PERU ASSADO

Acredito que ninguém saberia dizer a origem da tradição, nos Estados do Nordeste brasileiro, de se comer peru assado nos casamentos e na ceia do natal, mas todos sabem que ela é bem forte, e presente, porém por não termos a tradição de preparar quitutes caseiros, como as quitandas dos mineiros, são raras as casas que têm um forno bastante grande para assar o peru da festa.

A falta desse implemento tão importante da culinária tradicional não é motivo bastante para se quebrar a tradição vez que em todo lugar tem padaria e forno de padaria dá para assar de uma só vez até uma criação de perus, quanto mais um só ou meia dúzia deles.

Naquele ano não foi diferente.

Durante o mês de junho, nas feiras grandes com o material das festas juninas, muito milho, coco, bode, marrã, peixe salgado e garajaus com os frangos de peru para serem cevados para o natal.

Peru é bicho trabalhoso, morre fácil e precisa ser guardado na boquinha da noite se não se perde no meio do mato e não tem no mundo quem ache.

Tanto é assim que quando o cabra é alesado se diz que ele é besta igual a peru de noite.

Há pessoas que se especializam nessa tarefa de preparar o pirão com palha de milho, dessas vendidas em feira para criação, e alimentam os animais forçando de goela abaixo porções cada vez maiores para que, superalimentado se desenvolva rápido e fique bem gordo para a festa.

O português dono da padaria avisou à clientela que ele teria grande satisfação em assar todos os perus e que no dia 24 a última fornada de pão seria as três da tarde para o forno ficar liberado para os fregueses.

Como de costume, os perus morreram na véspera da festa, receberam os temperos e durante o dia, foram devidamente recheados, colocados em assadeiras cobertas com papel alumínio e em procissão, levados para a padaria.

Acontece que Zé Batista, o padeiro responsável pelo forno, sempre gostou de tomar umas caninhas para clarear as ideias e, nesse natal, depois da última fornada, conversando com os amigos na barraca de Galego ele exagerou nas doses, esqueceu do forno ligado no máximo.

“Se aguardente é do diabo, pra que bebeu?

Se o copo era grande, pra que encheu? ” *

E nessa noite de natal, ninguém conseguiu comer os tições de carvão em que os perus se transformaram...

* versos do poema Bumba Meu Boi – Ascenso Ferreira, poeta Pernambucano.