CULHEIRA
Luiz Miguel Neugebauer da Silva que morou na Vila do Conde era filho de uma alemoa, daquelas grandalhonas da pele branca que dá para se ver as veias dos braços, olhos azuis feito olho de boneca, cabelos cor de trigo maduro sempre trançados e presos no alto da cabeça, entre as orelhas, que cuidava da casa, do marido e dos filhos com determinação de abelha em cafezal florido.
O pai, também trabalhador devotado na lida com os animais e as plantações, era um legítimo mestiço brasileiro.
Pele cor de bosta lavada, baixinho, com a tira de cabelo apixainzado em volta da nuca, que escapou de ser comido pela careca que deu fim aos que estavam no cocuruto.
Quem visse os dois juntos, poderia jurar por todos os santos que não eram pai e filho, porque Luiz Miguel herdou todo o tipo físico dos parentes do lado da mãe.
Branquelo, olhos azuis, cabelos louros e grandalhão, mais de metro e oitenta.
As botas, grandes demais para encontrar no comércio, tinham que ser feitas por Juca Tripé, afamado artesão na vila e na redondeza pela qualidade dos arreios, laços e selas que fazia.
Mas o gosto pela rede, esse costume ele herdou do pai e fazia questão de cultivar em todos os momentos de folga e nunca permitia que fosse lavada.
Deitados na varanda, pai e filho conversavam até altas horas sobre os problemas e principalmente as soluções para tocar a fazenda de produção de bezerros com o cruzamento das raças Nelore e Canchim que, são animais de rápido crescimento e ganho de peso.
Bandido, o touro Canchim encarregado da cobertura das vacas Nelore, era um belo animal de dois anos e meio, com aproximadamente 35cm de circunferência escrotal e quase 600k de peso.
Pela intensa atividade no período de monta, calhou de Bandido cair de mau jeito e machucar os testículos que em pouco tempo estavam inchados como úbere de vaca holandesa.
O veterinário além dos anti-inflamatórios, recomendou que fosse feita uma culheira para sustentar o saco numa altura adequada para não haver rompimento dos canais de trânsito dos espermatozoides e que Bandido ficasse apartado das fêmeas para mais rápida recuperação.
Foi a vez de Juca Tripé entrar em ação e produzir uma culheira com a tira por cima do lombo e sedém entre as pernas, incômodo mesmo com a generosa porção de sebo de carneiro para diminuir a fricção, mas eficiente para o conforto e a recuperação do animal.
Na semana seguinte, na vacinação dos bezerros, Luiz Miguel carregou um deles nos braços e sentiu a fisgada na hérnia inguinal, sua incômoda companheira desde os tempos quando andava escanchado no lombo do burro, largo demais para suas pernas de criança pequena.
A dor no saco que a cada dia ficava maior, só aliviava quando estava deitado na rede.
O farmacêutico disse que o melhor era ele operar porque poderia acontecer de uma alça do intestino descer para o saco e ele ficar com aquele trambolho no meio das pernas andando como se fosse Manezinho, tocador de tambor na banda Lira 13 de Maio.
Luiz Miguel disse que não havia no mundo quem fosse capaz de fazer ele ser operado, aí alguém sugeriu que ele mandasse Juca tripé fazer uma culheira para ele, como a que tinha sido feita para o touro Bandido.
O diacho era que, agora a rede velha, além do cheiro azedo de cavalo suado, ganharia o bodum do sebo de carneiro que ia ser esfregado para amaciar o sedém que ia ficar no rego da bunda de Luiz Miguel.