UM DIA UM CONDOR...MISERICORDIA
UM DIA UM CONDOR... MISERICORDIA
Achei estranho... O telefone fixo de casa tocou e no bina apareceu sem ID, atendi, era a cobrar. Pensei: " quem me ligaria a cobrar de um telefone não identificado”
- Alo!
- TCHAIKOVSKY, OPERA
- Quem está falando?
Já tinha desligado. “OPERA” era uma senha que o Capitão CARLOS GOMES usava para que nos entrássemos em contato urgente e secreto com ele. Mas a voz era de uma mulher e nunca houve mulheres entre Condores, alem de que desde os tempos de Capitão não era chamado de Tchaikovsky, mais de trinta anos.
Sempre temos planos de contingência, para emergências, essa era uma. Peguei minha arma, limpei e repassei o plano para visitar o Capitão CARLOS GOMES, agora Gal Brandão. Desliguei o celular e guardei na gaveta de meias (Nós que temos grandes segredos do passado, somos monitorados o tempo todo), peguei um pré pago, ainda na caixa, para alguma emergência, não era registrado, coloquei na mala junto com minhas roupas, carregadores munições extras, meu kit de documentos, dinheiro chaves do carro e fui para São Paulo. Guardei o carro no aeroporto, peguei um vôo para Curitiba onde aluguei um carro e fui para Florianópolis. Me instalei em um simples hotel paguei a vista em dinheiro uma semana de estadia, me registrei como vendedor de alimentos e iria fazer a região. À noite perguntei ao gerente:
- Vida de casado é muita rotina, vou aproveitar e fazer umas farras, onde tem um puteiro bom aqui em Floripa?
Após me falar de quatro zonas, lhe disse que iria a um deles e que não se preocupasse se não voltar, às vezes eu iria emendar e trabalhar em outra praça. Passei o numero do celular a ele, para que me ligasse em qualquer situação e me despedi.
Fui ao aeroporto e peguei um vôo para o Rio de Janeiro, ao desembarcar de madrugada, mantive contato com o General, de um telefone publico.
- CARLOS GOMES “O GUARANI”.
Uma voz feminina respondeu:
- MAMA MIA
Desliguei o telefone, peguei um taxi e me conduzi até a padaria na Lapa, eles estavam tomando um café da manhã, sentei em uma mesa próxima e pedi meu desjejum também. Quando terminaram, eles passaram por mim e a esposa deixou cair um guardanapo de papel com um endereço e horário.
Ao sair, fui para o ponto de ônibus, olhei todos que estavam no local, umas 10 pessoas e entrei no primeiro que passou, monitorei a porta de entrada, no primeiro ponto não entrou ninguém, no segundo ponto desci e desceram quatros pessoas, entrei no primeiro ônibus que passou e nenhum dos quatro entrou comigo, no primeiro ponto desci, sozinho, então peguei um taxi e me dirigi ao ponto de encontro chegando um pouco antes do horário marcado, fui a um bar próximo onde usei o banheiro e tomei uma cerveja observando a chegada do General sem a esposa.
No horário marcado toquei a campainha e o próprio General atendeu a porta, entrei.
- Oliveira! Tudo bem?
- Tudo bem! E com o Senhor?
- Bem também! Oliveira é o seguinte: Estou com Esclerose Múltipla e principio de Alzaimer, tenho medo de nos delírios falar o que sei, isso você sabe , iria causar muitos problemas e a Esclerose me traz muitas dores, portanto quero que me mate, sou muito covarde para suicidar, mas não quero sofrer.
Estarrecido olhei para aquele homem de quase dois metros de altura que no passado mandou prender, bater, torturar, matar, alem de ter participado e feito a mesma coisa. Vi em seus olhos a tristeza de ter visto com o passar do tempo, a morte da esposa por câncer, do filho em um treinamento militar e da filha em acidente de carro, da atual esposa perdeu a filha no parto. Hoje sofrendo com essas doenças.
O Alzaimer até certo ponto seria bom pra ele porque esqueceria todas as lembranças ruins e reconfortante para quem temesse seus conhecimentos.
- General! Eu não posso fazer isso! Apesar de taxativo, me remoendo.
- Oliveira! Nós já fizemos coisas piores!
- Não entre nos...
- Você lembra da Joana D’arc, aquela por quem você se apaixonou? Eu a desci do cano, conversei com ela, ela não quis dar pra mim, coloquei-a na mesa, amarrei os pés dela nos pés da mesa as mãos nas grades da janela, ela ficou escancarada, então, comi na marra, mas o que mais me irritou, foi ela dizer que você comia melhor, naquela época eu desconfiava que Aninha tinha outro e que este outro era você. A terrorista e minha mulher davam para um subalterno que as comia melhor que eu, não agüentei. Atirei na nuca dela.
- Filho da Puta! Ela é o único morto que eu choro, choro todos os dias por ela, eu nunca amei nada ou ninguém, apenas ela...
- Antes de morrer, no hospital, a Aninha me confessou que você a comia e que parou de comê-la após a morte da Joana D’arc, você também comeu minha mulher.
- Filho da Puta! Eu não matei tua mulher!
- Ela era uma terrorista, caralho!
- Quero que você se foda com essas doenças, vou ver você apodrecer dia a dia seu desgraçado paguei todos os meus pecados por causa dela.
Virei as costas e fui embora. Fiz todo o trajeto de volta do mesmo jeito para não deixar rastros, em casa tomei um porre e alguns dias depois, realinhei minha vida.
Menos de quinze dias depois de ter falado com ele, em uma tentativa de assalto um moleque dá dois tiros de 9 mm, a queima roupa no coração dele.
Fui ao enterro e a viúva me entregou um pen drive, depois um agente do Ciex me entregou um envelope com a copia do inquérito; o menor foi abatido na favela supostamente por traficantes e a arma que matou o General foi a mesma que me feriu trinta e cinco anos atrás, uma arma sumida por tantos anos, feriu um e matou outro da mesma equipe de matadores.
O agente apenas comentou que era muita coincidência para muita informação, a Força não iria interferir, apenas me recomendou silencio, visto que eu sabia de tudo.
Respondi apenas que não sabia de nada e meu silencio seria por isso.
Quando chegar em casa vou ver o conteúdo do pen drive.
Isto é ser um Condor, o pais acima de tudo, acima da honra e até da própria vida.