Não teve simpatia que desse jeito
Não precisa acreditar se não quiser, pode ficar incrédulo, não tem problema. Acredito que, no mínimo, poderá nascer uma verruga na ponta do seu dedo indicador ou um furúnculo bem no meio de suas pernas, dependendo da influência de Santa Luzia, na sua vida, quem sabe não seja sapecado um conjuntivite nos seus olhos. Essa história quem contava era cumpade Canção, lá do sítio Cajazeiras, para o povo da cidade.
Benedita, a Dita de seu Zé dos porcos, já passava da idade de casar, ninguém, nenhum cristão se interessava por ela. O pai chegou inté a oferecer dez porcos dos mais robustos para quem quisesse casar com ela. Depois aumentou a oferta. Dava dez porcos, três porcas parideiras e três sacas de ração. Nada. Nenhum pé de cabra macho apareceu.
O velho, ignorante que só ele mesmo, parecendo burro abestado de empancado, dobrou a oferta. Disse que dava vinte porcos, dez porcas parideiras, oito sacas de ração e ainda mais uma quadra de terra para os dois morarem, mas a Dita era tão feia, mas tão feia que nenhum cabra macho se candidatou para tal sacrifício. Dizem que certa vez, em véspera da noite de São João, a danada pegou uma bacia que nunca tinha sido usada, colocou um litro de água dormida do jarro do altar de São João, uma vela acesa no sírio da páscoa, pingou nove pingos na água, ficou lá, no pé da fogueira, rezando para São João amostrar a letra do vivente que iria livrá-la do caritó. Pois num é que nesse mesmo momento, um filho de uma égua cruzado com o capeta, num atirou um traque mesmo de lado da Dita de seu Zé dos porcos que teve um susto tão condenado, que o cabelo se soltou e começou a pegar fogo na fogueira.
Dizem que foi um ribuliço tão grande que a coitada ficou ainda mais feia de cabelo queimado. O estrago foi tão grande que teve de cortar o que sobrou e ela passou a andar de lenço na cabeça.
Passado um ano, no outro São João, já desesperada, ela colocou foi um copo de água todinho na boca e se escondeu atrás da porta porque uma tia mais velha disse a ela assim: "o primeiro nome de homem que você escutar, será o nome do seu noivo".
Assim foi feito, pois num é que o primeiro nome dito e ouvido pela Dita num foi o nome do Padre Anastácio! O desespero de virar mula sem cabeça foi tão grande que a coitada engoliu de vez a água, ficou engasgada e foi aquele desespero.
A cumade Chichica, esposa de Zé dos porcos, mãe da Dita, batendo nas costas da filhas e puxando uma ladainha sem fim de santos, além de fazercuma penca de promessas. Zé dos porcos alevantando os braços da filha para cima, assoprando nos ouvidos e a água saindo pelo nariz.
Dizem que a coitada ficou tão alvoroçada que chorou sem parar seis dias e seis noites até a noite de São Pedro. Foi tanta lágrima que nasceu um açude ao lado da casa, debaixo da janela do quarto da Dita. Estancando o choro e a enxurrada, já na noite de São Pedro, depois que acabou a festança toda, Dita juntou os restos das comidas, pegou uma toalha nova, branca, arrumou uma mesa para jantar de duas pessoas, colocou os castiçais das velas, colocou os pratos de cristal do casamento da mãe, abunitou-se todinha com um vestido de noiva da quadrilha, véu e grinalda, mandou todos dormir, ficou sentada na cadeira de balanço a se balançar, esperando o noivo enviado por São Pedro. Tinha uma certeza dentro de si que daquela noite não passava.
Resistiu acordada o quanto pode, pega pelo cansaço da espera, a Dita adormeceu em sono profundo. Sonhou com o terreiro da casa todo enfeitado de bandeirinhas coloridas, uma fogueira acesa, um trio regional tocando, balões, até que foi surgindo um cavalo branco bonito com um moço ainda mais lindo em cima.
Ela não conseguia ver o rosto, mas sabia que era lindo de morrer por causa da roupa. Vinha ao encontro dela, pegando ela pela mão, tirando-a para dançar. Quando chegou mais na claridão da fogueira, tentou olhar fixo no olhar dele, quando consegui finalmente ver o rosto, só ouvia de longe os sinos da igreja baterem tão alto, mas tão alto dentro dela, que levou as mãos aos ouvidos, deu um grito tão estrondante capaz de acordar todos da casa, a vizinhança e porque não dizer da cidade?
Abrindo os olhos, sem ver ao certo o rosto do cavalheiro, ela estava com um sapo na mão, chamando-o de príncipe.
Para o pai, Zé dos porcos, não teve outra saída, internou a Dita na Santa casa de misericórdia e até hoje a coitada ainda mais feia, só espera as noites de São João para mais uma simpatia.
Dizem que tudo isso foi causado pela mãe, Chichica, que, para casar com o Zé dos porcos, amarrou o Santo Antônio, enterrou de cabeça para baixo em uma cova de anjo, esqueceu onde era o lugar e até hoje o santo ainda está de castigo.
Se não acredita, não posso fazer nada, a não ser que a Dita Benedita lhe apareça em sonho e lhe faça uma simpatia para, para, para casar.
Marcus Vinicius