A Visgueira
Lembrou-se do episódio do sabiá que apareceu em sua casa com uma perna quebrada na cozinha. Pegou o passarinho, e, com o maior cuidado do mundo, imobilizou a perna do sabiá com palito de picolé e esparadrapo durante quatro semanas.
Quando o sabiá ficou curado, segurou a ave com ambas as mãos e o impulsionou para voar. O pássaro ficou voando por volta da casa por mais de uma hora agradecendo, até ganhar o mundo.
Aquilo Fez com Cecílio até hoje nunca gostasse de criar passarinhos e nem os prender em gaiolas. Também nunca gostou de badoque – estilingue – para matar passarinho.
Uma vez apanhou de uns meninos grandes, porque apareceu de repente e espantou o alvo deles: uma árvore cheia de rolinhas.
Outra vez, em uma fazenda, foi até a casa de Seo Bigode e abriu pra mais de trinta gaiolas.
No outro dia, Seo Bigode quase baixava o hospital por desgosto, pois tinha passarinho com 8 a 10 anos de gaiola, sua paixão.
Investigaram, mas ninguém sabia que foi Cecílio quem soltou os curiós, gurinhos, papa-capins, sangues-de-boi, papagaios, periquitos, canários...
No outro dia a maioria voltou para as gaiolas, para alívio de Seo Bigode, que passou a criar as aves livres.
— Agora sim! - Dizia Cecílio para si mesmo - os bichos podem voar pelo mundo, e na hora da fome, e na hora de dormir, voltam para casa.
Cecílio, também, tinha o costume de desarmar todas as visgueiras... Visgueira?
Visgueira é um pedaço de pau fino imitando um pequeno galho ou graveto, enlambujado por visgo de jaca.
Amarravam a armadilha nas árvores para quando o passarinho pousar, ficar preso no visgo pegajoso.
Cecílio já andava com querosene em casa, só para limpar os pássaros que caiam na visgueira e depois, soltava-os. Isso lhe custou muita confusão, discussões, brigas, mas ele não estava nem aí. Aguentava um soco por uma liberdade.
Todo alçapão que aparecia quebrado, acusavam o Cecílio. Mas não era ele, não. Eram outros meninos, seus discípulos, que abraçaram a causa.
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* Esse texto é uma das várias histórias contadas no livro "Rio do Braço" (Romance Histórico) de Osman Matos, publicado em 2015 pela Editora Mídia Joáo Pessoa, PB (LANÇADO EM 2016 NA ACADEMIA PARAIBANA DE LETRAS) e pela Amazon.com nos formatos e-book e impresso, 2017.