O Pensador
Lá estava ele, à Rodin, sentado no banco da praça, a pensar, presumiam, e a pensar, profundamente, numa questão importante para a espécie humana. De longe, toda pessoa o confundia com uma estátua: a do Pensador. Eram idênticos o homem e a estátua. Incorporava o homem o ideal do pensador. Talvez tenha sido ele o homem que serviu de modelo para Rodin. Ele era um homem na altura dos trinta anos. Gilson era o seu nome. Gilson Alvarenga de Souza Lima. Gilson, o pensador. O seu silêncio e a sua postura davam a entender que ele era um sábio.
- Aquele moço é muito inteligente.
- Como diz o ditado: Em boca fechada não entra mosquito.
- Ele é um pensador. Ele pensa antes de falar. É sensato. É inteligente.
Eram esses os comentários que aventaram a respeito de Gilson. Mas não havia unanimidade. Havia vozes destoantes, e uma delas era a de Zulmira, mulher de sessenta anos, ativa na sociedade, forte, vigorosa, sempre a falar; uma cidadã sem papas na língua, corajosa a ponto de abordar o prefeito na rua e dizer-lhe, no rosto, olho no olho, verdades que ninguém ousava lhe dizer. Tinha fama de encrenqueira, e o era, de fato. Temiam-lhe a língua ferina. Ai daquele que lhe conquistasse a desafeição! Tinha de ter muito jogo de cintura para esquivar-se das farpas que ela disparava sem pena nem dó. Zulmira ia da vulgaridade à sutileza num piscar de olhos, surpreendendo a todos.
- Que sábio, o quê! Que pensador, o quê! Ele, parece-me, é mudo – desdenhava Zulmira, referindo-se a Gilson, ao ouvir elogios a ele. – Aquele moço... Ele deve ser mais burro do que uma porta. Está, lá, sentado, há três horas. E nem se mexe. Eu vou tirar a história a limpo.
Sob olhares de curiosos, Zulmira andou, a passos firmes, atravessou a rua, e, na praça, foi na direção de Gilson, que lhe ignorava a aproximação, se postou a um metro de distância dele, e saudou-o, tirando-o da posição que sustentava até então. E ele voltou-se para ela, e fitou-a, alheado. Após alguns segundos, Zulmira perguntou-lhe:
- Em que você estava pensando? Você está sentado, há horas, tal qual uma estátua, a mão no queixo, o cotovelo fincado na perna, a olhar para o chão. Em que você tanto pensa?
- Eu não estava pensando, minha senhora. Eu... – principiou Gilson a falar, e Zulmira logo o interrompeu:
- Você não estava pensando?
- Não.
- E o que você fazia, então, se não pensava?
- Eu olhava para as formigas que estão entrando e saindo daquele formigueiro.