Anjo?

Era uma menina boazinha, quietinha, sua mãe dizia que, quando criança, onde a deixava ali ficava por horas e horas, quase nunca ouvia seu choro.

Assim cresceu, escutando a sua mãe dizer quer era tão humilde e compreensiva que se tornou uma coitadinha.

Nas historinhas quase sempre se identificava com o patinho feio ou a gata borralheira.

Tinha uma irmã mais velha a qual todos admiravam – “olha que arteira, esperta, terrível” – mas ela quase sempre fazia maldades e trapaças com a coitadinha da irmã, que era mesmo de dar dó.

Olha, feia, boba, coitada, pegou piolhos – piolhos? Sua mãe, então diante de tantos piolhos, enlouqueceu. Pegou a tesoura e cortou todo o seu cabelo. Ela, por sua vez, chorava. Imaginava como era inferior à irmã, ainda mais agora: careca.

Então, ela e sua mãe rodaram a cidade toda atrás de uma peruca, mas sua cabeça era tão pequena que nenhuma peruca coube em sua cabecinha.

Adquiriu um lencinho, e usava o mesmo todos os dias, para brincar e até mesmo ir à escola. Todos achavam estranho, mas não falavam nada, só se ouvia os zuns, zuns, zuns... será que ela está doente?! câncer?! mal olhado?! macumba?!

Que nada, era apenas piolhos! Malditos piolhos! Nojentos piolhos!

Com o passar do tempo, seus cabelos foram crescendo, lisos, bonitos, fininhos. O fim do ano estava chegando, e para surpresa de todos, ela tirou o lenço pela primeira vez após sua mãe ter cortado os seus cabelos.

Era festa da formatura da pré-escola, ela estava vestida de anjinho. Quando se aproximou da multidão, todos suspiraram e resmungaram: “nossa! veja! era aquela carequinha?!”

Ela parecia um anjo, todos os seus amiguinhos elogiaram, inclusive sua professora na qual a mesma tinha verdadeira paixão: “você está parecendo mesmo um anjo!”

Esse dia ela nunca esquecerá, pela primeira vez sentiu-se leve, leve como as asas de sua roupa. Pensava consigo mesma: “será que terei que virar um anjo para todos me admirarem? E usar essas roupas e essas asas todos os dias?”

Mas a festa acabou, e tirou a fantasia, e logo vestiu as suas roupas, voltando para casa. Passado alguns dias, nunca mais foi a mesma, pois todos vizinhos, familiares, amigos, quando a viam lhe diziam: “nossa, que cabelo lindo, que gracinha de menina! Parece um anjo!”

Fernanda Alvarenga da Cunha
Enviado por Fernanda Alvarenga da Cunha em 17/09/2007
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