O caçador de onça

A noite chegou. Após mais umas doses de pinga na venda, o bate papo continuou. O assunto passou a ser caçadas de onça. Nesta hora, chegou o velho Salu, que nunca perdia a oportunidade de contar uma mentira. Conta uma seu Salu, gritaram todos. Mas, ele se fez de difícil, talvez para provar que seus causos eram verdadeiros. Depois, rodeado de gente, dirigiu a palavras a todos e contou esta:

- Um dia deste, eu fui caçar com meu compadre Raimundo. Andamos o dia todo, e nada matamos apesar de alguns tiros que demos. Cansado, ele me disse:

- Compadre vamos embora.

Eu retruquei, só saía de lá depois de matar uma caça nem que fosse uma onça.

- Eu vou embora, amanhã você me conta como foi a caçada.

-Tudo bem, falei.

Depois, ele pegou a estrada e sumiu.

Eu já havia andado muito, quando vi um pato à beira de um riacho, bebendo água. Aproximei-me calmo e silencioso. O pato me olhou pelo canto do olho, mirei no peito dele, mas errei o tiro e ele voou. Parece que aquele não era meu dia de caçador. Uma onça que estava dormindo ali perto, acordou com o tiro. Eu não contava que ela estivesse a favor do vento que, rapidamente, levou meu cheiro para o focinho dela. Vocês sabem: onça tem um faro bem apurado. Parece que estava com fome, pois sentindo o meu cheiro, logo veio me procu-rar.

- Nossa! falaram todos, desconfiados.

Foi isto mesmo que aconteceu. Mas, quando vi a onça a cinquenta metros à minha frente, uma grande confusão subiu à minha cabeça e minha primeira vontade foi correr. Naquele momento, eu só tinha uma bala na cartucheira.

Olhei para ela, ela olhou para mim com aqueles dois olhos amarelos. Aí, criei coragem, aprumei a espingarda, fechei um olho e atirei. E não é que errei! A bicha ficou furiosa e veio para cima de mim. As pernas de repente fortaleceram e quando percebi que tudo ia dar errado e que eu poderia virar o jantar dela, resolvi enfrenta-la, usando a espingarda para me defender, como se fosse uma espada. Eu a rebati com a espingarda e ela continuou avançando, e eu me defendendo e andando de costas, me defendendo, e andando de costas, sem saber o que estava atrás. No instante em que ela deu o bote, tropecei em um toco e caí. Por sorte ela passou por cima de mim, caindo a três me-tros de distância. Eu me levantei rapidamente, apanhei a cartucheira e quando ela voltou, continuei lutando com ela e andando de costas. Pedras rolavam sob meus pés. Debati com ela por mais de meia hora e quando dei por mim, tinha subido de costas, em uma árvore, sem ver.

- Nossa! Disseram todos.

Passei a noite lá em cima, sem pregar os olhos um minuto sequer, com medo de que ela subisse. No dia seguinte, ao amanhecer, depois de ter certeza que ela não estava mais por perto, desci.

Cheguei à casa, o sol já estava alto. Pouco depois, o meu compadre Raimundo chegou. Enquanto nós tomávamos umas lapadas de cachaça, eu contei para ele tudo o que aconteceu na minha briga com a onça.