FIM DA MANIFESTAÇÃO

Geralmente, nas cidades do interior ou nos bairros afastados, os depósitos de bebidas são conhecidos à boca miúda por “enchimento” e no Bairro Alto, o enchimento mais conhecido era o do Sr. Alonso lá no finzinho da Rua Dois.

O lugar era muito movimentado e tinha freguesia certa formada tanto pelos alunos do Grupo Escolar que iam buscar as garrafinhas de guaraná caçula, quanto pelos caminhoneiros que levavam as grades de cervejas e outras bebidas, principalmente, de aguardente para os bares e restaurantes do comercio local e das cidades vizinhas.

Lourenço, com sua caminhonete Chevrolet ano 62, superequipada, era o principal entregador das encomendas do entorno que chegavam a todo instante, ou por moleques de recado ou pelo telefone, sempre empoeirado, preso na parede perto da porta.

Por falta de consenso entre os caminhoneiros, transportadoras e usuários dos serviços, os preços do frete estavam pendentes desde o início do ano e o sindicato dos transportadores decidiu promover a greve geral a fim resolver o impasse de uma vez por todas. Os piquetes foram para as ruas, portas de fábricas, acessos às rodovias, pontes, etc. não saía nem entrava ninguém.

Ninguém vírgula, porque Lourenço, aquele negro baixinho filho do barbeiro dono do Salão S. José, logo cedo já estava na porta do enchimento para fazer as entregas da manhã.

Quando Genésio, presidente do sindicato, soube do “fura greve” veio mais que depressa para impedir a dissidência.

Genésio era um gaúcho agalegado, grande e troncudo feito mourão de porteira, forte e ainda musculoso apesar de estar fora da atividade desde que assumira a presidência do sindicato cinco anos atrás.

Logo que dobrou a esquina, ainda de longe gritou para Lourenço que se ligasse a caminhonete já carregada ele furaria os quatro pneus.

Lourenço desligou o motor, desceu da boleia na maior tranquilidade e olhando no caroço do olho de Genésio, perguntou:

- Você faz o quê, rapá?

- Furo os quatro pneu. (respondeu Genésio)

- Você tá pensando o quê da vida, seu cabra?

E enquanto falava, Lourenço deu um tabefe tão bem dado no pé do ouvido de Genésio que ele perdeu o equilíbrio, saiu andando de lado que nem caranguejo e foi se estatelar em cima do banco circular no tronco da mangueira na ponta da calçada, onde as pessoas costumavam se sentar para conversar enquanto bebiam refrigerantes.

Não fosse a turma do “deixa disso” se meter no meio da briga para levar Genésio para a sede do sindicato, ele teria apanhado muito mais.

Fulo da vida, com os punhos cerrados e resmungando coisas que ninguém conseguia entender, Lourenço ligou a Chevrolet e foi fazer as entregas.