O Menino, o Pastor e as artimanhas de Satanás
Tema assustador, não é verdade?! – Mas leia sei que vai gostar, é a vida como acontece. - Trata-se de Pedrinho, Pastor Durval, sua família, os irmãos em Cristo e Ele o maldito, sempre atrapalhando a vida de todo mundo. Pois bem... -
Quando Pedrinho nasceu, seus pais o levaram para ser apresentado na igreja que congregavam, receber as bênçãos, coisas assim... era num interior bem pequeno e muito distante da capital. Ali viviam razoavelmente bem e felizes, a igreja Cristã representada por missionários exercia uma enorme influência nos costumes do lugar, bons, diga-se, à bem da verdade. Porém, Pedrinho antes que completasse cinco anos perdeu os pais, eles morreram, então foi com a avó morar na capital; já na cidade dona Maria Celeste, como se chamava, não descuidou da fé, procurou uma igreja nas proximidades pra congregar, pois era muito religiosa, mas por perto não havia nenhuma, salvo a Católica e muito distante.
Certo dia, na rua onde morava, brincando de bola com os colegas, Pedrinho avistou dois homens, numa carroça, puxando um grande tablado, era um púlpito e iam em direção a uma casa que estava para aluguel, logo saiu do jogo e foi pra perto ver do que se tratava, o menino era muito esperto e bastante curioso, aproximou-se e falou com voz festiva para o que estava ao lado do carroceiro: - Isso é um púlpito... o senhor é Pastor... vai montar uma igreja..., que legal! – e prosseguiu: - Por aqui só tem a igreja católica e é bem distante... - o homem sorriu, desceu da carroça passou a mão na cabeça do menino e falou: - você é muito esperto, como acertou tudo isso? O menino respondeu: - meu nome é Pedrinho, eu sou crente, como é seu nome?! E o homem já encantado com o garoto, falou sorrindo: - Você está certo Pedrinho, sou o Pastor Durval Dantas e você já é o meu primeiro convidado, vamos aprontar a igrejinha e se Deus quiser domingo faremos o primeiro culto; - era uma quarta-feira e a tarde já estava caindo. O moleque vibrou e disse pro reverendo: - eu venho amanhã cedinho pra ajudar na arrumação e saiu correndo para contar pra sua avó, no caminho foi pensando: - DD esse é o apelido dele – o moleque botava apelido em todo mundo e não seria diferente com o tal Pastor. – Sua avó ficou muito contente e pensou: - uma igreja evangélica, que bom; - algo de extraordinário sentiu em seu coração.
No dia seguinte bem cedo o Pastor Durval já cuidava para que a casa estivesse aos moldes de uma igreja, derrubou todas as paredes de meio e deixou um amplo salão; por ser toda de madeira não houve grandes dificuldades, quando Pedrinho chegou foi recebido por uma mulher muito bonita, ele parou como estivesse encantado e antes que ela falasse alguma coisa ele se adiantou: - Quem é a Senhora? Falou dum jeito como se já participasse da igreja ela sorriu e falou pra ele: - espere um pouco, eu sei de você, é o Pedrinho, não é mesmo?!, meu marido me falou de você; disse que você é uma graça e muito esperto e vejo que é mesmo, meu nome é Renata, Irmã Renata - ele riu sem jeito, por um instante pensou: - Poxa como ela é linda, esse é seu apelido, não tem outro, - também lembrou-se de sua mãe. O Pastor se achegou e a conversa ficou alegre e Pedrinho falou: - vou chamar meus colegas, só a gente não vai dá conta, o senhor disse que quer abrir no domingo né, e saiu correndo, o casal ficou rindo do menino, poucos minutos ele estava de volta com três colegas do mesmo tamanho que ele, começou a apresenta-los, ia dizer pelo os apelidos mas lembrou-se que tinha um que ia à loucura quando o apelidavam de cabeção, então resolveu falar os próprios nomes; Lucas, Mário e Genival (o cabeção) aí a coisa andou e o clima era de muita alegria, ainda pela manhã começaram a pintura da parte de dentro da igreja. O moleque sapeca não se continha em bagunçar com os colegas e sem poder apelidar Genival, ficava assoviando (você viu o cabeção por ai... eu, não, eu não...) rsrsr... - Genival olhava pra ele vermelho de raiva e dizia baixinho: - vou te pegar lá fora, seu remelento..., e o casal ficava apenas rindo sem saber das travessuras dos moleques.
No Domingo a Igreja estava toda pronta com uma placa bem grande na textura “Igreja Evangélica do Reino de Jesus” toda branquinha com as janelas azuis celestes, bancos de madeira sem recostos, mas confortáveis e flores ao redor; no púlpito muitas rosas amarelas e vermelhas entre cortinas brancas e azuis celestes; - estava muito bonita a Igreja do Pastor Durval. Pedrinho já sentava na terceira fileira, juntamente com sua avó e no banco de trás os seus colegas, também com seus pais. Eles esperavam muita gente, pois os meninos distribuíram bastante panfletos para toda vizinhança e não foi diferente, no primeiro culto a Igreja estava lotada e a pregação foi maravilhosa, naquela mesma noite houve muitos que se converteram.
O Pastor Durval tinha um dom divino, ele encantava as pessoas com suas palavras e tinha um conhecimento profundo do evangelho, além de ser um homem muito bonito, ele com a esposa e seus dois filhos: uma garotinha de doze anos e um menino de quatorze, formavam uma linda família, embora o rapazinho fosse paraplégico, estava sempre numa cadeira de rodas. Nos dias seguintes à irmã Renata já dirigia um grupo de moças e rapazes, iniciava ali a formação de um coral, ela tinha uma liderança notável, além d’uma voz linda e dominava bem a arte de cantar, por outro lado o Pastor Durval formava e instruía um grupo de senhores, afim de formar o corpo de diáconos da Igreja com suas determinadas funções, e assim ocorreu, em pouco tempo a igreja estava bem estruturada e novos membros se chegavam, alguns migrados de outras igrejas. O recolhimento dos dízimos e ofertas cresciam assustadoramente, como se estivessem sendo abençoados por Deus, com isso aumentaram os espaços na igreja e formaram salas para estudos e escolas dominicais. A igrejinha estava sempre lotada em todos os cultos que aconteciam aos domingos e quartas feiras. A empolgação de todos envolvidos era imensa, pois se sentiam fundadores de um projeto que acreditavam ser de Deus, inclusive Pedrinho e sua avó que passou a ser a zeladora da igreja, dado ao carinho que o Pastor e família formaram entre eles, com isso o moleque estava presente em tudo.
Durval e Renata, pareciam estar sempre num eterno namoro, romântico e apaixonado, trocavam gentilezas o tempo todo e eram bem carinhosos um com o outro... Pedrinho via e ficava pensando: - Minha mãe e meu Pai eram assim, eu os amava tanto, ficava triste com aquela lembrança e passou a ter o casal como referência, - tudo aquilo parece ter lhe despertado a sua vida amorosa, ficava pensando: - quando eu tiver uma namorada quero que seja assim como eles são e como meu pai era com minha mãe; instintivamente começou a prestar atenção em outros casais e tirava suas conclusões. Certo dia uma garota da redondeza foi na igreja pela primeira vez, ela não era tão bonita, mas tinha um jeito esperto e brincalhona que encantava todo mundo, devia ter um pouco mais que sua idade e com ele foi tirar graça, pois dele já tinha ouvido falar, que era brincalhão e gostava de pôr apelido nos outros, chegou com ele e falou: - olha aqui amarelinho, se tu botar apelido em mim eu vou te cobrir no chinelo, ouviu?! Ele assustou-se e disse: - Eu, amarelinho? Tá bom abelha morta, - e saiu correndo e ela correu atrás dele já com o chinelo na mão... começava ali uma amizade que iria modificar os dias do menino e dela também, ela fez dele o seu confidente, ele não a apelidava e passou a ser a sua primeira amiga, a melhor depois de algum tempo... ela brincava com todo mundo e depois ia falar com ele como se já estivesse cansada dos outros, ele percebia e esperava por aquele momento como se estivesse amarrado e ela viesse para libertá-lo, então conversavam muito sobre muitas coisas, ela tinha cuidado com ele e ele com ela. Seu nome era Elisa ele achava lindo.
Mas o capeta não gosta de ver ninguém feliz, onde existe alegria ele semeia maldade e tristezas, salva-se quem persiste na fé e nas coisas de Deus.
O coral ministrado por Irmã Renata precisava de uma voz tenor e alguém sugeriu o nome de Rogério um irmão recente na igreja, que diziam ter uma boa voz e cantava com boa sonoridade nos cultos; ela o convidou a fazer parte do coral, prometendo ajustá-lo na voz desejada e assim ocorreu, era também um belo homem, recentemente divorciado. E o rapaz entendeu tudo errado, terminou apaixonado pela Irmã Renata, ainda que ela não o incentivasse a tanto; os cochichos começaram e o Pastor terminou sabendo, algo de estranho começou a sentir e se redobrava em orações, mas mantinha a confiança na esposa, Pedrinho não gostava nada daquilo, pois era torcedor do casal.
Por outro lado, a irmã Damaris que cuidava das finanças da igreja como tesoureira escolhida por Renata, sabendo dos rumores envolvendo a primeira dama, começou a encorajar-se em assediar o líder, com delicadezas mais sensuais, pois tinha por ele um desejo escondido; começava ali a via crucis do bom Pastor, Ele chorava em suas orações e passou a pregar com muita firmeza sobre infidelidades no casamento, porém o efeito se dava ao contrário, ao vê-lo triste, todas as outras irmãs da igreja começaram a se apiedar do reverendo e uma onda de assédio surgiu e Damaris se oportunizava com tudo aquilo, querendo ser a mais próxima à confortar o mestre.
Renata começou a perceber a tristeza do marido, - Durval mesmo sem culpa se auto flagelava e dizia a si mesmo: - meu Deus o que é que está por vir que não consigo controlar, essa tristeza no meu peito está me destruindo e sinto afastar-me de ti... - Era a força do maligno agindo para que ele se auto destruísse..., quanto mais pregava o amor e suas contradições, mais as mulheres, casadas e solteiras se encantavam com o mestre, e como uma negra nuvem o caos se instalou dentro da Igreja. Neste momento conturbado Durval Júnior, o filho paraplégico precisou de ajuda médica com urgência e somente no Rio de Janeiro havia clínica especializada para o seu tratamento, Renata prontificou-se a leva-lo e assim o fez, com ela também foi a filha Mirian, iriam passar seis meses, tempo estimado pelos médicos para a recuperação do rapaz.
No Rio, Renata ficou sabendo do escândalo na Igreja entre o Pastor e a tesoureira. Entristeceu-se e decidiu não mais voltar... ela era assim, decente e honrada, dizia que se arrastaria pelo chão para defender o seu amor, desde que nunca houvesse traição. Nesse diapasão, Satanás apossou-se do Pastor por intermédio de Damaris como se ela lhe tivesse trazido outra maçã ao homem primitivo e ele tornou-se um instrumento da luxúria, passou a não mais se contentar apenas com Damaris e cedia ao assédio de todas as irmãs mais bem parecidas da igreja, casadas e solteiras, não fazia distinção, até ser descoberto e muitos maridos traídos deixaram suas mulheres e juraram mata-lo. Por fim, o grupo de Diáconos resolveu afastá-lo da presidência da igreja depois o expulsaram e o Pastor entrou em desgraça. Dali pra frente sua vida foi à bancarrota, entregou-se à bebedeira e a prostituição. Pedrinho que já se achava apaixonado por Elisa, sentiu sua primeira decepção na crença, sua fé foi abalada, também decidiu sair da igreja e foi congregar na igreja católica. Elisa percebeu que não eram apenas amigos, havia mais sentimento que os envolvia, além da amizade, ficou muito triste e deixou de ser a garota alegre e sorridente que sempre fora.
Na igreja católica, como se o rabo do cão, também tivesse passado por lá, havia rumores idênticos com o Frei Leonardo, um italiano muito bonito; parecia estar seduzindo todas as irmãs daquela paróquia, em especial as mais jovens, e começaram a aparecer na igreja muitas garotas grávidas dizendo serem do tal Vigário. Todavia o fato se deu diferente, certo dia surgiu o boato: - “Frei Leonardo, fugiu com Roberta a moça mais bonita da Igreja”, - ainda vivem na Itália, ele largou a batina e casou-se com a bela jovem. Novamente Pedrinho se decepcionou e desistiu das igrejas. Mantinha sua relação com Deus em sua própria casa e nunca se esqueceu de Elisa, sonhava com ela todas as noites como se juntos ainda estivessem, prometeu a si mesmo que tão logo atingisse a maior idade iria pedi-la em casamento. A moça por sua vez, também não se esquecia de Pedrinho e vivia um amor platônico, desejando um dia realizar o seu sonho, amar e casar com Pedrinho, seu doce menino.
A vida do Pastor Dantas estava uma tristeza só, - soube que Renata estava se relacionando amorosamente com o médico que cuidava de seu filho. Ele perambulava de bar em bar como charuto em boca de bêbados, na cabeça as lembranças da mulher e dos filhos e a tristeza de ter perdido a fé, em cada lugar deixava escritos desabafando suas mágoas sempre requerendo sua vida de volta, pensando ter sido abandonado por Renata, e por Deus. Brigava nos bares e sempre apanhava, pois nunca aprendeu sobre lutas corporais e uma canção o perseguia tornando-o cada vez mais triste, em sua mente vivia sempre cantando:
(...)
“Aquela colcha de retalhos que tu fizeste
Juntando pedaço em pedaço foi costurada
Serviu para o nosso abrigo em nossa pobreza
Aquela colcha de retalhos está bem guardada
Agora na vida rica que estás vivendo
Terás como agasalho colcha de cetim
Mas quando chegar o frio no seu corpo enfermo
Tu hás de lembrar da colcha e também de mim
Eu sei que hoje não te lembras dos dias amargos
Que junto de mim fizeste um lindo trabalho
E nessa sua vida alegre tens o que queres
Eu sei que esqueceste agora a colcha de retalhos"
(...)
O tempo passou, certo dia Pedrinho, já mais adulto, andando pelo centro da cidade, viu um Senhor de cabelos grisalhos, tentando consertar o motor de seu carro, um “fusquinha”, - levado por um impulso decidiu que iria ajudar, o Tal Senhor estava abaixado com o rosto para dentro do motor do carro quando ouviu uma voz: - Posso ajudá-lo?!, entendo um pouco de mecânica; o homem por um momento ficou inerte, como se conhecesse aquela voz, com a fala um tanto rouca e desgastada pelo tempo disse, ainda sem virar o rosto: - É você Pedrinho? O rapaz empalideceu, sentiu algo em seu coração, uma mistura de alegria e tristeza, também falou sem olhá-lo: - Pastor é o Senhor?! Então se viram, se alegraram, se abraçaram e começaram a conversar. Dizia o DD, segundo Pedrinho: - Durante dez anos o Diabo me usou, tomou tudo que era meu e que Deus tinha me dado; perdi minha mulher e meus filhos. Pedrinho perguntou: - o que houve com sua esposa e as crianças?! - e ele triste falou: - Meu filho morreu, Renata casou-se novamente com o médico que os atendia e minha filha sumiu no mundo, foi ser cantora de bregas e nunca mais soube nada dela. Mas Jesus me libertou, tirou-me do inferno e me deu nova vida, nesse momento seu semblante mudou e o de Pedrinho também. Continuou DD: - Quero que vá me visitar, fundei nova Igreja, está tão linda como a que você me ajudou a levantar naquela época. Pedrinho pensou: - que maravilha Jesus recompôs a vida dele, acho que ele pode refazer a minha também. Por fim o Reverendo perguntou: - e Elisa como está?! – sonhei que um dia casaria vocês... Pedrinho sentiu seu coração pipocar no seu peito. Mas desconversou falando: - minha avó gostaria de vê-lo.
No domingo seguinte Pedrinho voltou a Igreja que ajudou a fundar, lá estavam seus amigos de infância, todos com funções de direção e Elisa ao vê-lo sentiu o seu coração querendo saltar do peito, ela estava muito bonita, embora com um semblante perdido, mas quando avistou e voltou a falar com o seu querido amor, um raio de ternura a envolveu e eles se encantaram outra vez, mal terminou o culto e foram para o local onde sempre conversavam e o tempo parecia ser o mesmo que os envolvia naqueles dias felizes de outrora, não mais se afastaram, dois meses depois se prometeram casar. Todos os papéis foram organizados e o casamento seria na Igreja, agora só de Elisa e assim se seguiu, no dia certo a igreja estava toda enfeitada, linda, cheia de flores e muitos convidados, por um instante Pedrinho entristeceu pensando no que o Pastor Dantas havia lhe falado do sonho que um dia os casariam, mas viu a incompatibilidade, pois ele tinha sido expulso dali.
O então Pastor da Igreja de Elisa era um jovem senhor, muito querido por todos. Iniciaram a sessão e os nubentes já iriam entrar na igreja para a formalidade do casamento, entretanto havia uma mudança no altar. Um cântico suave começou a tocar e o noivo com os padrinhos estavam a entrar, como é de praxe, Pedrinho feliz olhava para todos os lados, menos pra frente no altar, porém quando o fez ficou encantado e começou a chorar, ali estava para presidir o casamento um senhor de cabelos grisalhos, era o Pastor Durval Dantas... ele quebrou o protocolo e foi abraça-lo, a igreja se levantou e todos aplaudiram, em seguida a noiva Elisa entrou com a linda música tocada pelo coral da igreja. Ela sabia de tudo, pois ela mesmo combinou a surpresa para o seu eterno amor.... A pregação de Dantas foi maravilhosa e todos se emocionaram. Por fim os noivos se entregaram ao casamento e Dantas ficou muito feliz.
As duas igrejas de Dantas e de Elisa se tornaram amigas, a vida seguiu e todos foram felizes. Um ano depois o Pastor Dantas, também se casou e voltou a ser feliz.
Satanás perdeu, embora tenha feito um grande estrago.
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Antônio Souza
(Contos/Causos/Romance)
Música: https://youtu.be/KQMpq2dsk9c
Colcha de retalhos
Chitãozinho e Xororó / Leonardo
www.antoniosouzaescritor.com
Tema assustador, não é verdade?! – Mas leia sei que vai gostar, é a vida como acontece. - Trata-se de Pedrinho, Pastor Durval, sua família, os irmãos em Cristo e Ele o maldito, sempre atrapalhando a vida de todo mundo. Pois bem... -
Quando Pedrinho nasceu, seus pais o levaram para ser apresentado na igreja que congregavam, receber as bênçãos, coisas assim... era num interior bem pequeno e muito distante da capital. Ali viviam razoavelmente bem e felizes, a igreja Cristã representada por missionários exercia uma enorme influência nos costumes do lugar, bons, diga-se, à bem da verdade. Porém, Pedrinho antes que completasse cinco anos perdeu os pais, eles morreram, então foi com a avó morar na capital; já na cidade dona Maria Celeste, como se chamava, não descuidou da fé, procurou uma igreja nas proximidades pra congregar, pois era muito religiosa, mas por perto não havia nenhuma, salvo a Católica e muito distante.
Certo dia, na rua onde morava, brincando de bola com os colegas, Pedrinho avistou dois homens, numa carroça, puxando um grande tablado, era um púlpito e iam em direção a uma casa que estava para aluguel, logo saiu do jogo e foi pra perto ver do que se tratava, o menino era muito esperto e bastante curioso, aproximou-se e falou com voz festiva para o que estava ao lado do carroceiro: - Isso é um púlpito... o senhor é Pastor... vai montar uma igreja..., que legal! – e prosseguiu: - Por aqui só tem a igreja católica e é bem distante... - o homem sorriu, desceu da carroça passou a mão na cabeça do menino e falou: - você é muito esperto, como acertou tudo isso? O menino respondeu: - meu nome é Pedrinho, eu sou crente, como é seu nome?! E o homem já encantado com o garoto, falou sorrindo: - Você está certo Pedrinho, sou o Pastor Durval Dantas e você já é o meu primeiro convidado, vamos aprontar a igrejinha e se Deus quiser domingo faremos o primeiro culto; - era uma quarta-feira e a tarde já estava caindo. O moleque vibrou e disse pro reverendo: - eu venho amanhã cedinho pra ajudar na arrumação e saiu correndo para contar pra sua avó, no caminho foi pensando: - DD esse é o apelido dele – o moleque botava apelido em todo mundo e não seria diferente com o tal Pastor. – Sua avó ficou muito contente e pensou: - uma igreja evangélica, que bom; - algo de extraordinário sentiu em seu coração.
No dia seguinte bem cedo o Pastor Durval já cuidava para que a casa estivesse aos moldes de uma igreja, derrubou todas as paredes de meio e deixou um amplo salão; por ser toda de madeira não houve grandes dificuldades, quando Pedrinho chegou foi recebido por uma mulher muito bonita, ele parou como estivesse encantado e antes que ela falasse alguma coisa ele se adiantou: - Quem é a Senhora? Falou dum jeito como se já participasse da igreja ela sorriu e falou pra ele: - espere um pouco, eu sei de você, é o Pedrinho, não é mesmo?!, meu marido me falou de você; disse que você é uma graça e muito esperto e vejo que é mesmo, meu nome é Renata, Irmã Renata - ele riu sem jeito, por um instante pensou: - Poxa como ela é linda, esse é seu apelido, não tem outro, - também lembrou-se de sua mãe. O Pastor se achegou e a conversa ficou alegre e Pedrinho falou: - vou chamar meus colegas, só a gente não vai dá conta, o senhor disse que quer abrir no domingo né, e saiu correndo, o casal ficou rindo do menino, poucos minutos ele estava de volta com três colegas do mesmo tamanho que ele, começou a apresenta-los, ia dizer pelo os apelidos mas lembrou-se que tinha um que ia à loucura quando o apelidavam de cabeção, então resolveu falar os próprios nomes; Lucas, Mário e Genival (o cabeção) aí a coisa andou e o clima era de muita alegria, ainda pela manhã começaram a pintura da parte de dentro da igreja. O moleque sapeca não se continha em bagunçar com os colegas e sem poder apelidar Genival, ficava assoviando (você viu o cabeção por ai... eu, não, eu não...) rsrsr... - Genival olhava pra ele vermelho de raiva e dizia baixinho: - vou te pegar lá fora, seu remelento..., e o casal ficava apenas rindo sem saber das travessuras dos moleques.
No Domingo a Igreja estava toda pronta com uma placa bem grande na textura “Igreja Evangélica do Reino de Jesus” toda branquinha com as janelas azuis celestes, bancos de madeira sem recostos, mas confortáveis e flores ao redor; no púlpito muitas rosas amarelas e vermelhas entre cortinas brancas e azuis celestes; - estava muito bonita a Igreja do Pastor Durval. Pedrinho já sentava na terceira fileira, juntamente com sua avó e no banco de trás os seus colegas, também com seus pais. Eles esperavam muita gente, pois os meninos distribuíram bastante panfletos para toda vizinhança e não foi diferente, no primeiro culto a Igreja estava lotada e a pregação foi maravilhosa, naquela mesma noite houve muitos que se converteram.
O Pastor Durval tinha um dom divino, ele encantava as pessoas com suas palavras e tinha um conhecimento profundo do evangelho, além de ser um homem muito bonito, ele com a esposa e seus dois filhos: uma garotinha de doze anos e um menino de quatorze, formavam uma linda família, embora o rapazinho fosse paraplégico, estava sempre numa cadeira de rodas. Nos dias seguintes à irmã Renata já dirigia um grupo de moças e rapazes, iniciava ali a formação de um coral, ela tinha uma liderança notável, além d’uma voz linda e dominava bem a arte de cantar, por outro lado o Pastor Durval formava e instruía um grupo de senhores, afim de formar o corpo de diáconos da Igreja com suas determinadas funções, e assim ocorreu, em pouco tempo a igreja estava bem estruturada e novos membros se chegavam, alguns migrados de outras igrejas. O recolhimento dos dízimos e ofertas cresciam assustadoramente, como se estivessem sendo abençoados por Deus, com isso aumentaram os espaços na igreja e formaram salas para estudos e escolas dominicais. A igrejinha estava sempre lotada em todos os cultos que aconteciam aos domingos e quartas feiras. A empolgação de todos envolvidos era imensa, pois se sentiam fundadores de um projeto que acreditavam ser de Deus, inclusive Pedrinho e sua avó que passou a ser a zeladora da igreja, dado ao carinho que o Pastor e família formaram entre eles, com isso o moleque estava presente em tudo.
Durval e Renata, pareciam estar sempre num eterno namoro, romântico e apaixonado, trocavam gentilezas o tempo todo e eram bem carinhosos um com o outro... Pedrinho via e ficava pensando: - Minha mãe e meu Pai eram assim, eu os amava tanto, ficava triste com aquela lembrança e passou a ter o casal como referência, - tudo aquilo parece ter lhe despertado a sua vida amorosa, ficava pensando: - quando eu tiver uma namorada quero que seja assim como eles são e como meu pai era com minha mãe; instintivamente começou a prestar atenção em outros casais e tirava suas conclusões. Certo dia uma garota da redondeza foi na igreja pela primeira vez, ela não era tão bonita, mas tinha um jeito esperto e brincalhona que encantava todo mundo, devia ter um pouco mais que sua idade e com ele foi tirar graça, pois dele já tinha ouvido falar, que era brincalhão e gostava de pôr apelido nos outros, chegou com ele e falou: - olha aqui amarelinho, se tu botar apelido em mim eu vou te cobrir no chinelo, ouviu?! Ele assustou-se e disse: - Eu, amarelinho? Tá bom abelha morta, - e saiu correndo e ela correu atrás dele já com o chinelo na mão... começava ali uma amizade que iria modificar os dias do menino e dela também, ela fez dele o seu confidente, ele não a apelidava e passou a ser a sua primeira amiga, a melhor depois de algum tempo... ela brincava com todo mundo e depois ia falar com ele como se já estivesse cansada dos outros, ele percebia e esperava por aquele momento como se estivesse amarrado e ela viesse para libertá-lo, então conversavam muito sobre muitas coisas, ela tinha cuidado com ele e ele com ela. Seu nome era Elisa ele achava lindo.
Mas o capeta não gosta de ver ninguém feliz, onde existe alegria ele semeia maldade e tristezas, salva-se quem persiste na fé e nas coisas de Deus.
O coral ministrado por Irmã Renata precisava de uma voz tenor e alguém sugeriu o nome de Rogério um irmão recente na igreja, que diziam ter uma boa voz e cantava com boa sonoridade nos cultos; ela o convidou a fazer parte do coral, prometendo ajustá-lo na voz desejada e assim ocorreu, era também um belo homem, recentemente divorciado. E o rapaz entendeu tudo errado, terminou apaixonado pela Irmã Renata, ainda que ela não o incentivasse a tanto; os cochichos começaram e o Pastor terminou sabendo, algo de estranho começou a sentir e se redobrava em orações, mas mantinha a confiança na esposa, Pedrinho não gostava nada daquilo, pois era torcedor do casal.
Por outro lado, a irmã Damaris que cuidava das finanças da igreja como tesoureira escolhida por Renata, sabendo dos rumores envolvendo a primeira dama, começou a encorajar-se em assediar o líder, com delicadezas mais sensuais, pois tinha por ele um desejo escondido; começava ali a via crucis do bom Pastor, Ele chorava em suas orações e passou a pregar com muita firmeza sobre infidelidades no casamento, porém o efeito se dava ao contrário, ao vê-lo triste, todas as outras irmãs da igreja começaram a se apiedar do reverendo e uma onda de assédio surgiu e Damaris se oportunizava com tudo aquilo, querendo ser a mais próxima à confortar o mestre.
Renata começou a perceber a tristeza do marido, - Durval mesmo sem culpa se auto flagelava e dizia a si mesmo: - meu Deus o que é que está por vir que não consigo controlar, essa tristeza no meu peito está me destruindo e sinto afastar-me de ti... - Era a força do maligno agindo para que ele se auto destruísse..., quanto mais pregava o amor e suas contradições, mais as mulheres, casadas e solteiras se encantavam com o mestre, e como uma negra nuvem o caos se instalou dentro da Igreja. Neste momento conturbado Durval Júnior, o filho paraplégico precisou de ajuda médica com urgência e somente no Rio de Janeiro havia clínica especializada para o seu tratamento, Renata prontificou-se a leva-lo e assim o fez, com ela também foi a filha Mirian, iriam passar seis meses, tempo estimado pelos médicos para a recuperação do rapaz.
No Rio, Renata ficou sabendo do escândalo na Igreja entre o Pastor e a tesoureira. Entristeceu-se e decidiu não mais voltar... ela era assim, decente e honrada, dizia que se arrastaria pelo chão para defender o seu amor, desde que nunca houvesse traição. Nesse diapasão, Satanás apossou-se do Pastor por intermédio de Damaris como se ela lhe tivesse trazido outra maçã ao homem primitivo e ele tornou-se um instrumento da luxúria, passou a não mais se contentar apenas com Damaris e cedia ao assédio de todas as irmãs mais bem parecidas da igreja, casadas e solteiras, não fazia distinção, até ser descoberto e muitos maridos traídos deixaram suas mulheres e juraram mata-lo. Por fim, o grupo de Diáconos resolveu afastá-lo da presidência da igreja depois o expulsaram e o Pastor entrou em desgraça. Dali pra frente sua vida foi à bancarrota, entregou-se à bebedeira e a prostituição. Pedrinho que já se achava apaixonado por Elisa, sentiu sua primeira decepção na crença, sua fé foi abalada, também decidiu sair da igreja e foi congregar na igreja católica. Elisa percebeu que não eram apenas amigos, havia mais sentimento que os envolvia, além da amizade, ficou muito triste e deixou de ser a garota alegre e sorridente que sempre fora.
Na igreja católica, como se o rabo do cão, também tivesse passado por lá, havia rumores idênticos com o Frei Leonardo, um italiano muito bonito; parecia estar seduzindo todas as irmãs daquela paróquia, em especial as mais jovens, e começaram a aparecer na igreja muitas garotas grávidas dizendo serem do tal Vigário. Todavia o fato se deu diferente, certo dia surgiu o boato: - “Frei Leonardo, fugiu com Roberta a moça mais bonita da Igreja”, - ainda vivem na Itália, ele largou a batina e casou-se com a bela jovem. Novamente Pedrinho se decepcionou e desistiu das igrejas. Mantinha sua relação com Deus em sua própria casa e nunca se esqueceu de Elisa, sonhava com ela todas as noites como se juntos ainda estivessem, prometeu a si mesmo que tão logo atingisse a maior idade iria pedi-la em casamento. A moça por sua vez, também não se esquecia de Pedrinho e vivia um amor platônico, desejando um dia realizar o seu sonho, amar e casar com Pedrinho, seu doce menino.
A vida do Pastor Dantas estava uma tristeza só, - soube que Renata estava se relacionando amorosamente com o médico que cuidava de seu filho. Ele perambulava de bar em bar como charuto em boca de bêbados, na cabeça as lembranças da mulher e dos filhos e a tristeza de ter perdido a fé, em cada lugar deixava escritos desabafando suas mágoas sempre requerendo sua vida de volta, pensando ter sido abandonado por Renata, e por Deus. Brigava nos bares e sempre apanhava, pois nunca aprendeu sobre lutas corporais e uma canção o perseguia tornando-o cada vez mais triste, em sua mente vivia sempre cantando:
(...)
“Aquela colcha de retalhos que tu fizeste
Juntando pedaço em pedaço foi costurada
Serviu para o nosso abrigo em nossa pobreza
Aquela colcha de retalhos está bem guardada
Agora na vida rica que estás vivendo
Terás como agasalho colcha de cetim
Mas quando chegar o frio no seu corpo enfermo
Tu hás de lembrar da colcha e também de mim
Eu sei que hoje não te lembras dos dias amargos
Que junto de mim fizeste um lindo trabalho
E nessa sua vida alegre tens o que queres
Eu sei que esqueceste agora a colcha de retalhos"
(...)
O tempo passou, certo dia Pedrinho, já mais adulto, andando pelo centro da cidade, viu um Senhor de cabelos grisalhos, tentando consertar o motor de seu carro, um “fusquinha”, - levado por um impulso decidiu que iria ajudar, o Tal Senhor estava abaixado com o rosto para dentro do motor do carro quando ouviu uma voz: - Posso ajudá-lo?!, entendo um pouco de mecânica; o homem por um momento ficou inerte, como se conhecesse aquela voz, com a fala um tanto rouca e desgastada pelo tempo disse, ainda sem virar o rosto: - É você Pedrinho? O rapaz empalideceu, sentiu algo em seu coração, uma mistura de alegria e tristeza, também falou sem olhá-lo: - Pastor é o Senhor?! Então se viram, se alegraram, se abraçaram e começaram a conversar. Dizia o DD, segundo Pedrinho: - Durante dez anos o Diabo me usou, tomou tudo que era meu e que Deus tinha me dado; perdi minha mulher e meus filhos. Pedrinho perguntou: - o que houve com sua esposa e as crianças?! - e ele triste falou: - Meu filho morreu, Renata casou-se novamente com o médico que os atendia e minha filha sumiu no mundo, foi ser cantora de bregas e nunca mais soube nada dela. Mas Jesus me libertou, tirou-me do inferno e me deu nova vida, nesse momento seu semblante mudou e o de Pedrinho também. Continuou DD: - Quero que vá me visitar, fundei nova Igreja, está tão linda como a que você me ajudou a levantar naquela época. Pedrinho pensou: - que maravilha Jesus recompôs a vida dele, acho que ele pode refazer a minha também. Por fim o Reverendo perguntou: - e Elisa como está?! – sonhei que um dia casaria vocês... Pedrinho sentiu seu coração pipocar no seu peito. Mas desconversou falando: - minha avó gostaria de vê-lo.
No domingo seguinte Pedrinho voltou a Igreja que ajudou a fundar, lá estavam seus amigos de infância, todos com funções de direção e Elisa ao vê-lo sentiu o seu coração querendo saltar do peito, ela estava muito bonita, embora com um semblante perdido, mas quando avistou e voltou a falar com o seu querido amor, um raio de ternura a envolveu e eles se encantaram outra vez, mal terminou o culto e foram para o local onde sempre conversavam e o tempo parecia ser o mesmo que os envolvia naqueles dias felizes de outrora, não mais se afastaram, dois meses depois se prometeram casar. Todos os papéis foram organizados e o casamento seria na Igreja, agora só de Elisa e assim se seguiu, no dia certo a igreja estava toda enfeitada, linda, cheia de flores e muitos convidados, por um instante Pedrinho entristeceu pensando no que o Pastor Dantas havia lhe falado do sonho que um dia os casariam, mas viu a incompatibilidade, pois ele tinha sido expulso dali.
O então Pastor da Igreja de Elisa era um jovem senhor, muito querido por todos. Iniciaram a sessão e os nubentes já iriam entrar na igreja para a formalidade do casamento, entretanto havia uma mudança no altar. Um cântico suave começou a tocar e o noivo com os padrinhos estavam a entrar, como é de praxe, Pedrinho feliz olhava para todos os lados, menos pra frente no altar, porém quando o fez ficou encantado e começou a chorar, ali estava para presidir o casamento um senhor de cabelos grisalhos, era o Pastor Durval Dantas... ele quebrou o protocolo e foi abraça-lo, a igreja se levantou e todos aplaudiram, em seguida a noiva Elisa entrou com a linda música tocada pelo coral da igreja. Ela sabia de tudo, pois ela mesmo combinou a surpresa para o seu eterno amor.... A pregação de Dantas foi maravilhosa e todos se emocionaram. Por fim os noivos se entregaram ao casamento e Dantas ficou muito feliz.
As duas igrejas de Dantas e de Elisa se tornaram amigas, a vida seguiu e todos foram felizes. Um ano depois o Pastor Dantas, também se casou e voltou a ser feliz.
Satanás perdeu, embora tenha feito um grande estrago.
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Antônio Souza
(Contos/Causos/Romance)
Música: https://youtu.be/KQMpq2dsk9c
Colcha de retalhos
Chitãozinho e Xororó / Leonardo
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