Sr. ISMAEL, VULGO “HOMEM BORRACHA!”
Passei muito tempo para converter em letras o que durante anos, tinha em palavras!
Mesmo porque, durante toda a minha infância, adolescência, juventude e mesmo na fase adulta, nunca esqueci daquela situação. Verdade, que acreditei por algum período ser muito engraçada, mas, depois eu entendi, quão trágica a mesma era e quanto sofrimento, deveria causar em seu protagonista.
Era estranho, quando acordávamos e não ouvíamos o trombone do sr. Ismael, ensaiando para tocar em algum lugar. E o som do instrumento, durava horas. Ninguém reclamava, porque o homem tocava bem, era afinado. E por falta de diversão, ele dispersava um pouco a rotina.
Pelo que entendia, sr. Ismael, além de músico, já era aposentado, além de coadjuvar seu tempo de músico com o ofício de marcenaria e também como comerciante, pois, tinha na sua casa, (linda casa, aliás) instalada, uma pequena banca de frutas, de onde, tirava algum dinheiro, para ajudar em seu orçamento e logicamente na compra do “seu líquido!” Seu filho, trabalhava consigo na marcenaria. Este, ao que comentavam, tinha algum problema de cabeça. Mas, ele. Não. Quer dizer. Quando não bebia se mantinha na linha da normalidade, mas, quando tomava umas e outras... seu filho que diziam ter problema, corria de si...
Diziam que era boa pessoa, embora eu percebia que tinham um certo receio de estarem próximos a ele. Dissera eu, “diziam”, porque na condição de criança eu não tinha esse juízo de valor para denominar e avaliar suas atitudes. Me baseava pelo julgamento dos outros. Dos outros, no caso, minha mãe, minha avó, minhas tias, etc.
Tudo transcorria maravilhosamente bem, graças a Deus, até...
Até o sr. Ismael lembrar de beber!
Pronto, acabava com a paz da comunidade. Era inacreditável como um indivíduo sozinho, conseguia causar tantas emoções na vizinhança! Colocava tudo a perder.
De um simples mortal, ele se transformava, quase que num causador excepcional...
Duas coisas eu lembrava perfeitamente: a primeira era o “show” que dava. A segunda coisa que me recordo era sua passividade, dias após ter causado aos semelhantes, tantas emoções diferentes...
O homem, simplesmente se transformava. E disso eu até hoje me recordo e olha que já faz mais de 52 anos: “seu Ismael bebeu!” E só via o pessoal correndo, fechando janelas, portas, pegando as crianças, falando palavrões, etc.
O homem corria... gritava... cantava! Atirava pedras, esbravejava, sorria, deitava... no chão de terra batida. Rastejava, urrava, saltava... Caía, levantava!
Eu de longe, da minha casa, observava chocado! Não entendia nada, porque nada ninguém me explicava!
Num desses ataques “pós pingaiada”, eis que em sua loucura, subiu na carroceria de um caminhão, subiu na parte mais alta de tal carroceria e conseguiu se equilibrar. Não sei se por maldade ou desatenção, o motorista do tal caminhão, acelerou...
Seu Ismael, estatelou-se no chão e de longe eu vi lá o poeirão, seguido de grande gritaria: “mataram seu Ismael! Seu Ismael morreu”
Dali a pouco, como que surgido do pó, o sr. Ismael de um salto, colocou-se de pé, inexplicavelmente, logo em seguida ouvi os comentários: “meu Deus, o home está vivo! Como pode sobreviver?”
Fato é que, o homem parecia feito de “borracha”. Caía levantava, batiam, ele não sentia, corria, tropeçava e se colocava a postos, pronto para outra.
Cresci. Mudei de bairro, de cidade, de Estado e ao que tudo indica, se o Sr. Ismael se morreu, foi de velho...
Resumo da ópera: assim como os gatos, os bebuns tem uma sobrevida maior?! Acho que sim...