HOMENAGEM AO MEU PAI – UMA LIÇÃO DE VIDA

Morávamos na fazenda, era o ano de 1955 ou 56, eu tinha 12 anos e frequentava o 4º ano do Instituto de Educação “Joaquim Ribeiro” em Rio Claro. Viajava no trenzinho à lenha de Ajapi para Rio Claro e de volta para Ajapi todos os dias.

Naquela época ganhei de meu Pai uma mula pampa de presente.

Num certo dia, um senhor, amigo de meu pai e morador em um sítio a 10 km de nossa casa, quando saía do trem me falou; “ diga a seu pai para ir lá no sítio no sábado. Eu tenho uma vaca e uma novilha para vender pra ele”.

Peguei a bicicleta e fui pra casa. Lá chegando falei: - pai , o senhor Fulano, falou para o senhor ir no Sítio dele sábado porque ele quer lhe vender uma vaca e um novilha.

Meu pai repondeu; - no sábado, você não tem aula, então você monta na mula, e vai ver. Mas pai, eu nunca comprei nada, não sei quanto vale e nem tenho dinheiro pra isso. Ele me disse; - você está me vendo comprar e vender quase todo dia, quanto ao dinheiro, peça um prazo para pagar.

Quando chegou o sábado, arriei minha mula, e fui para o sítio do homem. Chegando lá ele me falou: - seu pai não veio? Respondi; Ele me mandou no lugar dele, pois tinha outro compromisso. Meio contrariado, por ver apenas um menino para negociar com ele, me mostrou a vaca e a novilha e foi logo falando o preço que ele queria, 11 contos de reis. Eu pensei bem e ofereci 10, e vai daqui, vai de lá e depois de muitos argumentos, acabamos realizando o negocio por 10,500 com 30 dias para pagar.

Levei as duas para a fazenda. Meu pai estava esperando na porteira. Perguntei; Pai quanto que valem?? Ele respondeu, se pagou mais de 10, não vai ser fácil sair. Cocei a cabeça... tinha pago 10,500!!! Fiquei meio “cabreiro” com isso. E assim foram passando os dias, passou a primeira semana, nada, a segunda, nada, 3ª semana chamei o Pai e falei; - esta semana o senhor precisa arrumar o dinheiro para pagar o homem. Ele com a maior calma me disse; - a vaca e a novilha estão aí, você que deve achar um comprador, venda e vai pagar o Fulano! Retruquei, mas pai, eu não sei negociar, não conheço quase ninguém, preciso ir pra escola, como que eu vou vender? Ele respondeu: - se vire! Fiquei apavorado, mas sempre acreditando que na hora H ele me daria o dinheiro para pagar.

Chegou o bendito sábado, véspera do prazo de pagar, eu já não tinha dormido quase nada, de tanto pensar. Lá pelas 10 horas, chegou um senhor, meio amigo do meu pai, que eu nunca tinha visto antes e perguntou ao meu pai; - você tem algum gado para vender? Meu pai respondeu; Não. Esta semana não tenho nada, eu não pude sair para comprar. Eu ali, ouvindo aquela conversa, mas morrendo de vergonha ( que era comum em mim naquela época ) pedi licença e disse; Pai diga pra ele que eu tenho. Olhando pra mim disse; - Ora diz pra ele então o que você tem pra vender! Gaguejando cheguei no homem e consegui oferecer o gado. Ele então respondeu; - olha não me interessa, duas cabeças só é muito pouco, eu moro longe, fica difícil levar, não vale a pena! Fiquei meio sem ação e decepcionado, mas criei coragem e falei; Olha, eu levo as duas na casa do senhor! Bem sendo assim, quanto é que você quer das duas? Eu quero 11,500 contos. Ele responde; -Não, eu só dou 10. Meu Deus, de novo negociação difícil.... Depois de algum tempo acabamos fazendo negocio por 11 contos que ele me pagaria assim que entregasse o gado na casa dele. Mas tinha que ser de imediato! Combinava, eu precisava do dinheiro para pagar o gado amanhã! Levei o gado, recebi e fui pagar o seu fulano! Puxa que alívio e ainda tinha ganhado 500 contos!

Nunca mais parei de negociar. O tempo foi passando e eu sempre comprando e vendendo, tomei gosto pela coisa, até que um dia virei Corretor de Imóveis.

Passados uns vinte anos, eu já estava casado , certa vez, eu e meu pai, numa das viagens que sempre fazíamos, para comprar e vender, me falou; - você lembra do seu primeiro negócio ?. Claro que sim, pois passei o maior sufoco da vida. - Pois é, fui eu que arrumei aquela pessoa para comprar o seu gado e foi eu que dei o dinheiro para ele te pagar.

Moral da história:

Se ele tivesse simplesmente me dado o dinheiro, eu certamente ia crescer achando que tudo o que eu comprasse, alguém iria pagar em meu lugar, com sua sabedoria, aprendi desde cedo o valor de nosso trabalho.

Luiz Antonio Piccoli
Enviado por Luiz Antonio Piccoli em 04/07/2019
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