Seguro morreu de velho
Tem coisas que acontece que só pode mesmo ser provocação. Sábado, gente botando pelo ladrão, carrinho de pipoca - que até pouco tempo não tinha – atravancando a passagem dos pedestres, carrinho de água de coco – esse sempre teve- atravancando também; ciclista mal educado pedalando nas calçadas. Mãe dando cascudo no filho que abriu o berreiro porque quer e quer o algodão doce colorido – esse também não tinha, mas agora tem, atravancando idem – e, riam, podem rir: um sujeito manobrando para colocar seu carro entre duas árvores ao lado do portão da casa da minha prima. Curioso que sou e, sem nada de mais interessante pra fazer e naquela hora da manhã e, devidamente munido da minha coca cola, sentei-me numa muretinha e fiquei observando a paciência do indivíduo. Se alguém pegasse um metro e medisse a distância entre as árvores e medisse o carro, veria que o carro era menor, no máximo 3,5 cm que o espaço onde o motorista tentava enfiá-lo. O verbo é mesmo esse; enfiar. Os vidros escuros não me deixavam ver a cara do sujeito mas o suor devia estar correndo, pois já se passara quinze minutos, minha coca já tinha acabado e eu saia pra comprar outra pois a cena estava longe de acabar . Voltei e sentei na mureta, munido de outra coca e mais dois pastéis de coisa nenhuma, um risole de camarão, desses que vem só com batata e uma coxinha , porque a coisa parecia que ia demorar. E eu, alucinado de curiosidade pra ver a cara do maluco, não arredava o pé, rindo por dentro do despropósito daquela atitude. E foram-se os pastéis e a coxinha. O risole eu guardei pra oferecer àquele sujeito que eu já começava a admirar pela teimosia em colocar um carro onde só caberia com folga, um velocípede. A essa altura já tinha platéia. Um vendedor de churros apareceu, não sei sabe de onde trazendo na sua cola um irritante vendedor de sucos que queria aparecer mais que o manobrista intrépido. Foi vaiado, claro. Logo apareceu um esperto com uma mesa e cadeira e instalou um posto de apostas que consistia em dizer quando e se a manobra se realizaria. Fez fila e eu sugeri que trintinha por cento ficasse para o dono do carro. Mais aplausos, assobios e cabeça de nêgo alimentando o evento. Apareceu até santinho do Zé Serra para Presidente da República em dois mil e dez, prometendo estacionamento grátis à população carente. Finalmente, depois de cinco horas e dezessete minutos e o rodízio de muitas platéias, eis que desce do carro, triunfante, arquejante, desidratado mas sorridente, o proprietário do carrinho mais bem estacionado do Planeta. E eu devia ter adivinhado, não poderia ser outra pessoa. Só ele se disporia a tão tresloucado ato. A figura era o Jardel, ele mesmo Jardel de tantas outras aventuras e desventuras. Levantei, soluçando de rir e ofereci o risole de camarão de batata e perguntei.
– Jardel, grande figura, pra que toda essa trabalheira?
– Pô!, cara, comprei esse carrinho ontem. Desse jeito ninguém rouba, né?
– E quem, Jardel, vai querer roubar um Fiat 147? QUEM???
PS: Esse causo foi real. eu só acrescentei o vendedor de churros e o apontador de jogos rs