Rios da Babilônia

Era a manhã após a eleição de 2016, e no trem da linha A para Manhattan, havia muita gente chorando, desconsolada; eu entre eles. O impensável havia acontecido, era como se a terra houvesse se abrido e nos tragado (o que, dentro dos túneis do metrô, tornava-se bem palpável). Foi então que um rapaz, de seus 25 anos, levantou-se e foi para o meio do vagão.

- Bom dia a todos! - Exclamou ele, com uma bela voz de barítono.

Ninguém respondeu, mas algumas cabeças se ergueram para olhar para ele, desconfiadas.

- Eu sei como muitos de vocês estão se sentindo - afirmou o rapaz. - Eu também custei a acreditar, mas agora creio que a ficha caiu. Sim, vamos ter que suportar quatro anos com esse maníaco na presidência. Não há nada que possamos fazer, a não ser...

Encheu os pulmões de ar e exclamou:

- Sobreviver!

E em seguida começou a cantar à capela "Rivers of Babylon", que eu recordava basicamente como uma canção gravada pelo Boney M. na década de 1970. Mas que depois, bem me lembrei, era nada menos do que o Salmo 137. E como os judeus levados cativos para a Babilônia, era-nos exigido que cantássemos para alegrar nossos opressores.

A Babilônia ficava agora em Wall Street. Bem, nós iríamos sobreviver, decidi, erguendo a cabeça e enxugando as lágrimas.

- [15-03-2020]