NAMORO NA TV
Fazia tempo que Aderaldo admirava Izilda, a morena, que todos os dias passava caminhando em frente ao seu negócio. Ela sempre indiferente aos seus olhares apaixonados, talvez nem o percebesse ou simplesmente o ignorasse, afinal ele não era nenhum galã, baixinho, atarracado, olhos um tanto esbugalhados como os de um sapo, cabeça grande, meio careca e com cara de pobre, certamente não teria nenhuma chance com a mulher, mas como o amor é cego, quem sabe uma tentativa mais ousada não a levasse a aceitar um encontro e daí rolasse o romance?
Ele tinha que achar uma maneira de se aproximar, porém ela não lhe dava a menor bola. Olhava-o de rabo de olho fazendo questão de demonstrar seu desprezo diante dos elogios que recebia ao passar.
Foi quando ele assistiu aquele antigo programa de TV, que unia tímidos que alimentavam uma paixão secreta, convidando a pretendida ou o pretendido, para em uma visita ao programa. Ao vivo e em clima de mistério, sem revelar de pronto quem era o interessado ou a interessada criava suspense em torno da situação com a intenção de despertar a curiosidade e o interesse.
Isso até funcionava algumas vezes e muitos casais saíam abraçados do palco, com direito a uma viagem a algum ponto turístico para que pudessem se conhecer melhor, para a felicidade do apresentador e dos patrocinadores. Creio que todos lembram e sabem do que estou falando
Assim, depois de enviar sua cartinha com os dados e endereço da amada para o canal de TV, Aderaldo se viu naquele domingo nos bastidores do programa onde sua paixão bem arrumada e emperequetada, já no palco, era estimulada pelo apresentador do programa:
- Bem, minha querida Izilda. Quero agradecer sua presença em nosso programa e imagino que deve estar curiosa em saber quem é o seu secreto apaixonado. O homem cujo coração dá saltos quando a vê passar, adormece pensando em você e sonha com seu amor. Posso adiantar que essa paixão é antiga e apenas alguns detalhes sobre ele: Trata-se de um simpático pequeno empresário que tem seu negócio muito próximo á sua casa, é livre de compromisso e, naturalmente, cheio de boas intenções até para um possível futuro matrimônio – dizia o apresentador com sua voz empostada.
Izilda, que não era jovem e até não muito bem educada, realmente estava interessada em arrumar um casamento que garantisse seu futuro, mas nem imaginava quem seria “o tal empresário e ainda por cima simpático”(que poderia significar bonito e talvez rico que era tudo o que queria) e já via seu sonho próximo de se realizar, mas quem seria ele?
Seria o dono do posto de gasolina, o bonitão, para quem ela jogava charme? Ou o português, sócio da agência de automóveis, que nem era assim tão bonito, mas parecia solteiro e ter grana, ou ainda aquele senhor viúvo, proprietário da grande sapataria da esquina, ele era um tanto idoso, mas rico e corria os olhos sobre seu corpo e a atendia pessoalmente quando ela fingia estar interessada em comprar e calçava vários pares de sapatos sem nunca comprar nenhum? Esse, como última opção, até servia - imaginava.
A mulher já estava a ponto de enfartar de tanta curiosidade, suava frio, os olhos arregalados brilhavam, um sorriso esperançoso brotava em seus lábios.
Depois de dar muitas voltas e anunciar uns cinco comerciais, o apresentador voltando-se para ela:
- Então minha querida. Posso mandar entrar o seu admirador?
- Pode sim, por favor – respondeu ela apertando e esfregando as mãos.
- Peço que se mantenha de costas - disse ele e exclamou então.
- Pode entrar Aderaldooo!!!
As portas se abriram, uma canção romântica invadiu o ar e Aderaldo vestindo terno e gravata emprestados pela produção, sorridente, mais feio do que nunca entrou aplaudido pelo público.
Izilda virou-se e quando deparou com o dono da carrocinha de cachorro quente à sua frente, não resistiu à decepção, com as mãos na cintura e com expressão de ódio no rosto:
= VOCEEEEEÊ? CRUZ CREDO!! ATÉ AQUI? LARGA DO MEU PÉ! COMO TEM CORAGEM DE SE DIZER EMPRESÁRIO, SEU PÉ RAPADO. DEUS ME LIVRE, SE EU SOUBESSE QUE ERA ESSA COISA NEM TERIA VINDO AQUI. - completou olhando para o apresentador.
Aderaldo, coitado, baixou a cabeça, envergonhado e triste, o público fez silêncio e o apresentador, vendo que a mulher não obedecera as instruções dos bastidores que lhe recomendavam ser gentil, caso não se agradasse da surpresa, desapontado só pode dizer:
- Os comerciais, por favor.