Dona Antonina
Num cantinho entre Minas Gerais e Espírito Santo morava dona Antonina. Numa casinha, amarela, em meio a uma colina. Sua casa era pequena, porém muito asseada, tinha flores por todo lado, inclusive nas duas pequenas janelas que ficavam na frente da casa. No fundo, havia um galinheiro, uma videira e um pé de laranja lima. Além disso, ao lado direito da casa, dona Antonina cultivava sua horta, com temperos, verduras, tomates e pimentas. A casa não ficava tão afastada da cidade, mas ela preferia ficar ali boa parte do tempo. Só ia à cidade para comprar os mantimentos necessários e o café moído na hora do seu Sebastião. Sebastião não era dela. Mas, naquele lugar, todo senhor tornava-se seu. Dona Antonina possuía passarinhos de todas as cores, que passavam o dia cantando pra ela. Eles não estavam presos em gaiolas, mas sempre estavam ali. Dona Antonina dizia que os amava demais para prendê-los e afirmava que se os pássaros também a amassem, sempre a visitariam. E assim acontecia. Dona Antonina perdeu seu filho, ainda criança, no trilho do trem. O mesmo trilho que ainda existia um pouco abaixo de sua casa. Desde então, nenhum pai ou mãe deixava seus filhos se aproximarem de lá, exceto Luquinhas, neto de dona Eusébia, que ia até a casa amarela todas as tardes para ouvir os contos daquela senhora bem vivida. Dona Antonina ainda se lembrava de seu pequeno Joaquim toda vez que o trem passava, duas vezes por dia. Uma pela manhã, outra quase à noite. Seu marido, com a perda do filho, foi-se embora. Não se sabe pra onde. Dona Antonina ficou ali, fazendo da natureza sua melhor companhia. Os moradores, da pequena cidade, se preocupavam com ela ali sozinha. Mas, ela gostava. Narrava para Luquinhas e para os pássaros suas histórias. Ninguém sabia da veracidade delas. Dona Antonina não as escrevia, só as pronunciava, entoando cada fala como se estivesse em um grande teatro. Quando criança, ela queria ser atriz. Ficava encantada com as rádios novelas que ouvia. Queria atuar, tornou-se lavadeira, mas uma das melhores. Não tinha medo do trabalho, e cantava enquanto carregava a trouxa na cabeça e quando as roupas lavava. Ela teria sido uma boa atriz ou cantora, talvez. Dona Antonina afirmava que seu palco era sua janela. Ali ela cantava e contava suas histórias, para Luquinhas ou para os pássaros. Sua casa tinha cheiro de café quentinho e chá de hortelã, misturado com o da fumaça do seu pequeno fogão à lenha. Ao findar da noite, as estrelas eram sua companhia. Dona Antonina acreditava que algumas estrelas eram anjos de Deus que a protegiam todas as noites, inclusive nas chuvosas. E assim ela seguia. Sozinha, não solitária. Modesta, não pobre. Afinal, se tem uma coisa que dona Antonina sabia era ser rica, mesmo com pouco dinheiro. Hoje, ela não se encontra mais aqui. Descansou. Fechou os olhos em uma noite e não mais acordou. Foi seu Sebastião que a encontrou, ao estranhar que, naquela manhã, o pó de café ela não foi buscar. Ela estava em um bom lugar. Luquinhas cresceu, e para sua filhinha contou, as histórias de dona Antonina, aquela senhora que com sua vida muito ensinou.