EUZÉBIO E OS CACHORROS

Euzébio era um homem muito interessante. Poucos amigos, pouca conversa, e radicalmente contra os cachorros. Não dizia a ninguém o porquê dessa ojeriza contra os cães. Era só ver um, que pedras eram atiradas contra ele. Chegou ao ponto de brigar com um seu compadre que dizia que o cão era o maior amigo do homem.

Aos quinze anos, foi trabalhar em uma fazenda próxima a Caraguatatuba-SP. Vinha à sua terra, em Minas, uma vez por ano, e trazia as novidades paulistas para os seus conterrâneos.

Na fazenda onde trabalhava era bem tratado, comida boa, roupa lavada,e uma grande amizade com o patrão. Quanto à comida existia um porém: nunca havia comido um bife de boi, daqueles suculentos que, de vez em quando, ele via na TV. Na fazenda, ele comia carne três vezes por semana, mas era de frango e porco. Quando aparecia a de boi, era carne de segunda e miúdos. Nada de bife.

Uma manhã, quando andava pelo pasto, ouviu um gemido e foi logo ver. Era um garrote, um dos mais gordos da fazenda, que havia caído em um buraco. Como não havia possibilidade de salvá-lo, foi sacrificado. O fazendeiro, dono do garrote, repartiu a carne para o pessoal que trabalhava na fazenda, reservando uma parte para aqueles que comiam lá. Como reservaram as melhores carnes para a fazenda e o dono não iria comê-las, Euzébio pensou que aquela seria a oportunidade de, pela primeira vez na vida, saborear um caprichado bife.

No dia seguinte, a cozinheira Mariana avisou para a turma que no almoço seria servido um grande e saboroso bife,

Euzébio estava ansioso pela hora do almoço. Chegou a sonhar com o bife.

De manhã, tomou pouco café e comeu apenas uma broa. Tinha que preparar o estômago para receber o bife.

O almoço era servido às dez horas e, nesse horário, Euzébio e mais nove companheiros dirigiram-se a um salão próximo à sede, onde Mariana ia levar-lhes as marmitas. Quando ela chegou, observaram que as tampas mal cobriam a comida da marmita, pois os bifes que estavam por cima quase não cabiam nela, de tão grandes.

As marmitas foram distribuídas acompanhadas de um pequeno cuité com uma saborosa pinguinha... Apetite aberto pela pinga, a turma destampou as marmitas e iniciou o almoço.

Ainda com o gosto da pinga, todos foram direto aos bifes para o famoso tira-gosto. Todos, não! O Euzébio, encantado com o bife, ficou a admirá-lo, preferindo comer primeiro o arroz, o feijão, o angu, as verduras. Comeu tudo, menos o bife que ficou para depois, quando se seviria de mais um pouco de comida para, finalmente, saborear o belo bife acebolado.

Euzébio então se dirigiu ao local onde a Mariana estava, para pegar um pouco mais de comida que, agora, acompanharia o delicioso bife. Não sabemos o que aconteceu, mas no momento em que o Euzébio começou a caminhar, ele tropeçou, a marmita caiu e dela saltou o suculento bife, rolando pelo chão. O cachorro de nome Cartola, que sempre rodava por ali na hora do almoço, deu um bote e saiu correndo com o bife na boca, e o Euzébio correndo atrás. De nada adiantou, pois o Cartola sumiu por entre as árvores ali existentes.

Voltou o nosso amigo muito triste, e entregou a marmita à Mariana, não querendo comer mais nada. Como Mariana havia dito, os bifes eram a conta certa dos empregados.

A partir daí, o Euzébio nunca mais se esqueceu do ocorrido, e desenvolveu uma grande ojeriza a cachorros...

Calambau, 15 de junho de 2020

Murilo Vidigal Carneiro

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Enviado por murilo de calambau em 02/07/2020
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