BIENAL
Jorge Machado de Alencar tem em seu nome a menção de grandes escritores brasileiros, como foi salientado por seu primeiro professor de literatura, naquela época em que a escola era local de ensino, pois ainda não tinha sido transformada em centro de formação de militantes esquerdistas semianalfabetos.
O gosto pela leitura herdado dos pais, o prazer de manusear obras raras e a satisfação de produzir textos é crescente desde que, passado o período de alfabetização, mergulhou no universo fascinante das letras e, como acontece com a maioria dos escritores, a ideia de publicar livros era constante.
O leitor pode pensar, o tempo do verbo está errado, não pode ser passado, mas está correto, porque era constante, não é mais e, pelos acontecimentos a partir do momento em que a ideia se transformou em realidade, não tem como o verbo vir para o presente ou futuro.
Com a edição do primeiro livro, começou a saga para colocar no mercado consumidor.
Tarde de autógrafos na minúscula sala da biblioteca pública, gentilmente cedida pela bibliotecária chefe, desde que não houvesse comes e bebes a fim de preservar o acervo permanente daqueles bem-educados que colocam restos de alimentos ou de bebidas entre as prateleiras ou no chão junto às estantes.
A espera pelo público das 14 as 18 horas foi inútil.
Não apareceu ninguém.
“Principiante é assim mesmo” foi a frase de consolo que ouviu reiteradas vezes.
No contato com as livrarias, sempre a mesma conversa. – Deixe aí os seus livros, mas sem a nossa responsabilidade de fazer propaganda, e a nossa comissão sobre as vendas é de 40% do valor de face.
Nas semanas que se seguiram, os livros nem estavam na frente das prateleiras nem naquelas “ilhas” colocadas no salão das lojas onde os livros são oferecidos para manuseio dos frequentadores e com preços irresistíveis.
Mais de mês depois, o pacote estava tal como fora entregue, colocado por trás de outros volumes numa das últimas prateleiras da loja.
Novamente a frase encorajadora – principiante é assim mesmo.
Surge uma luz no fim do túnel.
A bienal do livro no centro de convenções.
Êêêêbá!
Editoras, livrarias, autores de vários locais e nacionalidades, patrocinadores, público em grandes levas, filas intermináveis, salas de palestras com autores renomados, contadores de histórias, palhaços, pipoca, algodão doce, salas para novos lançamentos de autores consagrados e stands para serem alugados.
Claro que havia stand grátis para autores principiantes, mas esses ficavam no final do centro de convenções e sem nenhum efeito “chamativo” que despertasse o interesse dos visitantes.
Cada autor inscrito com direito a 20 minutos de exposição dos seus livros através do serviço de som, mas limitado àquele espaço, para não interferir nos demais.
O maior contratempo foi o stand do palhaço, consagrado por três ou quatro gerações, que estava instalado no outro estremo do corredor e era o ponto de atração das pessoas que queriam mostrar aos filhos e netos o palhaço que alegrara as tardes de suas infâncias...
Novamente, nenhum livro vendido.
Mas outra luz, agora bem maior, brilhava no horizonte próximo.
A feira do livro numa cidade histórica, badalada, festejada por todos os públicos, de eruditos eminentes magistrados à sucata de hippies, adoradores de Bob Marley, de reggae e canabistas/cocaleiros praticantes.
Mas para poder participar, seriam necessários o mínimo de dois títulos, então partiu-se para a edição do segundo livro.
A feira foi instalada no pátio em torno de igreja antiga, já em ruínas, enquanto espera a verba do IPHAN para restauração, mas ainda imponente para dar maior credibilidade ao cenário com apelo histórico.
Os pacotes foram colocados numa das tendas destinadas aos “principiantes” lá naquele finalzinho de feira, mas com a vantagem de que era caminho exclusivo para as cabines dos sanitários.
Finalmente sucesso de público, pois todos que passaram pelo stand falaram com Jorge Machado de Alencar, mas para perguntar onde ficava o sanitário.
Nenhum exemplar dos dois títulos foi comprado, mas os pacotes de livros voltaram menores para casa, porque já no segundo e último dia, apareceu uma jovem muito interessada nos livros de contos.
Algumas horas de papo e por fim ela declarou que não tinha um centavo sequer para poder comprar.
Ela ganhou de presente um exemplar de cada livro e o autor ganhou uma fotografia autografada, com a moça, hoje emoldurada e pendurada na parede da casa dele.
Quanto aos livros, continuam entulhando espaços e acumulando poeira apesar do grande número de exemplares distribuídos, gratuitamente, por bibliotecas escolares e municipais.