UMA INJUSTIÇA?
 



Ela veio trabalhar em nossa casa quando ainda éramos crianças. Eu devia ter uns 8 anos, mano Beto 7 e Tonico, o menor, 3 anos. Mamãe era professora e lecionava em período integral, daí a necessidade de ter alguém para ajudá-la nas tarefas domésticas e cuidar das crianças.

Balbina morava na fazenda de meu avô com seus irmãos Benvinda, Miro e Lico. Eram, portanto, empregados de meu avô, mediante salário e uma casa na fazenda para residirem. Miro e Lico ajudavam na lida com o gado e as moças apoiavam vovó na cozinha, na lavagem de roupa, limpeza da casa e, eventualmente, na horta e no cuidado com as galinhas, patos e gansos. Como mamãe não tinha ninguém para o trabalho doméstico, vovó enviou Balbina para ajudá-la até que outra pessoa pudesse substituí-la.

Eram pessoas bem simples, de pouco estudo e muito trabalho duro. Além disso, confiáveis, honestas e dedicadas. Convivíamos com eles desde os tempos da fazenda e mamãe confiava muito neles.

Entretanto, ninguém chamava Balbina pelo seu nome correto. Ela era a Barbina para todos, crianças e adultos e eu, na minha infância, associava seu nome à palavra barba porque ela exibia um buço bem visível, que não depilava.

Quando mano César nasceu, ela não trabalhava mais conosco porém sempre vinha nos visitar. César tinha 4 anos quando Barbina chegou à nossa casa para uma visita. A porta da cozinha ficava sempre aberta e ela entrou e sentou-se sobre a caixa de lenha que tinha tampa e fazia as vezes de um banco. Perguntou por mamãe e Cezinha foi correndo chamá-la no andar de cima. Quando a encontrou disse-lhe que na cozinha a esperava uma moça bonita. Mamãe ficou curiosa e, ao descer, deu com Barbina sentada ao lado do fogão a lenha. Quando papai voltou do trabalho, ela lhe contou o ocorrido. Papai riu muito pois Barbina era excelente pessoa mas não era exatamente o que se chamaria de uma moça bonita. Os outros meninos, então, faziam piada com o pequeno César.

Mais tarde, os irmãos mudaram para a cidade. Já não tinham o mesmo vigor para o trabalho na fazenda. Entretanto, nunca deixaram de nos visitar. Havia amizade entre nós, afeiçoaram-se às crianças e até aos adultos, e nós a eles.

Da pequena cidade no interior de Santa Catarina onde vivíamos, mudamos para prosseguir nos estudos e por um tempo não tivemos mais notícias dos quatro irmãos. Passados alguns anos soubemos que Miro fora acusado de molestar uma menina, filha de uma vizinha sua. Foi preso mas sempre negou veementemente. Ficou pouco tempo na cadeia mas o episódio o deixou destroçado. Miro terminou seus dias triste e solitário.

Eu fiquei condoída com a situação. Não acreditei e não acredito que ele fosse capaz de abusar de uma criança. Meus tios e tias cresceram com ele na fazenda e tiveram intensa convivência com toda sua família. Além disso havia sempre outras crianças, de eventuais trabalhadores contratados para desverminar, vacinar ou marcar o gado. Vovô e vovó tinham muita estima por Miro e seus irmãos.

 
A acusação nunca foi provada. Até hoje penso que uma injustiça aconteceu com esse amigo de nossa família.



 

Aloysia
Enviado por Aloysia em 08/10/2020
Reeditado em 21/09/2024
Código do texto: T7082845
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