As estrelas que se vão
A minha calmaria se ajustou perfeitamente ao seu caos. Se eu era um chuvisco, você era uma trovoada, a fúria da natureza descontrolada. Não precisava mover a cabeça ou as mãos, para que eu pudesse enxergar o vazio que carrega no seu interior.
Conheci os nós que a corda do seu coração fez ao oscilar tanto no seu peito. Foi nesse dia que me prometi que iria desfazê-los. Observando a constelação do seu olhar perdido, peguei meu guarda-chuva e entrei na tempestade. Aquela agitação toda havia deixado o mundo cinzento, com uma extensa nuvem maciça e pesada cobrindo todo céu azul e o sol. No início, permaneci distante, apenas contemplando a beleza dos tempos sombrios. Estava presente, no canto daquela finita tormenta, o vendo erguer muros. E mais muros. E muralhas. Pessoas foram deixadas pra fora daquele cubículo que criou ao seu redor. Elas não tinham um guarda-chuva, por esse motivo, partiram para um lugar mais ensolarado na primeira oportunidade que tiveram.
Depois de um tempo observando, reparei em um brilho singelo que vinha na sua direção. Você apenas encarava a chuva, as folhas e as árvores caindo no chão e o vento levando anormalidades para todos os lados. Por esse motivo, não enxergou aquele brilho. Aquela pequena estrela que o seu interior guardava para si. Isto visto, levantei-me, ergui meu guarda-chuva e caminhei até a sua direção.
Com toda quietude e ignorando toda aquela tempestade ao redor, escalei a muralha, até o fim. Mas não desci, não imediatamente, sentei-me no muro e balançando os pés, te chamei. Chamei pelo seu nome. Você apenas disse "não deveria entrar aqui" e lançou o olhar de constelação. Perdoe-me por desconsiderar essa ideia. Eu desci do muro.
Enquanto observava a tempestade destruir o mundo, construí uma porta no muro, teríamos que fazer uma curta caminhada pela estrada, mas chegaríamos a um lugar seguro. Quando o entreguei a chave da porta, você me olhou novamente, com um olhar de descontente e irritadiço. Então, percebi que não adiantaria forçá-lo a sair se gostava de admirar aquela paisagem. Peguei meu guarda-chuva, entreguei a chave da porta na sua mão e toquei naquela pequena parte brilhante e singular que transparecia no seu peito. E eu fui embora.
Nunca foi o mesmo depois que entrei na tempestade. Sentei-me longe novamente, dessa vez não observando muita coisa, mas apenas atentando-me aquele céu distante todas as manhãs. Aos poucos ele foi se tornando uma garoa, depois apenas um céu nublado e por fim, um dia ensolarado.
Quando isso aconteceu, eu voltei. Como o pequeno príncipe que voltou para sua rosa, no final do livro e ninguém sabe ao certo o que aconteceu. Nas duas histórias.
Aquela pequena estrela tinha se espalhado por todo seu corpo e trazia consigo uma imensidão de um olhar sereno da manhã, do café preto no bule sendo esperado para ser servido na xícara de porcelana, de cada pensamento que tenho ao decorrer do meu dia. Aquele olhar desesperado se tornava em névoa de um passado.
E como toda estrela, ela precisava agora brilhar no Céu, na sua escuridão. Demonstrar a sua luz para cada viajante que passar. Eu ficarei aqui no chão, sentada, observando de longe, ela brilhar ao redor do mundo. Agradecerei apenas, por mostrar-me tanta coisa no seu silêncio. No seu brilho que agora é intenso.