O colecionador

Animou-se ao verificar que havia 150 novos e-mails em sua caixa de entrada; não eram de spam, mas respostas ao seu anúncio do dia anterior. Começou a abrir um a um, marcando aqueles que continham as propostas mais interessantes. Finalmente, pegou o celular ao lado do computador e começou a ligar para os remetentes.

- Sr. Pereira? Sou o Raul, do anúncio. O senhor ofereceu 1.200 pela caixa?

- Sim. E está lacrada?

- Exatamente como saiu da fábrica - assegurou.

- Quando poderei vê-la?

- Esta é uma ligação preliminar, para confirmar os interessados em adquirir o produto. Até amanhã deverei ligar novamente, confirmando uma reunião num local público.

- É tanta gente assim? - Questionou Pereira.

- Essa é a última caixa existente. Ninguém sabe o que poderá conter, não é mesmo?

Isso era apenas parcialmente verdade, pois ele havia passado a caixa por um raio-X de aeroporto e sabia precisamente qual era o conteúdo. Não havia nenhuma peça rara no interior, o que era uma pena. Todavia, o fato de ser a última caixa despertava interesse, mesmo que a perspectiva de encontrar um item de colecionador fosse improvável.

Na ligação seguinte, teve um choque.

- Eu dou 2.500 pela caixa - informou o homem que se identificara como Manoel.

- O senhor tem certeza disso? Não posso garantir que haja alguma peça rara dentro...

- Estou ciente. Pegar ou largar, pago à vista em dinheiro.

Dificilmente iria conseguir uma oferta melhor, pensou. Marcou com o comprador para vir buscar a caixa na tarde daquele mesmo dia e aguardou, tenso, imaginando se não fora vítima de uma brincadeira.

Não, realmente. Manoel existia de verdade e apareceu na hora marcada com o dinheiro em mãos. A caixa mudou de dono e tudo pareceu ficar bem até a manhã seguinte, quando viu um anúncio online postado pelo mesmo Manoel: ele estava oferecendo não uma, mas duas peças raras que estavam na caixa que ele vendera no dia anterior, cada uma praticamente pelo valor que pagara pela caixa inteira. Como não percebera isso?

Só então, tarde demais, lembrou-se de que o raio-X exibia o conteúdo de uma embalagem em cores falsas, baseado na densidade de cada item. Não havia como identificar se o objeto era dourado ou prateado, caso das peças raras que vendera inadvertidamente abaixo do preço.

Parecera um bom plano, resignou-se, mas não era perfeito...

- [06-09-2020]