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Ele fodeu a minha cabeça.
Desde quando ele tirou a própria vida, eu me afundei em um buraco que não consegui sair mais. Mas não foi nesse momento em que ele fodeu a minha cabeça. Foi muito antes disso.
Quando ele tirou a própria vida eu me culpei. Eu me culpei porque fui a ultima pessoa (desde que todos tem conhecimento) que ele conversou. E desde que ele se foi, eu não parei de me culpar.
Há uns dias atrás eu conheci um cara igual a ele. Igual no jeito de falar, igual nos modos, igual a forma de pensar. E me apeguei, e achei que era minha obrigação ajudar: "devo fazer por ele o que eu não consegui fazer pelo amor da minha vida".
Mas desde que ele se foi, eu idealizei algo que não existia. Eu idealizei a perfeição, e isso não existe. Eu idealizei as coisas boas que aconteceram e deixei de lado as coisas ruins.
Me lembro do dia em que estávamos na minha casa assistindo o filme "Clube da Luta", eu tinha acabado de começar a tomar antidepressivos, e eles tiravam o meu apetite. Nós estávamos comendo pizza de peito de peru, e eu não consegui morder um pedaço sequer:
"Não estou com vontade de comer" - eu disse.
"Mas você precisa" - ele respondeu.
Deixei o prato de lado, e alguns segundos depois, ele pegou o prato do chão e virou-se de frente pra mim:
- "Você precisa comer".
Então ele pegou um pedaço de pizza com a mão e colocou na minha boca. Eu não queria comer, mas comi. Eu não tinha fome, mas me sacrifiquei. Ele estava cuidando de mim. Ele se preocupava comigo. E eu comi aquele pedaço com muito sacrifício.
Essa cena se repete em minha mente como se fosse ontem. Mas não foi. Foi em 2015.
Basicamente todas as lembranças boas prevaleceram. E hoje, mais de um ano depois de sua morte, eu ainda me sinto mal pelo que aconteceu.
Há poucos minutos atrás conversei com um amigo:
- "Acho que nunca vou superá-lo".
E esse amigo me mostrou que o luto nos faz ter uma ideia destorcida das pessoas. Onde estão as memórias ruins? Então parei pra pensar e me lembrei de várias delas:
- "Acho que estou apaixonada por você" - eu disse pra ele.
- "Não sinto o mesmo. Eu te disse para não se apaixonar".
No dia seguinte, ele postou um status na cama de outra pessoa.
- "Então porque continuo buscando ele em outros?" - perguntei pro meu amigo.
- "Não acho que você esteja buscando ele. Acho que está buscando algo que viu nele. E você precisa descobrir o que é".
O que eu vi nele? Ele é literalmente um cara depressivo que se matou.
- "Talvez seja mais fácil lidar com a sua depressão cuidando de outras pessoas. Talvez a sensação de salvar outra pessoa através do amor, seja a sensação de salvar a si mesma através do amor. É uma compensação".
Palavras do meu amigo. E não é que ele estava certo?
Aprendi que não é idealizando a perfeição de alguém que torna ela perfeita. São as merdas que uma pessoa faz que causam impacto. São os seus mínimos defeitos que fazem dela inesquecível, e ao mesmo tempo, superável.
Talvez naquela domingo eu conseguisse estar do lado dele e evitar que ele tirasse a própria vida. Mas por quanto tempo iria durar? Talvez se ele fosse tão perfeito eu nem sentiria a sua falta. Mas agora consigo enxergar que mesmo dando tudo o que eu tenho, ele tomaria o mesmo rumo. E que eu fiz o que podia. E que eu não busco ele em ninguém, mas sim que é ele quem me busca. Porque desde quando ele se foi, conheci muitas pessoas com a mesma essência, como se eu as atraísse para o meu ciclo social. Eu busco isso? Não. Mas talvez seja o meu destino de evitar que isso aconteça com outros.
Como eu vou superar? Sinceramente, ainda não sei. Mas reconhecer que nunca foi um mar de rosas já é meio caminho andado. Nunca vou deixar de amá-lo, mas estou tentando deixar para trás todo o sofrimento e culpa desnecessária que ainda carrego comigo.