Estratégia da Avó
Muito embora já soubéssemos nadar, minha avó temia que fôssemos ao rio tomar banho e nos afogássemos. Nas sextas-feira, dia de feira na cidade vizinha, do outro lado do rio, minha mãe pedia para a avó que tomasse conta de nós, enquanto ela ia a feira. Na época, toda criança tinha medo do papa-figo, uma figura lendária, criada pelos adultos para meter medo nas crianças e assim elas obedecessem as ordens dos pais. Tão logo minha mãe saía, lá se vinha minha avó, com uma história inventada: "meninos, tenham cuidado, não saiam de casa, porque foram vistos dois homens atravessando o rio, com características suspeitas, que parecem ser papa-figos".
Diante de tal descrição, a gente não tinha coragem nem de sair ao terreiro, imagine ao rio, a uns 200 metros de casa. À tardinha, num daqueles dias, com a minha mãe já tendo retornado da feira, eis que ela mesma nos pede buscar uns animais, exatamente na direção onde a avó disse tererem atravessado os estranhos homens.
_ Mãe, pra lá a gente não vai, porque pode ter papa-figo.
_ E contamos a história da avó.
Agora, diante da necessidade do nosso serviço, eis aí a incoerência: desfazer o que nos disse a avó. E assim a gente levava a vida, obedecendo a uma e a outra, admitindo que "cada um luta com as armas que tem."