A Revolta dos Suínos
A REVOLTA DOS SUÍNOS
Para os desavisados Brejolândia dos Cafundós é uma região perdida entre as montanhas e serras das Gerais, lugar de rara beleza, ainda pouco tocada pelas mãos profanas do homem contemporâneo e suas inovações tecnológicas.
A região vinha sofrendo um surto desenvolvimentista depois que meu tio Arlindo, mandara instalar no centro do seu curral uma antena parabólica que passara a trazer para os habitantes do lugar, o mundo “lá de fora” com seus paradoxos, suas complexas organizações, seus stress, sua violência gratuita.
Para a população local que se acostumara todas as noites a freqüentar a casa do meu tio como se fosse um clube de serviços, aquelas eram imagens de algum universo paralelo povoado pôr seres demoníacos e
bestiais trazidas pela magica da caixa eletrônica da TV.
Tio Arlindo vinha se perguntando se fizera bem em trazer para aquele inóspito e indevassado santuário aqueles equipamentos, símbolos do poder e a degradação do mundo moderno.
Reclamava ele que aquela cultura alienígena vinha alterando a vidinha pacata de Brejolândia, trazendo hábitos nefastos e negativos, produzindo pelo mau exemplo a destruição de seculares valores herdados dos antepassados, fundadores da Roça Grande de Brejolândia dos Cafundós.
Dizia ele que até os animais vinham tendo mudanças de comportamento influenciados pela programação televisiva a qual como qualquer cidadão da região tinham amplo e irrestrito acesso.
Achei que aquilo não passasse de um exagero do tio, pôr conta de sua natureza nervosa e ranzinza, mas depois da ultima vez que ali estive passei a cogitar que talvez o tio tivesse razão.
Logo que cheguei na porteira de entrada do sitio, vi o Tio Arlindo entrincheirado atras de sacos de ração defronte a entrada da casa com um velho bacamarte em uma das mãos e me acenando freneticamente.
Não entendi de pronto o que o tio queria e continuei avançando devagar. O velho insistia para que eu chegasse mais rápido ou me afastasse dali.
Quando alcancei a varanda da casa, tio Arlindo foi logo gritando:
- Cara, você correu grande perigo, entrando assim desarmado no teatro de operações.
Pensei comigo que lá vinha mais uma bobagem do velho, e quando lhe perguntei o que se passava ele me puxou para trás de suas defesas e se explicou:
- Os porcos do sitio se rebelaram e me declararam guerra total, você chegou justo no inicio das operações bélicas.
Eu não entendia nada e ainda acreditava que aquilo era mais um surto de esquizofrenia do velho.
- Me explique esta historia direito tio.
- A culpa é toda do professor Astromar, aquele doido varrido. Depois que ele começou com aquele papo de que o porco é o elo perdido entre o macaco e o homem e que é o nosso mais próximo parente os porcos se rebelaram. Estão sendo comandados e incitados pôr Nandão, o porco do seu Divino, meu vizinho. Diz que o Nandão é um porco sociólogo e poliglota e pelo que pudemos perceber, o objetivo dos revoltosos é tomar Brejolândia e implantar aqui a Republica dos Suínos tornando nós seres humanos em seus escravos.
O tio Arlindo estava mal e só pude dizer uma frase que ele interpretou erroneamente:
- A coisa da feia.
- Põe feia nisto, João, e o pior é que o Nandão está atraindo todos os outros animais para a revolta em função de sua forte liderança e da sua habilidade lingüistica. Cães , gatos, cavalos, galinhas estão aderindo à revolta.
Quando eu me levantava para pedir uma ajuda psiquiátrica para o tio veio a primeira carga da cavalaria suína.
Os porcos montados nos pangarés do sitio tendo Nandão à frente tomaram a iniciativa do ataque e avançaram contra as defesas do tio Arlindo, que rechaçou este primeiro ataque a tiros de polveira.
- Me arruma uma arma aí tio.
Se eu achara num primeiro momento que o tio Arlindo havia pirado de vez, sua loucura então já me contaminara porque lá estava eu também de capacete e espingarda atrás de sacos de ração e preparado para responder com tudo a uma nova carga de ataques de suínos revoltosos num evento que colocaria Brejolândia mais uma vez na mídia internacional, com a chamada Revolta dos Porcos. Isto vinha reforçar a tese do Professor Astromar Falcone de que os porcos são os nossos mais próximos parentes.
(Da Série Brejolândia dos Cafundós)
JOÃO DRUMMOND