Anjo da morte

Conto

Anjo da morte

Sábado, dia 20 de maio de 2018. Noite fresca de lua cheia, são 23 horas e 30 minutos e está na fila com duas amigas esperando para entrar. A fila é longa, mas nada comparado à espera de um ano inteiro. Quer entrar logo, está ansiosa, alegre e curiosa. Marcela “mulher aranha” não para de falar como as pessoas estão diferentes e parecem tão contentes. Impressiona-se com a criatividade e beleza da galera e quando Camila percebe, já é hora de entrar, logo vai começar. Na recepção, ingressos na mão, pulseirinhas Vips no pulso e consumação na bolsa.

Três meses elaborando e se dedicando em sua perfeita fantasia para o grande dia. Colã branco, com penas costuradas na frente e atrás, luvas compridas, minissaia de tule e meias sete oitavos, bota salto 15 agulha, nas costas lindas asas vistosas. Nos olhos purpurina e traços delineados, nos lábios batom rosa, é vaidosa.

Logo na entrada, espelhos pela sala. Ela se admira e sente que a noitada promete, será pura farra e adrenalina. Com as amigas tira fotos e diz que vai se jogar, vai aproveitar. Quer dançar , beber e beijar. Entra no principal salão, chega ao bar e logo está com um copo na mão. As três loiras juntas chamam atenção. No camarote, ao som do Dj Light e de luzes coloridas piscantes dançam e se divertem. Estão caprichadas a decoração e as roupas da multidão. O lugar está ficando lotado, três mil pessoas são esperadas.

Volta para o bar, pede mais um drink, e lá vem um cara. Não gosta dele, acha grudento, veio logo com questionamento ela não quer casamento. Coloca o copo no balcão, desloca sua atenção para o celular e já era, nem sonha o que lhe espera. O rapaz dissolve um comprimido na bebida dela, distraída cinderela. Para fugir do astral do animal, diz que está apertada, precisa ir ao banheiro imediatamente infelizmente, é educada.

Uns goles pelo caminho, em seu ouvido burburinhos, pessoas passando, encostando, se esfregando, se beijando. Foi ficando meio difícil de enxergar, tinha gelo seco pelo ar. No banheiro mais uns goles e logo começa a perceber que está difícil ficar em pé, vê borboletas e um jacaré, olha para o espelho e sua imagem está alterada, perde a noção de tudo e de nada.

- Volte logo ao normal, tu és especial! - mandava para ela mesma ajeitando suas asas e seus cabelos.

Seus olhos giram, o teto cai, o chão sobe, tudo muda de lugar, está acelerado e devagar. Seu corpo está gelado, o mundo deformado e ninguém ao seu lado. Que desespero alucinante, vida fugiu por um instante, uma lágrima de seu rosto escorreu ressoante.

Acorda confusa uma hora depois com seu cabelo bagunçado todo vomitado. Sua bolsa foi roubada e suas asas esfaceladas, mas que parada, é começo da madrugada.

- Como ninguém percebeu que tanto tempo aqui fiquei? Será que pensam que aquele cara peguei? – falava Camila para ela mesma desnorteada, com a cara borrada.

Nem suas amigas foram no banheiro atrás dela, ah, que dó, tão só, mal sabe ela, o que o destino lhe revela. Que horror, era só o inicio do terror. Ali já não estava mais, pelo feioso da foice foi levada em plena balada! Sua lembrança congelou e daquele momento não se lembrou.

O banheiro estava lotado, mas estava sem noção da realidade então. Bebeu uns goles, retocou o batom na boca mole e foi para pista. Dançava com suas amigas quando começou uma briga e levou um tiro na barriga de bala perdida. Foi fatal o que nem era pra ser dela afinal. Com hemorragia, caiu no chão, quebrou as asas, perdeu a bolsa, vomitou a bebida com dor retorcida. O rapaz animal bêbado vendo a cena de longe se afasta da pista de dança. Não entende como aquele “docinho de alegria dançante” poderia ter esse efeito horripilante e em pânico de ser suspeito vai embora o sujeito. A linda anja branca agora é Anjo da morte, coitada dela naquela noite faltou sorte!

Helena Douthe

Helena Douthe
Enviado por Helena Douthe em 07/10/2018
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