto com o corpo do filho, o fazendeiro enterrou sua fé nos Santos católicos. Ninguém podia supor, no entanto, que não fora só a fé daquele pai que morrera, mas a do seu filho Manuel também. Os fatos que se sucederam a partir do conserto da capela só ajudaram a criar na mente daquela criança uma nova forma de ver o mundo. Sem preces, sem orações ou crendices de qualquer natureza. E junto com o corpo do irmão, o menino Manuel sepultou sua fé no curandeirismo bem como no seu avô Sizinane, que perdeu todo o seu respeito e admiração.
Seja por não ter ajudado Josias a ficar vivo, seja por tê-lo acusado dizendo que o culpado da doença do menino fora ele, daquele dia em diante o poder do avô não existia mais e o do Santo Antônio, coisa que criança não entendia de qualquer forma, também se fora. Mesmo porque ele, o Santo, já não estava mais ali para provar nada nem tampouco se manifestar.
Dali em diante a Capelinha virava um simples cemitério na fazenda que aos poucos foi sendo abandonado e esquecido como tudo que se perde no tempo e na história. E se a memória de um irmão não lhe acode o registro nestas páginas, o menino Josias nem existiria mais...
Continua...