A peste
A peste era uma febre doentia. Esquentara a pele em drama, sufocara o medo em si. Chegara com a cara da morte, como toda peste. Aos poucos se morria de febre, aos montes de agonia. Dia após dia. A cada tanto enlouquecia. Doía que se doía, e quando o ar não vinha, restava a prece. Era uma febre de gente, uma gente de fé. Entrara por cima, trazida de outras terras, de outras eras, de outros fins. Mas a peste cá já tinha. Peste dum povo triste, febre num povo infeliz. Era a doença da matilha. Dos abonados. De gente ruim. A doença do mérito, a doença da fome. Matava centenas por dia. Matava até de frio. A peste de agora nos dizem, parece que é nosso fim. Mas passará como um passo. Como tudo passa. E tudo bem fica. Amanhã há de ser outro dia.