03 de maio, respondeu o pé de cajá.

Um dia, em 1962, quando Cecílio era um pirralho, foi catar cajás com um vasilhame. Havia um majestoso pé de cajá centenário que sempre presenciou desde o início, tudo que se passava em Rio do Braço.

— Que dia foi ontem? - Perguntou.

— 03 de maio - Respondeu o pé de cajá.

— Não esqueça! - continuou Cecílio - ontem, às cinco horas da tarde, nasceu um menino na beira da estrada, debaixo de um pé de cacau, porque a caminhonete azul marinho GMC de Seu Walter Pinto não deu tempo de chegar até a maternidade em Ilhéus.

— Ah! É por isso que eu vi o corre-corre ontem de Seo Osvaldo apressando Seu Walter Pinto para levar a esposa para Ilhéus... - Disse-lhe o pé de cajá.

— Não deu tempo de chegar, e quando passaram bem em frente à fazenda Barro Vermelho, não sei se depois ou antes da Fazenda Promissão, tiveram que parar a camioneta GMC, porque Seu Walter Pinto disse que naquela fazenda tinha uma parteira... D. Silvéria dos Reis socorreu na hora, e deu tudo certo.

O parto foi debaixo de um pé de cacau na beira da estrada, e todo mundo que estava na camioneta e ao redor, viraram de costas em respeito. Só Dona Silvéria dos Reis, sozinha, com um lencinho e água morna resolveu tudo. O menino nasceu todo umbilicado e Dona Silvéria disse logo:

— D. Arlete, tem que botar o nome dele, José, porque nasceu todo roxo e umbilicado! Só nasceu por causa da buraqueira na estrada que desemborcou ele pra posição certa, pois ele tava virado!

Não foram mais para Ilhéus. Voltaram para o Rio do Braço tarde da noite.

Dias depois, a família Matos foi ao povoado de Castelo Novo que pertence à cidade de Ilhéus, para fazer o registro no cartório de Filon Alves do Socorro, avô do menino.

— Vai pôr o nome de José, mesmo? Perguntou o pai de dona Arlete, dono do cartório de Registro Civil, que já sabia dos conselhos da parteira...

— Dizem que tem que botar, para que o menino tenha sorte na vida! - Reforçou D. Caçula, (Maria de Oliveira Alves), avó do recém-nascido, com o reforço da avó paterna Dona Lídia Pereira de Matos...

Dona Arlete já tinha um nome na cabeça... Se nascesse homem, como aconteceu, iria colocar o nome dele de Osman, nome que conheceu de um personagem, ao ler um romance árabe...

— E José? Cobrou D. Caçula.

— Pronto! Osman José! Resolvido! - Disse D. Arlete, a mãe.

Todos concordaram e assim foi feito o registro: Osman, personagem do romance árabe, José, porque nasceu umbilicado, Oliveira, um dos sobrenomes da mãe que perdeu o Alves ao casar-se, e Matos, o último nome do Pai.

— Tem que batizar logo! - Insistiu dona Caçula - Já sabe quem vai ser o padrinho?

— Vou convidar Seu Walter Pinto e D. Eva - disse Seo Osvaldo - que além de ser meu amigo, foi quem nos socorreu.

Alguns anos depois, aos 12 anos, esse menino entregaria a Cecílio, uns escritos que fez sobre o seu nascimento... Cecílio guardou por muito tempo. Quando o menino cresceu e formou-se em Letras Clássicas e Vernáculas, nem lembrava mais desse poema que fez aos doze anos, mas Cecílio, um dia, entregou o poema ao pai dele que guardou com muito cuidado e anexou a um livro feito à mão, com todos os seus escritos de infância.

O menino-homem e formado em Letras Clássicas e Vernáculas, ao ler o poema, emocionou-se e não conseguiu, com todo se estudo literário, modificar uma vírgula sequer... O poema intitulado “Três de maio” foi escrito assim em 1974:

O3 DE MAIO

A camioneta GMC azul Marinho dos anos 60

que Seo Walter Pinto, mais tarde meu padrinho, tinha,

nos levava. Minha mãe gemia, meu pai cuidava

e eu queria nascer na estrada.

Na estrada de chão que liga o Rio do Braço

ao Jacarandá - acesso a BR 415 -

— Chegar a Ilhéus, chegar à Maternidade,

vai mesmo dar tempo de chegar?

- Corra mais, Seo Walter Pinto!

O destino, meu único aliado,

como eu, não queria quatro paredes.

A sombra de um cacaueiro me acolheu

e me orgulho muito disso hoje,

embora eu não seja um fazendeiro,

nem mesmo dono daquele cacaueiro

que foi meu parteiro,

parceiro de Dona Silvéria do Reis,

preta velha, sempre as melhores parteiras...

— O cabra é macho!

E de cabeça para baixo,

o pulmão rompido pelo ar puro...

Devia ter sorrido ao invés de ter chorado,

mas acho que foi de alegria por ter nascido assim,

com a natureza ao lado!

¬¬¬¬¬¬¬¬__________________

* Esse texto é uma das várias histórias contadas no livro "Rio do Braço" (Romance Histórico) de Osman Matos, publicado em 2015 pela Editora Mídia João Pessoa, PB (LANÇADO EM 2016 NA ACADEMIA PARAIBANA DE LETRAS) e pela Amazon.com nos formatos e-book e impresso, 2017.