Corruptela I
Tadinho do Zé da Cruz! Pai zeloso de uma penca de filhos e filhas, criou a todos com o suor de seu ofício: chaveiro.
Ensinou aos varões, todos os segredos da profissão que aliás, era cargo de confiança para os seus clientes, pois ele detinha todos os segredos das fechaduras, cadeados e cofres das residências da cidade. Homem honesto às extremas, transmitiu a mesma virtude aos seus rebentos, mas como os dedos das mãos não são iguais, há sempre um que sai degenerado. E foi o caçula, Tiago, que sentou nódoa na reputação ilibada do pai, usando seu talento para o mau.
Entrava nas casas alheias, no baixa calado, na ausência dos moradores e pilhava os cofres dos incautos. Logo foi apanhado em flagrante delito de ladroagem por uma idosa pensionista, viúva de um importante desembargador da região. A polícia logo botou as mãos nele, mas no percurso para a delegacia, ele se safou num zás-trás das algemas e abriu por dentro a porta de trás do camburão e picou a mula no cerrado. Conseguiram recapturá-lo dias depois e o botaram no xilindró, mas o fujão não pernoitou na cadeia. Tiago da Cruz, na calada da noite, destrancou a porta da cela e cascou o fora e com ele, os companheiros de cárcere. E assim foi uma série de prende-e-foge nos dias subsequentes, a ponto desta saga ganhar notoriedade por todos os cantos daquele interior. A fama de fujão de Tiago da Cruz repercutiu por todas as bandas, chegando até mesmo à capital. As proezas do jovem lalau serviam de comparação aos fatos corriqueiros nas propriedades rurais daquelas cercanias. Quando um garrote, uma novilha, um burrego, um gado qualquer, teimava em fugir várias vezes do cercado ou do curral, logo diziam:
- Esse danado tá fugindo mais do que o Tiago da Cruz!
E assim, a corruptela popular se encarregou de (des)ajustar a frase original:
- Esse danado tá fugindo mais do que o "diabo da cruz"!