ARTES DO CÃO

A aposta era simples. Quem conseguisse pegar o pato de dona Carlinha, para preparar um tira gosto de arrombar, ganhava R$ 100,00 e não entrava na cota das bebidas.

Foram várias as tentativas que os colegas fizeram, mas todas infrutíferas porque o quintal onde ficava a criação de patos gamela era muito bem guardado por Bruce, o super Pit Bull, dono absoluto do quintal onde, depois que anoitecia e que dona Carlinha abria a porta do canil, nem ela mesma entrava com medo dele.

Cocada era uma cachorrinha vira-lata, com pelagem falhada de cor indefinida que apareceu de uma hora para outra e vivia entre os frequentadores dos botecos que sempre lhe davam algo para comer.

Num belo dia de sexta-feira, quando eu estava saindo de casa para ir trabalhar, vi que Cocada entrara no cio e estava sendo assediada por muitos machos vira-latas da qualidade dela.

A solução para ganhar a aposta se desenhou em minha mente.

Coloquei Cocada dentro do quarto de casa com água e comida, tranquei a porta e, durante o dia, telefonei para os colegas marcando o pato à cabidela para o almoço do sábado.

Mais de dez da noite, um bom tempo depois que todas as luzes da casa de dona Carlinha estavam apagadas, coloquei a escada no muro alto e subi levando Cocada comigo.

Silencioso como uma estátua de bronze, o canzarrão observava de perto todos os meus movimentos.

Lentamente baixei Cocada até o chão e aguardei a natureza agir.

Diante de uma cadela no cio, Bruce abandonou a vigilância e assumiu a responsabilidade do acasalamento e eu, sem fazer alarde, passei a escada para o lado de dentro do quintal, coloquei o patão gamela dentro do saco onde tinha levado Cocada e voltei para casa com o troféu da minha vitória e, claro, a escada que era para não deixar rastros de minha passagem.

O pato grande, gordo e velho, mesmo cozido na pressão, ficou duro como todos os diabos, mas dentre os participantes, ninguém ficou sóbrio, porque até o meu prêmio serviu para comprar mais aguardente...

GLOSSÁRIO

Cabidela = molho pardo