Preste atenção
Era tarde de domingo. O sol brilhava muito forte e o calor estava convincente, pois a temperatura batia nos trinta e quatro ou trinta e cinco graus. O jovem Marcos ainda contava as figurinhas de álbum da copa do mundo. Muito tímido e peças por peças, ele lembrava dos participantes da última copa e ficava muito triste por saber e recordar da derrota da seleção brasileira.
Marcos, o pai, com vários papéis e seu computador pessoal ao lado, acompanhava fielmente os textos escritos na semana. Ele era colunista do jornal local, além de ser jornalista, era produtor de comerciais e matérias de interesse da emissora de rádio da família. Tinha muito trabalho e ainda foi contratado para escrever um romance, por uma editora de renome. A tarefa estava árdua, mas ele sempre dava um belo jeito e ainda sobrava tempo para analisar os projetos de lei da câmara municipal, onde era funcionário.
O sol aquecia a cada minuto. Ele, porém, somente de bermudas e sem camisa, descalço, estava na varanda e buscando acomodar as ideias e os gestos das personagens do romance e também dar um parecer sobre a comissão de justiça, da câmara municipal. A cabeça estava a mil por hora. Pensava como seria a entrada de uma nova personagem. Se ela seria bonita ou se seria feia, se ela poderia ficar na parte de fora do casarão ou se entraria. Um gole de água, um copo de suco. Enfim, entre os toques no teclado do computador pessoal ia escrevendo, lendo, apagando e tentando vencer o dia.
O calor era imenso. O corpo pedia descanso. O filho juntou todas as figurinhas, fechou o álbum e os colocou na caixa e retirou-se, provavelmente indo assistir televisão. A cabeça de Marcos estava totalmente transtornada. Não sabia nada, nem mesmo por onde começar. A pressão era imensa e ele mesmo decidiu encostar a cabeça na parte mais alta da poltrona, segurar firmemente o computador e fechar os olhos por um instante. Assim o fez.
Passaram-se uns trinta e poucos minutos e Marcos exibia os roncos do corpo já cansado. Por um momento ficou calado, mas logo sentiu algo bem diferente daquilo que estava acostumado.
Uma pequena rajada de vento soprou o rosto e sentiu algo lhe tocando, dizendo desta forma:
- Eu sou a Raquel. Você não se lembra de mim. Eu vim da fazenda Bela Vista. Estou aqui, sem saber o que fazer.
Um pouco mais de um instante, sentiu um tapa no rosto e outra voz dizendo bem forte e com tom de braveza:
- Levanta, cabra de peste. Você não pôs munição em minha arma. Quase levei um tiro e tive que me esconder. Nesta situação, feriu os meus sentimentos de cabra da pesada. Você verá as consequências. Tu poderás até morrer por causa disto.
Tomou outra sacudida e foi logo ouvindo:
- Seu depravado, seu pornográfico, seu sujo. O que você fez de mim. Não me colocou nenhuma roupa. Estou vagando e perambulando pela rua da cidade completamente nua. Todos me olham e dizem que é o fruto de sua imaginação.
Caiu da cadeira e meio assustado, abriu os olhos e lá estavam várias pessoas ao seu redor.
A donzela tentando esconder as partes íntimas. O rosto vermelho de vergonha e sendo olhada por todos ali.
O cabra macho com a faca em punho, jurando vingança de qualquer maneira e prestes a cravá-la no peito.
A fazendeira muito meiga e valente, queria dizer algo ao pé do ouvido, mas logo foi impedida e puxada para trás por um grande cão, que a segurava com a enorme boca.
O som do alarme dispara e logo aparecerem duas viaturas e dentro delas estão oito policiais armados com fuzis e outras armas, que diziam que cumpriam uma ordem de prisão contra ele.
O padeiro tocava a campainha e exigia o pagamento do mês, pois comeu vários pães e não pagou.
O açougueiro, com um punhal na mão direita, disse em voz bem forte:
- Vou cortar as “bolas”, pois você me fez cair de quatro por aquela meretriz da esquina.
Até São Pedro chegou perto e disse para ele parar de usar o celular. Estava incomodando as reflexões no céu.
O motorista de táxi estava enfurecido, pois Marcos exigiu a presença dele às quinze horas e até o momento não desceu para a corrida.
Muitos outros acontecimentos foram presenciados.
Caído no chão, Marcos acordou repentinamente. Passou as mãos no rosto. O computador pessoal estava caído para um lado. O telefone estava chamando e logo percebeu o livro que deveria ser finalizado imediatamente, pois ele próprio não sabia por onde começar a finalizar a estória.