Ouro roubado

Ela havia encontrado algo que significava que nunca mais seria pobre - mas havia um porém. Foi o que contou ao seu melhor amigo, Adrien, quando sentaram-se na sala dele para conversar.

- Onde você achou isso? - Indagou Adrien de olhos arregalados, quando ela desembrulhou o objeto que trouxera na mochila surrada.

- Estava caminhando às margens do lago, pensando na vida, sabe... como costumávamos fazer depois das aulas. Aí vi o brilho, na maré baixa... estava meio enterrado no lodo. Peguei um galho e puxei para a margem.

Adrien balançava a cabeça, como se não estivesse acreditando nos próprios olhos.

- Pesa 1 kg. Tem ideia de quanto vale?

- Eu conferi a cotação do ouro antes de sair de casa... dá mais de 52 mil euros. Isso sem falar no valor histórico.

- Dava pra comprar uma boa casa com esse dinheiro - avaliou Adrien, mão no queixo.

- Dava. E também pra bancar minha faculdade e sair desse lugarejo - suspirou ela. - Em outras circunstâncias, eu estaria dando pulos de felicidade, mas agora...

Os olhares dos dois cravaram-se na barra de ouro que ela colocara sobre a mesa da sala. Perfeitamente visível na parte superior, a águia e a suástica nazistas marcadas no metal encimavam as palavras "DEUTSCHE REICHSBANK" e "1 KILO FEINGOLD 999.9". Na parte inferior, um número de série identificava aquela barra em particular.

- Eu nunca poderia imaginar que os carregamentos do ouro roubado pelos nazistas houvessem passado por aqui - disse Adrien.

- Aqui é caminho para os Pireneus - ela replicou. - Quando os Aliados invadiram a França, provavelmente começaram a retirar o ouro para países neutros, como a Espanha e Portugal. Que uma parte foi desviada, acabamos de comprovar.

- O que você pretende fazer? - Indagou Adrien.

- Não posso ficar com isso; é dinheiro amaldiçoado. Deus sabe como foi obtido... alianças e dentes de ouro de prisioneiros de campos de concentração... não quero esse peso na minha consciência.

Adrien entrelaçou as mãos e passou a língua pelos lábios ressecados.

- Sabe... podíamos arranjar um maçarico e apagar essas marcas; iria virar uma barra de ouro de origem desconhecida. Ninguém precisa saber que é ouro nazista.

Ela fez um gesto negativo.

- Não, Adrien. Vim te contar porque não queria carregar essa responsabilidade sozinha. Vou entregar isso na gendarmeria e eles que decidam o que fazer.

Adrien abaixou a cabeça, envergonhado.

- Você tem razão. Me desculpe, não tinha o direito de sugerir isso.

Ela acariciou o rosto dele com ar triste.

- Você ouviu Mordor chamando...

- [10-09-2020]