Ladrões de melancia
As crianças olharam várias vezes o caminho na direção da casa de Seu Nélson. E estavam confabulando enquanto isso. Uma delas tinha por volta de uns dez anos e a outra, um pouquinho mais jovem, uns oito anos, creio. Quando estavam já na cerca de arame, o menino falou:
— Depois de eu pular a cerca, você vai até perto da casa e pula a cerca lá, viu? Faça como combinamos!...
A menina sorriu, buscando confiança no que tinha de fazer, e caminhou na direção da casa. Não queria pensar, mas os pensamentos eram insistentes — Papai não vai descobrir — E procurou executar a tarefa que combinara com o irmão. Antes deu uma olhadinha na direção em que ele pulava o cercado do vizinho. — Estavam seguindo o plano. Iria dar tudo certo!
Seu Nélson, um velho de uns setenta anos, fumava cachimbo na varanda, analisando como andava a vida, cogitando no sabor do fumo do cachimbo. Havia ao lado dele, numa mesinha de madeira gasta, uma xícara vazia de café.
— Corre, Rita! Que a menina de Seu Batista está querendo pular a cerca. Não acredito... Ela quer roubar minhas melancias!...
Ao ouvir esses gritos, a menina, assustada, errou a direção de casa, e passou foi na frente da residência do homem. Estava deveras espantada por ter sido pega querendo furtar, todavia, o certo é que não conseguira nem realizar o feito de pular a cerca. Não havendo quem a defendesse das acusações de um mal fadado furto, tinha um medo crescente nos olhos... E nada saía de sua boca... — Se ao menos a surra que, certamente levaria do pai, fosse substituída por outro castigo! Apenas uma vez o pai já fizera isso de trocar a palmatória por uma reprimenda: ficara a tarde toda sentada numa cadeira na calçada vendo os meninos da rua brincarem de pega-pega e outras brincadeiras sem ela poder ir. — Agora seria do mesmo jeito?
Houve ainda mais gritos e Seu Nélson mandou chamar Seu Batista. Não foi uma situação agradável, pois o pai lhe lançou um olhar muito zangado e ainda disse que em casa acertariam as contas. A menina sentiu um frio na espinha dorsal.
Não foi fácil para Seu Batista admitir que a filha estivesse querendo furtar melancias. Ouvia calado as acusações do vizinho e somente depois foi que falou.
— Na verdade, Seu Nélson, são dois os arremedos de ladrões. O irmão dela mais velho – João - já havia pulado sua cerca ali, antes daqui. Parece que Nena veio apenas lhe distrair para o irmão realizar a tarefa do furto das melancias. — Ele suspirou longamente e continuou. — É muito triste eu ter que falar isso, mas infelizmente meus filhos estão com ideias erradas de como é vida.
Enquanto o vizinho ficava sem graça, não sabendo o que ponderar, Seu Batista proferiu com os olhos erguidos:
— A partir de amanhã, durante uma semana, o Senhor terá um ajudante na roça. João virá ajuda-lo! — E, voltando-se para Dona Rita, — A Senhora por conta de meu pedido de desculpas e para esta menina aprender a respeitar o que é alheio, terá uma auxiliar na cozinha. Ela sabe enxugar louças e pode ajudar em outras tarefas. É meu dever de pai e isso fará com que saibam que conseguimos as coisas com trabalho.
Olhou para o lado em que a menina estava: — Vamos!
À medida em que eles se afastavam, Dona Rita falou:
— Vamos aceitar, Nélson?
Então ele falou:
— Os vizinhos são para essas coisas! E gosto das crianças...