SOBREVIVI A UM TEMPORAL DE BARCO
 
Eu sempre quis ter um barco, quis, mas não quero ter mais. Um amigo que tinha algumas horas em barco a vela me falou lá no Veleiro do Sul, tenho um amigo que quer vender o seu barco, é um veleiro classe Snipe, com duas velas, é para andar com vento, não tem motor, acho que tu vais gostar, é bem esportivo.  Eu esta lá no Ipanema, não sabia nem entendia de barco, mas fui e levei o meu amigo. Gostei da tralha, e acabei fechando o negócio. Acabei sendo um feliz proprietário de um barco Snipe, com nome e tudo, chamava-se DUNGA, e o levei para a praia de Ipanema e o deixei na casa do meu amigo. Acho que eu tinha mais ou menos uns 28 anos. Atualmente em 2021 estou com 78.  
 
Fizemos passeios pelo Guaíba, Gostávamos de atravessar o Rio Guaíba, e ir da praia de Ipanema, até a praia da alegria no lado oposto, onde almoçávamos um ótimo galeto, tomávamos banho na praia e depois voltávamos, antes da noite, pois era uma travessia bem demorada.
 
 A nossa intenção, era ganhar algumas gatas em Ipanema. Por isso agente ficava dando banda no barco, às vezes virávamos e depois a gente voltava a colocá-lo em pé, um sarro só.
 
 Numa tarde muito linda, com um sol reluzente, pedindo um ótimo passeio no Snipe, Fui até a casa do meu amigo, trouxemos a nave até a beira de Ipanema, montamos as velas, corrigimos os demais equipamentos, e saímos para a beira da praia para ver de alguma gata gostaria de participar das nossas emoções num belo passeio com o nosso barco.
 
Conseguimos uma sozinha tomando banho de sol, que queria uma aventura diferente.  Zarpamos nós três, eu, meu amigo e a menina, que tínhamos conhecidos naquele dia.  Não atravessamos o Rio, mas fomos parar num costão, bem longe da praia, onde aportamos, conhecemos o lugar, e quando estávamos voltando, no meio do Rio, alguns quilômetros da costa do Ipanema.  O barco ficou parado por falta de vento, então nós ficamos nadando e mergulhando em volta do barco, curtindo a vida e na espera de algum vento que nos levassem até a praia. E nada acontecia, não tinha vento nenhum, e o barco não de movia. Então eu falei para os meus amigos quem sabe vocês fazem algumas orações na esperança para vir um belo vento e tirar a gente daqui.  Nós já estávamos ficando nervosos, lá no meio do Guaíba, Será que não vamos ficar até a noite sem vento. Mas começou e vir um pequeno vento, ficamos todos felizes, e nós conseguimos fazer o barco andar. Viva estamos indo.  Mas o vento continuou assoprando cada vez mais, o barco parecia uma lancha andando. Eu pensei em breve estaremos em Ipanema, mas continuou ventar cada vez mais, eu resolvi amarrar a mão da menina com uma das cordas que amarram as velas.
 
Começou a chover intensamente, e o meu amigo me disse abaixe e a primeira vela menor e depois a grande “ele tinha mais prática do que eu” e estava comandando o leme. E a guria amarrada pelo pulso. Baixei a primeira vela. O vento aumentou e a chuva também, raios, as ondas ficaram mais parecidas com tsumani.
 
 O meu amigo não conseguiu segurar o leme, que foi arrancado com parafusos e voou pelos ares, o barco sem comando ficou a deriva, fez um giro de 180 graus, e caiu pesadamente nas águas com todos nós dentro, e ficou com o casco para cima, quebrando o mastro de cinco metros de altura, a bulina  “de ferro” que mantém o barco em pé, foi arrancado pelo fato do barco estar de boca para baixo, e consequentemente foi mais  uma peça angariada pelas profundezas do Guaíba.  O meu amigo ficou enrolado nas cordas de amarras e gritava, e a guria que estava amarrada ficou presa no barco, eu apanhei o pedaço do mastro e me segurei.
 
 As ondas passavam por cima da gente, o que dificultava a nossa respiração. A menina tentou segurar em mim, e fez-me beber mais água, eu não sabia se morria junto com ela, pois eu mal podia me manter, e já tinha pensado fortemente em me soltar e parar com o sofrimento, mas o instinto de conservação foi mais forte do que a minha intenção, e apesar das minhas mãos estarem sangrando eu continuava controlando a respiração e não conseguia desgrudar as mãos. Fiz e menina se segurar melhor no barco, já que estava amarrada pelo pulso, e poder analisar e nossa situação.
 
 Nessas alturas eu tinha me desvencilhado do pedaço de mastro e estava me segurando na parte de baixo do barco, onde tinham os ganchos para amarrar as cordas e com a cabeça quase dentro da água.
 
 Eu tentava me salvar, pois só assim eu poderia fazer algo em prol de todos.  Mas numa situação dessas o medo de manter-se vivo é uma mola muito forte. Não se pensa em outra coisa a não ser a salvação, ou seja, melhorar as condições próprias para poder agir. Estávamos numa situação, em que cada um tentaria de salvar, para depois se possível ajudar um ao outro.  
 
A situação dos náufragos começou a melhorar, o temporal começou e diminuir, e consequentemente as ondas também. Se ele continuasse por mais tempo, eu não via possibilidade de sobreviver.
 
 Consegui ver um barco maior vindo em nossa direção, mas ele desistiu do seu intento, por causa do vento, e voltou para a praia, e a nossa salvação ficou por nossa conta. O meu amigo se desvencilhou das cordas, apensar de ter engolido muita água, a menina estava agarrada no barco. Então nós teríamos que assumir a situação e ver como seria melhor administrado aquele acidente. Nessas alturas todos já estavam salvos naquele momento.  
 
 Resolvemos que teríamos que desvirar o barco. Então fomos os três para um dos lados e fizemos um contra peso, e ele desvirou, mas sobre nós que tivemos que mergulhar e voltar à tona, mas o barco continuou de boca para baixo. Na segunda tentativa ficarão o meu amigo e a menina num dos lados. Eu fui encarregado de me posicionei do lado oposto e quando o barco desvirou pela ação dos dois, eu segurei para que ele ficasse desvirado. Deu certo, ai colocamos a menina em cima, e ficamos dentro da água, e com melhores condições para segurar. O barco encheu de água e ficou com a proa rente à água, por isso não subimos com medo que ele afundasse com todos nos. Aliás, eu achei que ele iria afundar de qualquer maneira.
 
 O toró amenizou e ficamos mais calmos, alguém deve vir nos buscar, a brigada os bombeiros, ficamos na espera, quando avistei um barco ao longe vindo em nossa direção. Viva acho que vamos ser salvos. O barco chegou perto e viu três tripulantes a primeira pergunta, e a outra menina? Não: éramos somente nos três, ele aliviado, bem não morreu ninguém. Amarramos uma corda no casco que era o que sobrou da nossa embarcação. Embarcamos no barco salvador e assim nós escapamos dessa aventura terrível e inesquecível.
 
A menina e o meu amigo fizeram questão de irem a uma igreja agradecer por estarem vivos, eu fui junto para acompanhá-los, só fiquei meditando, pois como eu já havia mencionado, não quis interferir nas intenções dos Santos e nem de Deus, pois acredito que eles devem saber das próprias intenções. Depois que eu fui para casa, aconteceu uma coisa estranha, eu me senti que estava morto, mas não estava, uma sensação curiosa que duraram uns três dias, até cair a ficha.
 
A partir daquele dia eu não quis mais barcos, não era pelo acidente em si, mas não fez a minha cabeça, pois com a moto eu caí dez tombos, e nunca pensei em desistir.  Meu amigo ficou com o que restou do barco e continuou navegando, quanto à menina, nunca mais a vi. Esta foi a minha estória de náufrago.

 
Scaramouche
Enviado por Scaramouche em 20/09/2021
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